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terça-feira, novembro 25, 2008

O elefante abriu um olho

Por: Carlos Chagas

BRASÍLIA - A reação veio tarde, mas melhor que tivesse vindo. Porque o Brasil estava na posição daquele elefante posto em sossego quando começaram, com todo o respeito, as provocações dos cães, aqueles presidentes que, na América do Sul, se elegeram na esteira política de Lula.
Primeiro foi Nestor Kirschner, da Argentina, simplesmente bancando o mal-educado, falando no telefone-celular numa reunião no Rio, dirigida pelo nosso presidente, que discursava na ocasião. Depois, retirou-se abruptamente para o aeroporto, antes do término dos trabalhos. O segundo foi Hugo Cháves, da Venezuela, especializando-se em dizer gracinhas e fazer chistes contra nós, em público, diante de um Lula constrangido, mas educado.
Como os testes provocativos não geraram reações, subiram um patamar. Evo Morales, da Bolívia, ocupou e desapropriou refinarias da Petrobras, utilizando até soldados do Exército. Chegou a cortar por poucos dias o fornecimento de gás para o Brasil e exigiu novos preços. Diante do silêncio do governo brasileiro, continuaram confundindo tolerância com fraqueza. O bispo do Paraguai denunciou o contrato de Itaipu, ameaçou vender para o Chile e a Argentina parte da energia que mandamos de graça e compramos de volta, também exigindo aumento. Ainda anunciou que expulsaria fazendeiros brasileiros plantadores de soja em seu território.
Ao mesmo tempo Rafael Correa, do Equador, expulsou uns e prendeu outros funcionários de uma empreiteira brasileira, denunciando contratos de construção de uma usina elétrica e, finalmente, declarou o calote em dívida de seu país com o BNDES, sem nos participar ou buscar entendimento. Reagimos agora, ainda que de forma protocolar, convocando nosso embaixador em Quito, para consultas. O elefante abriu um olho. Será o bastante?
Tumores em progressão
No dia-a-dia da política, vão aumentando os tumores. Michel Temer é candidato forte à presidência da Câmara, mas, hoje, parece longe da vitória antecipada. Enfrenta duas ordens de dificuldades: a rebelião dos senadores do PMDB, que não abrem mão de eleger o presidente da Casa pode levar o PT e adjacências a votar em Ciro Nogueira; a prorrogação do próprio mandato como presidente do PMDB racha o partido, com forte grupo infenso a não permitir a bipresidência.
No Senado, apesar de suas negativas táticas, José Sarney é candidatíssimo ao lugar ocupado por Garibaldi Alves. A seu lado, o ex-presidente Renan Calheiros repete sempre que a bancada de senadores carece de interesse na eleição de Michel Temer na Câmara. Sarney tem compromisso com o presidente do PMDB para ajudá-lo a eleger-se na Câmara e para permanecer na presidência do partido, mas, como ficou contra a prorrogação dos mandatos partidários, talvez lave a mãos nesse último caso. O diabo é que se Michel vier a ser forçado a promover eleições no âmbito do Diretório Nacional do PMDB, mesmo tendo sido prorrogado, perderá gás em sua aspiração de presidir a Câmara.
No meio desse rolo, o presidente Lula reafirma seu apoio a Michel Temer, na Câmara, e a Tião Viana, no Senado, mas ficará muito feliz se José Sarney e Ciro Nogueira vencerem. As eleições para as chefias parlamentares acontecerão a 2 de fevereiro, mas um mês antes precisarão estar definidas. Caso contrário, perderão quase todos: o PMDB, o PT, o palácio do Planalto, as oposições e, em especial, o processo sucessório, capaz de entrar em nova etapa sob os escombros da aliança até agora mantida entre Executivo e Legislativo.
Lula senador?
Começou a correr em Brasília mais uma variante nessa confusão que envolve a candidatura de Dilma Rousseff, o terceiro mandato, a prorrogação geral de mandatos por dois anos, o ingresso de Aécio Neves no PMDB e a irredutibilidade de José Serra em tornar-se o candidato tucano.
Admite-se que o presidente Lula, se não quiser mesmo permanecer, aceitaria candidatar-se ao Senado por Pernambuco. Ficaria preservado, com mandato parlamentar, pronto para retornar em 2014.
Um obstáculo, porém, atrapalha essa armação: para disputar uma cadeira de senador em 2010, o presidente precisaria, pela lei, renunciar em abril daquele ano, seis meses antes da eleição. Mesmo confiando cegamente em José Alencar, e sem uma única dúvida a respeito da vitória em seu estado natal, aceitaria Lula abrir mão de pouco menos de um ano de mandato presidencial, precisamente quando deverá colher os últimos frutos de sua administração?
Há quem sugira uma espécie de jeitinho a ser dado no bojo da reforma política, alterando-se a Constituição com base no raciocínio de que para reeleger-se, um presidente da República não precisa deixar o cargo. Por que a exigência, então, para disputar o Senado?
Trata-se de um casuísmo muito perigoso, porque se a lei maior puder ser mudada para facilitar uma eleição de senador, por que não mudá-la de uma vez para permitir o terceiro mandato? É por aí que as conversas celeradas continuam fluindo...
Fonte: Tribuna da Imprensa

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