Carlos Newton
A discussão sobre o golpe de estado já se tornou até bizantina, como se dizia antigamente. Todos já sabem que houve a conspiração, conhecem quem dela participou e faltam poucas dúvidas a serem dirimidas. Uma delas é a seguinte: 1) Na reta final, o general Braga Netto traiu Bolsonaro e assumiu sozinho o golpe, para assumir o poder? 2) Ou o ainda presidente Jair Bolsonaro ficou encagaçado, abandonou a nave felliniana e viajou para os Estados Unidos, dia 30 de dezembro, deixando a bomba nas mãos de Braga Netto?
Poucos personagens sabem as respostas a essas indagações. Mas a evolução do inquérito acabará revelando tudo, porque agora Bolsonaro e Braga Netto não podem mais deixar de depor, pois o ministro Alexandre de Moraes quebrou o sigilo dos depoimentos. Se alegarem o direito ao silêncio, estarão reforçando as acusações que lhes fazem.
NÃO SERÃO PRESOS – No artigo de ontem, já explicamos que não há a menos possibilidade de Bolsonaro e Braga Netto serem presos preventivamente, apesar da enorme pressão da imprensa petista, que cobra diariamente a decretação. Já é corriqueiro falar em “depois que Bolsonaro for preso…”, mas não existe a motivação exigida em lei, pois até o passaporte do ex-presidente já foi apreendido.
Quanto às acusações, na mídia há todo tipo de justificativa para a imediata condenação do ex-presidente. Já sugeriram até mesmo “o conjunto da obra”, mas essa circunstância não consta em lei.
Também já mostramos aqui na Tribuna da Internet que no Direito Universal não existe crime de planejamento. Ou seja, é preciso haver a execução, para caracterizar a tentativa, no caso de o crime não se concretizar.
EXISTEM EXCEÇÕES – Como toda regra tem exceção, no Brasil e em outros países que combatem o terrorismo é proibido possuir e transportar explosivos (Lei nº 10.826/03). Da mesma maneira, é proibido ter instrumento para falsificar a moeda (art. 288 do Código Penal). Somente nestes dois casos não é preciso tentar executar o crime, para ser processado.
São as únicas exceções. Não é punível nem mesmo o crime de associação criminosa (formação de quadrilha) se não houver a execução. Este crime (art. 291, do CP) é mera circunstância agravante do crime executado.
É difícil entender essa doutrina jurídica, sobretudo quando os argumentos vêm eivados de paixão. Mas o fato concreto é que o Direito Penal não admite a punição de atos meramente preparatórios à execução de um crime, pois se trata de violação ao princípio da lesividade”.
DIZIA RUY BARBOSA – Os adversários de Bolsonaro urram de ódio, não entendem que é preciso respeitar todas as leis. Como ensinou Ruy Barbosa, quando apoiou uma legislação que protegia a facção contrária, “a lei que protege meu inimigo é a lei que irá me proteger no futuro, quando houver alternância no poder”.
No processo a ser aberto contra Bolsonaro, a grande discussão será justamente sobre esse tema. O Supremo terá de decidir se mantém a jurisprudência atual, determinando que atos preparatórios de crime não podem ser punidos, ou se fará nova “interpretação”, para puni-los pelo “domínio do fato”, arguido no julgamento do Mensalão.
Quanto a Bolsonaro ser preso, nenhuma chance na lei, a não ser que o Supremo…
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P.S. 1 – Amanhã vamos voltar ao assunto, debatendo a punibilidade na fase de planejamento, que o Direito Romano denomina de “iter criminis”, expressão que significa “caminho do crime”, em tradução livre.
P.S. 2 – Enfim, é preciso discutir o golpe que não houve pelo ponto de vista exclusivamente jurídico, sem ódios nem paixões. (C.N.).