Financiamento público aos partidos drena recursos de políticas públicas e degrada a representação democrática
Historicamente, as eleições no Brasil estão entre as mais caras do mundo. Agora, conforme apurou o Estadão, os gastos em 2022 devem igualar ou até ultrapassar os de 2014, a disputa mais cara até então, com uma diferença: em 2014 a maior parte foi bancada por empresas; agora, será com dinheiro público.
A boa notícia, por sinalizar o engajamento dos cidadãos, é que as doações de pessoas físicas devem atingir um recorde. A péssima notícia é que os R$ 165 milhões arrecadados nos dez primeiros dias de campanha, que durará 45, são só uma fração irrisória dos R$ 6 bilhões em recursos públicos dos Fundos Eleitoral e Partidário.
Partidos políticos são entidades privadas, que devem ser sustentadas com dinheiro privado doado por seus simpatizantes.
Nos últimos anos houve avanços. Em 2015, a Suprema Corte proibiu a doação de empresas, que, afinal, não votam nem têm direitos políticos. A vinculação das campanhas aos interesses empresariais era uma distorção do processo político e abriu margem a casos vultosos de corrupção.
Mas não se corrige uma distorção com outra. Como mecanismo provisório, até que os partidos reorganizassem seu financiamento, o Fundo Eleitoral, criado em 2017, até poderia ser defensável. Mas desde então ele saltou de R$ 1,7 bilhão, em 2018, para quase R$ 5 bilhões, em 2022. Some-se a isso a escalada do Fundo Partidário, que, entre 1995 e 2018, descontada a inflação, cresceu 9.766%.
Enquanto o financiamento aos partidos cresce, os investimentos em saúde, educação ou infraestrutura se contraem. Mas, mais do que drenar recursos do Tesouro, o financiamento aos partidos empobrece a representatividade democrática. A subvenção é injusta, por obrigar os cidadãos a custear legendas com as quais não raro discordam, e é corrosiva, por habituar os políticos a aliciar eleitores nas eleições e, depois, lhes darem as costas, entregando-se a administrar feudos controlados por poucos caciques.
Segundo a Transparência Partidária, entre 2008 e 2018, o porcentual de mudança da composição das Executivas Nacionais foi de ínfimos 24%. Não surpreende que o número de filiados esteja em queda.
Para piorar, como disse o diretor da Transparência Brasil, Manoel Galdino, “o Fundo Eleitoral ficou maior sem aumentar a transparência e a fiscalização”, ampliando a margem para candidaturas “laranjas”, gastos fictícios e enriquecimento ilícito.
Tudo isso contribui para a quantidade aberrante de legendas amorfas, que atuam exclusivamente como um balcão de negócios. A credibilidade dos partidos e do Legislativo entre a população diminui, abrindo margem a aventureiros populistas.
É difícil imaginar um mecanismo mais apto a perpetuar a crise de representatividade, que só se aprofundou desde 2013, do que o financiamento público aos partidos. O seu fim é crucial para que as legendas se obriguem a criar conteúdos programáticos aptos a cativar os corações e mentes dos cidadãos. Se, ao contrário, ele continuar a crescer, a distância entre os eleitores e os representantes eleitos também aumentará.
O Estado de São Paulo