Eduardo Gonçalves
O interventor federal na segurança pública do Distrito Federal, Ricardo Cappelli, afirmou nesta sexta-feira que o acampamento montado em frente ao Quartel-General do Exército funcionou como um "centro de construção de planos contra a democracia". Ao apresentar um relatório sobre o período da intervenção, que será entregue ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, Cappelli chamou o acampamento de "mini cidade golpista".
— A primeira questão é a centralidade do acampamento que foi montado em frente ao QG do Exército. A centralidade dele em tudo o que aconteceu e culminou no dia (8 de janeiro). Isso fica claro e evidente — afirmou. — Todos os atos de vandalismo passaram a sua organização, planejamento e ponto de apoio no acampamento, que virou um centro de construção de planos contra a democracia brasileira — disse Cappelli.
Para embasar a sua argumentação, Cappelli declarou que foram identificadas 73 ocorrências policiais, de furto e roubo, no entorno do acampamento. Essas informações constam do relatório produzido pela equipe do interventor.
O documento mostra o passo a passo de como o acampamento foi montado desde o fim do segundo turno das eleições e desmontado no dia 9 de janeiro.
O texto também irá indicar omissões por parte de integrantes da Secretaria de Segurança Pública do DF e da Polícia Militar do DF que não conseguiram conter a invasão dos manifestantes aos prédios do Planalto, Congresso e STF. O interventor afirmou que os manifestantes levaram 1h40min da saída do acampamento até passarem pela primeira barreira, o que, segundo ele, foi tempo suficiente para que mais tropas da PM fossem acionadas para impedir o avanço na Esplanada, o que não ocorreu.
Segundo Cappelli, "não faltaram informações" de inteligência que indicavam o que aconteceria na Praça dos Três Poderes - algumas delas enviadas ao então secretário da SSP, Anderson Torres, que foi exonerado do cargo e preso por ordem do Supremo.
O interventor diz que há registros de reuniões e informes do órgão mostrando esses alertas.
Ele ainda enfatizou que houve "uma falha operacional" por parte da Polícia Militar e que o então comandante da PM, coronel Fábio Augusto, "perdeu capacidade de comando" sobre a tropa. O coronel está preso desde o dia 10 de janeiro por ordem de Moraes.
Em sua fala, Cappelli isentou o então comandante de suposta conveniência com os atos golpistas, dizendo que ele atuou para defender os prédios públicos e chegou a ser ferido na cabeça por um cone arremessado por um manifestante.
— Há uma falha operacional, porque o relatório de inteligência, que existe, não gerou o desdobramento adequado — disse o interventor, acrescentando que, conforme as imagens de segurança, havia apenas 150 homens na contenção inicial dos manifestantes.
'Ação profissional'
Cappeli afirmou também que o relatório aponta que houve uma "ação profissional" da parte dos manifestantes. Ele cita como exemplo a forma como foi derrubado o primeiro gradil de contenção:
— É impressionante como num dado momento eles puxam a primeira linha de gradis. E ela cai. Há um movimento coordenado e isso chama muita atenção — diz ele, acrescentando que havia pessoas com rádios comunicadores.
Além disso, segundo Cappelli, a linha de contenção era formada por policiais "estudantes", da escola de formação de praças, que não possuíam a vestimenta adequada para conter manifestações, como o exoesqueleto.
Ele ainda lembrou que havia nove oficiais do comando da Polícia Militar do Distrito Federal de férias no dia 8, entre eles o chefe do Batalhão de Choque da Polícia Militar.
Cappelli acusou Anderson Torres de ter provocado uma "instabilidade" na Secretaria de Segurança Pública do DF que culminaram com a inação das forças de segurança no dia 8:
— A instalibidade que ele gerou com as exonerações e trocas [no comando]. Logo depois ele viaja, recebe um relatório de inteligência e esse relatório não tem nenhum desdobramento. Não é só uma questão burocrática — disse o interventor.
Ele complementou que uma das suas primeiras ações à frente da SSP foi exonerar todos os indicados por Torres.
A intervenção federal começou na noite do dia 8 de janeiro, logo após a invasão e depredação das sedes dos Três Poderes da República, e encerra na próxima terça-feira, dia 31. A partir de então, o delegado da Polícia Federal Sandro Avelar assume a Secretaria de Segurança Pública do DF. Cappelli, por sua vez, volta à secretaria-executiva do Ministério da Justiça.
Avelar assume o cargo deixado pelo ex-secretário Anderson Torres, que foi exonerado no dia 8 e está preso por ordem do Supremo Tribunal Federal.
Cappelli também listou as denúncias que embasaram a instauração dos seis inquéritos policiais militares (IPM):
1) apuração da conduta do Batalhão de Choque da PM que não impediu a entrada de manifetantes no Congresso Nacional;
2) investigação em relação aos policiais que estavam conversando e tirando fotos enquanto ocorria a invasão no prédio dos Três Poderes;
3) apuração de responsabilidade na linha de comando da Polícia Militar do Distrito Federal que falhou na mobilização de batalhões e efetivo, apesar dos alertas da inteligência;
4) suspeita de policiais militares que arrecadavam recursos para o acampamento e trabalhavam na segurança privada do local;
5) investigação da conduta de um policial militar que chutou uma manifestante dentro do Palácio do Planalto;
6) apuração sobre os motivos que levaram a tropa da PM a recuar e desmobilizar a linha de contenção que dava acesso à sede do Supremo Tribunal Federal.
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