Publicado em 27 de maio de 2023 por Tribuna da Internet
Fabio Serapião
Folha
A Polícia Federal levou meses até conseguir acessar todos os dados armazenados pelo tenente-coronel Mauro Cid, ajudante de ordens de Jair Bolsonaro (PL), utilizados nas investigações que miram o ex-presidente, Michelle Bolsonaro e outros assessores presidenciais.
No inquérito sobre o vazamento da investigação do ataque hacker ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral), embora a quebra de sigilo telemático de Cid tenha sido efetuada ainda em 2021, entre agosto e setembro, somente em junho do ano seguinte a PF produziu o primeiro relatório com as informações que hoje têm sido utilizadas em ao menos três frentes de apurações.
BASE DA INVESTIGAÇÃO – As mensagens encontradas na nuvem do Google Drive e do iCloud de Cid embasam hoje as investigações sobre o suposto desvio de dinheiro da Presidência, as investidas golpistas de Bolsonaro (7 de setembro de 2021 e 8 de janeiro de 2023) e a fraude na inserção de dados no sistema de vacinação do Ministério da Saúde.
A Folha apurou que o acesso aos dados só foi possível após o caso sair da superintendência da PF no Distrito Federal e migrar para a DIP (Diretoria de Inteligência Policial), localizada no prédio-sede da corporação, em Brasília.
A mudança de local ocorreu após a delegada Denisse Ribeiro, então responsável por todos os inquéritos relatados por Alexandre de Moraes, do STF (Supremo Tribunal Federal), entrar em licença maternidade, em fevereiro de 2022.
NOVA PERÍCIA – O caso então passou a ser conduzido pelo delegado Fabio Shor, que fazia parte da equipe de Denisse e foi indicado por ela ao ministro do STF. É ele quem atua na investigação até hoje. O delegado pediu a prisão de Cid e a busca contra Bolsonaro, cumpridas no último dia 3 de maio.
Antes da ida para a DIP, os policiais do Setec (Setor Técnico-Cientifico) da PF no DF haviam conseguido acessar uma pequena parte do conteúdo, que gerou apenas um relatório de análise citado na conclusão do inquérito sobre o vazamento por Cid e Bolsonaro da investigação do ataque hacker ao sistema do TSE.
Na DIP, durante a direção-geral de Márcio Nunes na PF, peritos e técnicos se debruçaram sobre os arquivos e conseguiram encontrar um método para localizar os dados armazenados nas nuvens.
DEZENAS DE INFORMES – Com o método e a determinação de Moraes em 2 de maio de 2022 para que fosse produzido um relatório minucioso sobre os arquivos de Cid, dezenas de informes devassaram o dia a dia da Presidência.
No primeiro relatório após o acesso, datado de junho de 2022, a PF explica como os dados estavam armazenados. Nas pastas relacionadas ao WhatsApp encontradas em nuvem, por exemplo, não apareceram o número de todos os participantes, apenas o número de identificação daquele grupo seguido pelo número de telefone de quem, provavelmente, o criou.
Ao enviar o relatório a Moraes, o delegado Fabio Shor sugeriu que os dados encontrados com Cid fossem analisados com os coletados pelo inquérito das milícias digitais. Ao sugerir o método de análise, o delegado disse que o inquérito apura a “existência de uma organização criminosamente complexa, de forte atuação digital e com núcleos de produção, publicação, financiamento e político com o objetivo de atacar o Estado democrático de Direito”.
TRANSAÇÕES FINNCEIRAS – O primeiro relatório produzido com base na análise do material encontrado na nuvem da Apple revelou à PF os recibos de transações financeiras que acarretaram na suspeita de desvio de dinheiro público da Presidência.
No segundo relatório, a PF conseguiu acessar alguns áudios de Cid e interlocutores. Eles falam do caso da morte de um integrante da ajudância de ordens e agendas do então presidente.
No terceiro são detalhadas as conversas de Cid com uma assessora da ex-primeira-dama que levaram à suspeita de que os supostos desvios de dinheiro Presidência teriam sido a mando de Michelle Bolsonaro.
QUEBRA DE SIGILO – A partir desses primeiros relatórios, a PF pediu a quebra de sigilo bancário de Cid, de outros ajudantes de ordens e de duas assessoras de Michelle. O caso foi revelado pela Folha em setembro de 2021.
Após a primeira quebra telemática, em 2021, Cid foi alvo de outras duas, em dezembro de 2022 e em janeiro de 2023.
Além disso, Moraes autorizou outras quebras de sigilos bancário, fiscal e telemático de pessoas ligadas a Bolsonaro que ainda são analisadas pela PF e que devem ser utilizadas nas investigações em andamento.
###
NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Muita espuma e pouco chope. Se a perícia já tivesse encontrado alguma prova realmente sólida, já teria vazado para a imprensa amestrada, como dizia Helio Fernandes. (C.N.)