Carlos Chagas
Há uma explicação paralela para essa corrida desenfreada atrás de cargos no segundo escalão do governo, com ênfase para presidências e diretorias de empresas estatais de todo tipo: os bônus que anualmente são distribuídos às suas principais figuras. São dezenas de milhões, senão mais, tirados do lucro dessas empresas que ganham o bolso de seus dirigentes. Uma espécie de cortina-de-fumaça impede que se tenha a conta precisa de quanto dinheiro é escoado do Banco do Brasil, da Caixa Econômica, dos Correios, da Petrobrás, de Itaipu, dos Bancos da Amazônia, do Nordeste e de tantas outras entidades governamentais ou mistas.
Que as empresas privadas façam essa festa com os recursos de seus acionistas, já se trata de um exagero, mas, pelo menos, os recursos são deles. Deveriam, é claro, pertencer aos seus funcionários e trabalhadores de forma igualitária, mas como são os diretores que arbitram os próprios bônus, quase sempre na condição de proprietários, prevalece aquela máxima do “Mateus, primeiro os teus”.
O que salta aos olhos como aberração é que nas empresas públicas aconteça o mesmo. Por que, além de muito bem remunerados, com todo o tipo de mordomias ao seu dispor, esses felizardos ainda fazem jus às benesses destinadas, como prática, às empresas privadas?
A recente crise econômica mundial, entre 2008 e 2009, teve suas raízes numa série de fatores, a começar pela especulação desenfreada e o assalto à poupança popular, em especial imobiliária, nos Estados Unidos, espraiando-se pelo resto do planeta. Mesmo na pior, próximas da falência, instituições financeiras tradicionais continuaram premiando seus diretores com fábulas de dólares. O resultado, todo mundo sabe: desemprego, multiplicação da pobreza, retrocessos de toda ordem.
Como a crise internacional, pelo que dizia o governo Lula, quase não nos atingiu, a moda de bônus nas empresas estatais continuou e até se ampliou. Além do privilégio descabido, consequências acabarão nos atingindo.
MEDITAR PARA NÃO DESMORALIZAR
Vem aí a Semana Santa, tempo de meditação até para quem não é religioso. Seria bom que deputados e senadores, em maioria dispostos a permanecer fora de Brasília, aproveitassem os próximos dias para indagar se não estão encenando uma farsa. No caso, em torno da reforma política. Porque nada de fundamental será aprovado para a transformação de nossos postulados partidários e eleitorais. Perfumarias poderão emergir dos debates, como a mudança na data das posses de presidentes da República, governadores e prefeitos: em vez do primeiro dia do ano, pleno de obstáculos etílicos, 10 ou 15 de janeiro. Também a extinção da segunda suplência para senadores. Quem sabe o voto facultativo.
Todo o resto em debate não sofrerá alteração. A reeleição continuará. O voto em listas partidárias, em vez de personalizado, para deputado, permanecerá mero sonho de noite de verão. A redução do número de partidos, da mesma forma. Assim como o financiamento público das campanhas e as candidaturas avulsas, sem partidos. E o referendo popular.
Melhor seria, então, desfazer o circo, retirando a lona, o mastro central e as arquibancadas sem que o respeitável público possa perceber. Mudanças, para a classe política, só as que beneficiam. As capazes de prejudicar ficam para depois…
DEPOIS DE KASSAB
Anunciam os organizadores do PSD, partido do prefeito Kassab, já terem conquistado dois senadores e 28 deputados federais para comporem a nova legenda. Oriundos, em maioria, do DEM e do PSDB, quer dizer, fugidos da oposição. Vão todos, a começar pelo fundador, para os braços do governo Dilma Rousseff. Ouve-se até que candidatos a cargos no segundo escalão.
Como a manobra não deu para abrigar todos os oposicionistas sequiosos de aderir à situação, prevê-se para breve a fundação de outro partido dito independente, mas, na realidade, pronto para transportar nova leva de adversários para o guarda-chuva oficial. Vai uma sugestão, já que a experiência atual nos remonta ao passado: que tal criarem a UDN?
BATE-PRONTO
O Alto Tucanato reagiu de imediato à esdrúxula sugestão de Fernando Henrique, sobre as oposições esquecerem o povão e cuidarem apenas da classe média. Logo depois da proposta do sociólogo o governador Geraldo Alckmin anunciou programas de transferência de renda, ampliando facilidades para refeições populares, bolsas de estudo, cursos profissionalizantes e implantação de creches na periferia de São Paulo e outras cidades.
De Belo Horizonte chegam informações de que o governador Antônio Anastásia pretende fazer o mesmo, por certo que depois de entender-se com o senador Aécio Neves. Como José Serra não detém mandato executivo, ficará nas análises verbais, mas eis aí uma boa plataforma para disputar a prefeitura de São Paulo, ano que vem…
Fonte: Tribuna da Imprensa