Entre apertos de mãos e abraços emocionados, o reencontro de muitos amigos, ex-companheiros de prisão e de luta contra a ditadura. A comemoração dos 30 anos de Anistia levou ao Forte de Santo Antônio Além do Carmo – local onde funcionava a Casa de Detenção que custodiou muitos presos políticos – pessoas que há tempo não se encontravam. Promulgada em 28 de agosto de 1979, a Lei, nº. 6.683/79 garantiu o retorno de brasileiros exilados, banidos, cassados, perseguidos, torturados e reparava danos sofridos por familiares dos mortos em razão da luta política. 30 anos depois, para muitos dos que estavam presentes, a sensação dos tempos vividos nos anos de chumbo ainda eram recentes. “Passa um filme longo em minha cabeça. De quando participei do movimento estudantil, quando saí do Rio de Janeiro em 1973 e cheguei aqui na Bahia em 1974. Anos depois ainda queremos contar a nossa história, com erros e acertos, mas orgulhosos das nossas convicções”, disse o governador Jaques Wagner ao homenagear a todos os que participaram da luta pela restauração da democracia no Brasil. O Movimento Feminino pela Anistia; o Comitê Brasileiro pela Anistia (Núcleo da Bahia); o Grupo Tortura Nunca Mais da Bahia; o padre Renzo Rossi; Maria Helena Affonso de Carvalho (D. Iaiá), mãe do ex-preso político Renato Afonso; Kátia Assis, mãe do ex-preso político Natur de Assis; e os advogados de ex-presos políticos Jayme Augusto de Guimarães Souza (in memorian), Ronilda Maria Lima Noblat (in memorian), José Borba Pedreira Lapa e Joaquim Inácio Santos Gomes representaram os diversos segmentos que se destacaram na participação nas lutas políticas da Bahia recebendo do Governo do Estado uma placa de homenagem. O ex-preso e deputado federal Emiliano José destacou o ano de 1979, lembrando dos mortos, desaparecidos, exilados e dos voltaram para viver na clandestinidade. “Eu digo sempre que nossa geração errou muito. Carregou e carrega até hoje a marca do amor pela humanidade. Dizíamos que éramos capazes de derrotar a ditadura e falávamos isso em condições extremamente difíceis, em que nem podíamos nos encontrar direito porque corríamos o risco de ser presos. Quem derrotou a ditadura foi o povo brasileiro, mas nossa geração contribuiu muito para isso”, disse. O secretário da Justiça, Cidadania e Direitos Humanos, Nelson Pellegrino, destacou a importância da anistia para a restituição dos direitos de brasileiros que puderam voltar para o país. “Hoje os vencedores somos nós. Precisamos fazer um resgate dessa história para que as gerações futuras criem o vírus de resistência e não permitam que uma parte tão triste da nossa história, como foi a ditadura, venha a se repetir”, afirmou o secretário. O primeiro presidente do Comitê Brasileiro pela Anistia (Núcleo da Bahia), Joviniano Carvalho Neto, lembrou da luta para não permitir que a anistia deixasse com que tudo o que tinha acontecido durante a ditadura caísse no esquecimento. “A minha primeira reação foi a de que a anistia significaria esquecimento e eu não queria esquecer a morte de tantos jovens. A anistia demorou muito para ser concedida no Brasil e está sendo a mais longa para se chegar a resultados. Grande parte da história não é conhecida”, disse. Representando o grupo Tortura Nunca Mais, Ana Guedes destacou aspectos fundamentais da luta pela resistência à ditadura. “As pessoas que morreram não foram em vão. A prova concreta disso é a democracia que conseguimos. Quando saiu a Lei de Anistia, não concordamos com tudo o que estava escrito, mas sabíamos que era preciso fazer alguma coisa” afirmou. A opinião de Ana Guedes foi de encontro a de muitos dos presentes no evento. “O maior crime da ditadura foi a interrupção do processo democrático. Quando foi promulgada a Lei foi uma grande vitória, embora tivesse sido feita parcial. Nós queríamos ampla, geral, irrestrita. Essa era a nossa bandeira, mas isso não acnteceu. Nossa vitória foi significativa para o povo brasileiro. Que nunca mais precisemos de anistia. Que nunca mais tenhamos ditadura no país”, mencionou o ex-governador Waldir Pires em depoimento aos presentes. Visita à galeria F na Lemos Brito Após a cerimônia, ex-presos políticos e familiares seguiram para a galeria F no módulo IV da Penitenciária Lemos Brito – no Complexo Penitenciário da Mata Escura –, local onde ficaram presos políticos. A visita permitiu a muitos voltarem ao passado para contar um pouco das histórias que viveram no local.Entre a alegria de poder mostrar a família o local onde ficaram e a emoção de reviver o momento e o reencontro com um agente penitenciário, que na época era chamado de carcereiro, muitos ex-presos contaram suas histórias. “O que me veio em mente foram os movimentos que fazíamos reivindicando melhorias. Lembro que minha esposa vinha para cá e não tínhamos qualquer privacidade porque sempre estávamos dividindo celas”, mencionou Marival Caldas. “Seu marido ficou nessa cela”, apontou Teodomiro Romeiro à Olívia Braga, esposa de Ivan Braga. “Meu filho foi gerado aqui dentro” citou Arno Brichta, ao mostrar a cela F8. Memórias Reveladas Durante o evento, o secretário Nelson Pellegrino fez uma apresentação do projeto Memórias Reveladas das Lutas Políticas na Bahia (1964-1985). O material dispõe sobre o acesso às informações do período, através de uma comissão especial vinculada à Secretaria da Justiça.A Comissão Especial Memórias Reveladas – coordenada pela SJCDH – foi criada pelo Governo do Estado da Bahia, através do Decreto nº. 11.520/2009, com o objetivo de elaborar o Projeto Estadual Memórias Reveladas das Lutas Políticas na Bahia (1964-1985). Cabe à Comissão, promover o levantamento de dados e informações, como fotografias, impressos e depoimentos, necessários à elaboração do Projeto Estadual Memórias Reveladas das Lutas Políticas na Bahia (1964-1985), que se encontrem sob a guarda de órgãos e entidades do Estado, de entidades privadas e pessoas físicas no Estado da Bahia e integrar essas informações à Rede Nacional de Cooperação e Informação Arquivística.“Já estabelecemos o roteiro e ele prevê o acesso aos arquivos da Bahia, Polícia Federal, Auditoria Militar, e estamos tentando ter acesso aos da Forças Armadas. Além disso, já baixamos o decreto de chamamento público para que as pessoas que tenham documentos possam voluntariamente entregar cópias à comissão organizadora. Também estamos colhendo depoimentos dos que participaram deste período. A ideia final é fazer um livro dessa história da Bahia contra a Ditadura Militar”, explicou Pellegrino, lembrando que toda essa documentação será encaminhada para o Arquivo Público do Estado da Bahia para que todos tenham acesso. (Assessoria de Imprensa da Secretaria da Justiça da Bahia).
Fonte: Bahia de Fato
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