BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) - A primeira audiência na Câmara dos Deputados com um ministro do governo Lula (PT) foi marcada por bate-boca entre opositores e aliados do Palácio do Planalto.
Flávio Dino (Justiça) foi à CCJ (Comissão de Constituição de Justiça) da Casa, negou omissão das forças federais nos ataques golpistas de 8 de janeiro e acusou bolsonaristas de disseminarem fake news sobre sua visita ao Complexo da Maré (RJ).
Uma das principais razões de desavença foi a decisão de Dino de acusar deputados e senadores bolsonaristas ao STF (Supremo Tribunal Federal) pela divulgação de falsidades associando sua ida à Maré a um suposto envolvimento com grupos criminosos.
Um dos alvos do processo, o deputado federal Carlos Jordy (PL-RJ) afirmou que Dino não poderia apresentar notícia-crime contra parlamentares.
"A Constituição diz que deputados e senadores são invioláveis, penal e civilmente, por quaisquer de suas palavras, opiniões e votos. Eu queria saber do ministro qual o entendimento da palavra 'quaisquer'. Não há exceção", disse.
Em resposta, Dino afirmou que a imunidade parlamentar não é um "direito absoluto", como reconhecido pelo STF.
"A imunidade parlamentar não é escudo para o cometimento de crime nem camisa de força para maluquice. É um instituto constitucional, e eu preciso lidar com carinho para que ele seja preservado", completou.
Deputados da oposição disseram considerar o ministro desrespeitoso ao responder a uma pergunta do deputado André Fernandes (PL-CE), que o acusou falsamente de responder a mais de 200 processos na Justiça, segundo pesquisa que o parlamentar disse ter feito em um site jurídico.
O ministro recorreu ao deboche para responder às acusações do parlamentar. "Deputado da CCJ dizer que pesquisou no Jusbrasil: eu vou contar para os meus alunos como anedota, como piada. O senhor acaba de entrar no meu livro de memórias", disse o ministro, que explicou que o sistema de buscas do site identifica registros de candidaturas e prestação de contas à Justiça Eleitoral, entre outros resultados.
"Dizer com base no Jusbrasil que eu respondo a processos se insere no mesmo continente mental de quem acha que a Terra é plana", completou.
Em respostas, o deputado André Fernandes, investigado em inquérito no STF por incitar os atos de vandalismo em 8 de janeiro, pediu "respeito". "O ministro não está em campanha aqui, não."
O ministro também usou de ironia ao dizer que não teria problema em voltar outras vezes à Câmara para discutir assuntos relacionados ao Ministério da Justiça e Segurança Pública.
"Não tenho medo do embate: um momento como este, para mim, é um alento na alma. Quem quiser me ver feliz, me chame aqui toda semana, porque estou realmente encantado com a possibilidade de conhecer as senhoras e os senhores. É um aprendizado para mim --eu, estudioso da alma humano e que tenho a tarefa de 28 anos de dar aula de direito", afirmou.
Durante a audiência, Dino ainda afirmou que o governo federal não foi omisso nos ataques às sedes dos Poderes em 8 de janeiro. Ele disse que manteve contato com os governadores Cláudio Castro (Rio de Janeiro), Tarcísio Freitas (São Paulo) e Ibaneis Rocha (Distrito Federal), na véspera dos atos, para pedir atenção às manifestações bolsonaristas.
"No caso de Brasília, é público e notório, o próprio Ibaneis já disse: disseram uma coisa para ele e ocorreu outra coisa [...] A Polícia Militar do Distrito Federal, infelizmente, não cumpriu aquilo que estava escrito no planejamento operacional da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal", disse.
Dino foi alvo de pedidos de convocações e convite em diversas comissões da Câmara. A maioria foi protocolada por deputados bolsonaristas nas comissões de Segurança Pública e de Fiscalização e Controle.
O governo, porém, desenvolveu uma estratégia própria para chamar o ministro a prestar esclarecimentos antes na CCJ, cujo presidente é o deputado federal Rui Falcão (PT-SP).
Antes da sessão desta terça, parlamentares da base do governo se reuniram na sala da presidência da CCJ para definir uma estratégia para blindar Dino durante a audiência.
O plano, segundo relatos de participantes do encontro, envolveu obstruir a sessão quando a tropa bolsonarista subir o tom e inscrever o máximo de deputados aliados ao Planalto para falar, utilizando todo o tempo regimental para reduzir a atuação da oposição.
Dino foi convocado para explicar uma série de fatos envolvendo o Ministério da Justiça e Segurança Pública no início do governo Lula.
Os parlamentares perguntaram sobre a atuação da pasta nos ataques às sedes dos Poderes em 8 de janeiro, o decreto que limitou o acesso da população a armas e a visita de Dino ao Complexo da Maré.
Na véspera da audiência, Dino ainda bloqueou o perfil do deputado federal Nikolas Ferreira (PL-MG) em uma rede social. O caso reacendeu as críticas de bolsonaristas ao ministro.
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