Guga ChacraO Globo
O combate ao novo coronavírus tem sido comparado a uma guerra e, em conflitos armados, nem todas regiões dos países envolvidos sofrem na mesma escala. Na Síria, Damasco sobreviveu quase uma década relativamente intacta, a não ser pelos subúrbios fora da área metropolitana. Nas cidades mediterrâneas de Latakia e Tartus, quase não houve enfretamentos. Já Aleppo e Homs foram parcialmente destruídas. Raqqa, devastada.
Nesta guerra contra a Covid-19, como é chamada a doença causada pelo novo coronavírus, não será diferente de outros conflitos. Daqui alguns meses, lembraremos das batalhas de Wuhan, Lombardia e Madri. Pelo observado até agora, porém, Cingapura, Hamburgo, Tóquio e mesmo Pequim tendem a sair menos cicatrizadas desta pandemia se levarmos em conta o número de mortes.
GRANDES TRAGÉDIAS – Outras grandes metrópoles correm enorme risco de entrar na lista das tragédias provocadas pelo novo coronavírus. Nova York, com cerca de 20 mil casos confirmados, infelizmente está entre as mais vulneráveis. O volume de pacientes chegando aos hospitais vem crescendo nos últimos dias, apesar de a uma taxa menos acelerada desde domingo. Talvez, na próxima semana, não haja mais respiradores e UTIs suficientes para todos os pacientes em estado grave.
O governo estadual e a prefeitura vêm agindo com rapidez, mas parece ser tarde demais para evitar um desastre. Nova York se difere outras cidades americanas, como Los Angeles, que possuem pequenas áreas urbanas com prédios comerciais, com a população vivendo por casas em subúrbios e basicamente usando o carro. Os nova-iorquinos vivem em regiões densamente povoadas, e se locomovem por transporte público. O isolamento e distanciamento é bem mais complicado e foi implementado tardiamente.
CAPITAL DO PLANETA – É triste ver como Nova York, considerada por muitos como a capital do planeta, está aquém de metrópoles asiáticas para enfrentar a pandemia. Até pouco tempo atrás, seria impensável imaginar que Seul, Cingapura e Xangai, quase tão densas como a maior cidade americana, tivessem estruturas mais avançadas do que a mais rica cidade dos Estados Unidos, maior economia do mundo e mais poderosa potência da história da humanidade.
No 11 de Setembro, foi distinto. Nova York foi pega de surpresa por um gigantesco atentado terrorista. Nenhum lugar do mundo estaria preparado. E o renascimento da cidade foi impressionante e veloz, incluindo a construção de um novo prédio onde se localizavam as antigas torres do World Trade Center. Agora, dava para a cidade ter mais condições de enfrentar a epidemia.
NÃO FALTOU AVISO – Há décadas especialistas advertem sobre o risco e uma série de estudos indicavam sobre os devastadores estragos que poderiam ser causados por um vírus como o novo coronavírus. Mais uma vez, veja Seul e Cingapura, que se preveniram. Nos EUA, muito pouco foi feito.
Não podemos descartar a possibilidade, ainda que remota, de Nova York passar relativamente ilesa pela crise, sem saturamento das UTIs e sem pacientes morrendo na porta de hospitais pela falta de respiradores para os manter vivos. Era, no entanto, para a cidade estar preparada como as grandes metrópoles asiáticas. Nova York, que pode ser a Aleppo da era do coronavírus, simboliza como os EUA, além de não estarem no liderança global no combate à pandemia, se enfraqueceram como potência que deva servir de exemplo.