Publicado em 4 de junho de 2023 por Tribuna da Internet
Pedro do Coutto
Em artigo assinado na edição de ontem de O Globo, os ministros de Minas e Energia, Alexandre Silveira, e da AGU, Jorge Araújo Messias, anunciaram terem recorrido ao Supremo Tribunal Federal através da Ação de Inconstitucionalidade 7385 contra dispositivos incluídos no processo de desestatização da Eletrobras que, na realidade, incluem uma série de absurdos que, ao meu ver, representam um dos maiores escândalos do país nos últimos 50 anos.
Na privatização da holding, o presidente era Wilson Ferreira Júnior, que foi reconduzido ao cargo depois da conclusão do processo, ocupando-o no momento. Alexandre Silveira e Jorge Araújo Messias sustentam que um dos dispositivos veda a constituição de blocos de controle definidos, impedindo que acionistas detenham participação com direito a votos maior do que 10% do capital da companhia. A União, por exemplo, detém 42% dessas ações.
FALÁCIAS – Outro dispositivo é de que o objetivo incluído visa assegurar que nenhuma interferência da União na condução da empresa se refletiria contras ações adquiridas nas ofertas públicas. Os dois ministros afirmaram que esses argumentos são falaciosos: “Antes de tudo não se pode garantir que o preço pago pelos compradores das ações inclua valor adicional relativo ao controle da empresa”, afirmaram.
Não existe assim correlação entre os preços praticados e a formação do controle da holding. O que houve foi a diminuição do poder de voto da própria União. Para demonstrar que não existe relação entre preços e diluição do poder da União, basta lembrar que todos os investidores que detinham papéis antes da desestatização foram premiados sem nenhum investimento adicional. Houve também deliberação através da qual embargou-se artificialmente o poder político do governo do país.Todos os acionistas minoritários tinham participação inferior a 10%. Portanto, todos foram favorecidos com a diminuição da presença do poder público nas deliberações.
CONTRADIÇÃO – Jorge Araújo Messias e Alexandre Silveira acrescentam que a investida da União contra aplicação de tal modelo tem como base a contradição entre o acionista majoritário (no caso, a União) e a efetiva diluição do capital social da empresa. Além disso, o processo da falsa desestatização da Eletrobras está incompleto. As previsões legais refletem (para o conjunto de minoritários) um capitalismo sem risco, uma vez que lhes é dado o comando da companhia.
Entretanto, caso haja fracasso nos negócios, o prejuízo da União será proporcional ao seu capital público investido. Tudo isso sem afastar a responsabilidade pelo resultado. Jorge Messias e Alexandre Silveira deixam claro no artigo não ter ocorrido real desestatização, pois não foram diluídos os recursos públicos investidos na Eletrobras. Em consequência, o processo não inclui a responsabilização dos atuais dirigentes, resultado da reunião de minoritários. Logo, não se trata do surgimento de uma nova corporação. A falsa privatização está sustentada pela artificialidade no campo do Direito.
CORRUPÇÃO – No último meio século, certamente, a corrupção que antigamente era composta por fatos isolados, transformou-se numa regra. Todos os dias, nos deparamos nas páginas dos jornais com sucessivos escândalos que minam a economia do país e impedem o seu desenvolvimento social, eternizando problemas fundamentais.
Agora mesmo, ontem, as edições de O Globo e da Folha de S. Paulo, destacam o resultado a que chegou a Controladoria Geral da União (CGU) sobre uma onda de corrupção no Auxílio Brasil pago na gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro. O desvio de recursos baseado na soma de pagamentos irregulares e até fictícios eleva-se a R$ 1,970 bilhão.
PAGAMENTOS INDEVIDOS – As fraudes ocorreram a partir de pagamentos indevidos, sobretudo nas áreas dos chamados abonos taxistas e abonos caminhoneiros sob a falsa perspectiva de que se destinavam a compensá-los pelas perdas causadas pelo aumento de combustíveis. Trezentos e cinquenta mil caminhoneiros e taxistas foram incluídos no programa na reta final da campanha eleitoral de outubro de 2022.
A CGU recomendou à DataPrev, empresa da Previdência Social, responsável pelos pagamentos, que reavalie os cadastros do programa com o objetivo, a meu ver remoto, de ressarcimento aos cofres públicos de pagamentos originários de corrupção e falsificação. É preciso identificar os responsáveis pelos crimes praticados, tanto por não haver conferência dos dados apresentados, quanto também pelo recebimento em nome de pessoas falecidas.
LIGHT E AMERICANAS – A Light, cujas dívidas se elevam a R$ 11 bilhões, que se encontra em recuperação judicial, está reivindicando do governo que renove a sua concessão para explorar e comercializar energia elétrica do Estado do Rio de Janeiro por mais 30 anos. Os possuidores de debêntures das Lojas Americanas, no montante de R$ 5,1 bilhões, que correspondem a 12% dos R$ 42 bilhões devidos pela empresa ao mercado, estão se movimentando para obter ou da empresa ou através da Justiça, maior poder de negociação.
Os titulares de debêntures desejam também que seis mil acionistas da empresa sejam contabilizados como votos individuais. Com isso, visam diminuir o poder de Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Alberto Sicupira, os três principais acionistas, e que tiveram o desplante de publicar páginas inteiras no O Globo, na Folha de S. Paulo, no Estado de S.Paulo e no Valor dizendo que não sabiam de nada sobre a manobra fiscal calamitosa.
BANCOS – Os Estados Unidos devem US$ 31 bilhões aos bancos internacionais,uma cifra que é uma recorde absoluto. Como essa dívida foi constituída? Só pode haver uma explicação. As receitas oficiais não conseguiram através do tempo superar as despesas.
No Congresso houve acordo entre democratas e republicanos, o que garantiu a aprovação do projeto do presidente Joe Biden. Não fosse a aprovação para aumentar o limite das dívidas, teria ocorrido o primeiro calote oficial na história do país desde 1492. A força dos bancos está caracterizada cada dia mais forte e permanente.
JUROS – Ampla reportagem de Daniele Madureira, na Folha de S.Paulo deste sábado, revela a atmosfera que está envolvendo grandes redes de varejo do país, pressionadas em seus resultados pela queda de consumo e juros altos que afetam o endividamento. No primeiro trimestre do ano, a alta de 0,2% do consumo das famílias, ficou mais relacionada aos serviços e bens essenciais e menos aos bens como aparelhos eletrônicos e móveis que dependem de financiamento bancário ou comercial.
O escândalo contábil das Lojas Americanas causou um vendaval contra o varejo , inclusive com a restrição de crédito por parte dos bancos. A reportagem é acompanhada de um quadro estatístico sobre a situação das vendas das redes com as dívidas que possuem. A tão sonhada volta ao normal da comercialização continua sendo adiada por mais um trimestre.
COMUNICAÇÃO – Na última semana, foram desfechadas críticas ao governo Lula por falta de comunicação que teria causado dificuldades no relacionamento entre o Executivo e o Legislativo. Não creio que a causa seja essa, mas que está havendo falta de comunicação, não há dúvidas.
Vem a questão dos aluguéis corrigidos pelo IGPM. No governo Bolsonaro houve anos em que o reajuste das locações, envolvendo sete milhões de unidades residenciais, subiu entre 12% a 15%. No governo Lula, agora em 2023, o acréscimo foi de apenas 1,9%. Resultado positivo e de interesse popular. Mas o governo não divulgou.