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sexta-feira, novembro 21, 2008

BRASIL VERSUS EQUADOR

Laerte Braga

O ministro Celso Amorim é um dos mais brilhantes diplomatas da história do Itamaraty. Sério, inteligente, lúcido e íntegro. Um dos pontos altos (dentre os poucos) do governo Lula. Chamar o embaixador do Brasil junto ao governo do Equador diante da negativa do presidente daquele país, Rafael Corrêa, em aceitar como dívida equatoriana um empréstimo feito à empreiteira Norberto Odebretch é uma atitude que acredito reflita muito mais a posição de setores outros do governo que propriamente do Ministério das Relações Exteriores. Os governos brasileiros estão acostumados a lidar com presidentes de países sul americanos que sejam compráveis. Ou seja, as empresas brasileiras ganham concorrências em acordos fraudulentos, fazem obras abaixo das especificações contratadas e o pagamento fica por conta desses governos não importa quanto, pela simples razão que um presidente padrão Álvaro Uribe, por exemplo, leva no mínimo 20% de cada obra contratada. No governo corrupto de Fernando Henrique foram feitos vários contratos assim com presidentes da Bolívia (anteriores a Evo Morales) na questão do gás. À época da ditadura militar um contrato nesses moldes foi celebrado com o general Alfredo Stroessner, do Paraguai, sobre o preço da energia de Itaipu (a parte comprada pelo Brasil). Preços abaixo dos de mercado e comissão para ambos os lados. Propina mesmo. E bem mais além da América do Sul. A diplomacia estabelecida pela ditadura em relação a países árabes, como o Iraque e a Líbia, implicavam nesse tipo de contrato e foi por lá, no Iraque, que se estrepou a Mendes Júnior. A própria Odebretch andou por lá. Empreiteiras como essas não são empresas, são quadrilhas. No caso do Equador a Noberto Odebretch (envolvida em várias falcatruas no Brasil, inclusive com o governo de José Serra no caso do metrô de São Paulo) ganhou a concorrência para a construção da usina hidrelétrica San Francisco. O governo equatoriano contraiu um empréstimo de 243 milhões de dólares junto ao BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social) para o empreendimento e nunca viu a cor do dinheiro. Foi passado diretamente à empresa. A Odebretch, acostumada a lidar com presidentes/corruptos, venais, ganhou força com a ditadura, foi beneficiada por todos os presidentes desde Sarney, construiu uma usina aquém do contratado, sem respeito ao pré-estabelecido e por essa razão o contrato foi rompido e o pagamento, lógico, não vai ser feito ao BNDES pela simples razão que devedora é a empresa que não cumpriu os termos do contrato. Nessa vocação imperialista de governos brasileiros junto a países sul americanos, o governo do Equador, agora com um presidente responsável, sério e voltado para os interesses de seu país, resolveu questionar o contrato, e o que fez a Norberto Odebretch, junto a organismos internacionais encarregados de dirimir dúvidas e julgar fatos dessa natureza. No caso o Equador está recorrendo à Câmara de Comércio Internacional, em Paris. Quer a anulação do contrato por violações legais e constitucionais. Jorge Glass, presidente do Fundo de Solidariedade ao Equador é claro em dizer que o contrato “tem vícios de ilegalidade”. Vale dizer propina embutida em cláusulas daquelas que costumam vir em letrinhas pequenas e que enganam desde o consumidor comum do dia a dia, até um governo. A medida faz parte da auditoria da dívida externa do Equador, um levantamento feito exatamente para apurar esse tipo de delito comum e freqüente entre os governos brasileiros e governos corruptos com os quais o Brasil negocia. O Brasil emprestou um dinheiro a Norberto Odebretch e lançou o governo do Equador como o devedor. O governo do presidente Corrêa denuncia falhas na obra da hidrelétrica de Toachi-Pilató e afirma que a empreiteira (quadrilha) desviou recursos que deveriam ser aplicados ali para outros fins (devem estar no fundo de campanha de José Serra em 2010). Por coincidência ou não, para o Equador foi o engenheiro da empresa responsável pelas obras do metrô de São Paulo e indiciado no inquérito do chamado buraco do metrô, que resultou em mortes. A decisão do Equador tem duas frentes. A primeira delas suspender a vigência dos contratos, não reconhecer a dívida e estender esse não reconhecimento a dívidas outras negociadas com ingerência do FMI (Fundo Monetário Internacional), o que eleva o percentual e os custos das propinas, pois tem que pagar os caras do Fundo. Corrêa não vai pagar a dívida enquanto não houver decisão de instâncias internacionais sobre o assunto, expulsou a empreiteira/quadrilha de seu país (não vai passar fome, têm várias obras em vários pontos do Brasil) e noutra ponta, determinou que sejam levantados os nomes dos funcionários equatorianos responsáveis pelas negociações dessa dívida e de outras junto ao Brasil, para que sejam punidos. É claro que a Norberto Odebretch, uma das grandes acionistas do Estado brasileiro desde a privatização de tudo feita pelo venal Fernando Henrique Cardoso, vai chiar e chiar muito, está chiando. E não quer nem reconhecer que não fez a obra como especificado no contrato, muito menos assumir que desviou dinheiro para outros fins ou assumir as responsabilidades pela dívida. A Mendes Júnior fez a mesma coisa no caso do Iraque. Foi para o brejo, mas os donos não. Vivem como marajás em Minas e no circuito, como dizem. São “geradores de progresso”, amigos de Aécio. Há uma realidade diferente em vários países latino americanos, caso do Equador, da Bolívia, da Venezuela, do Paraguai, da Nicarágua e de Cuba. Seus presidentes não são compráveis como o da Colômbia ou a do Chile. E aí tem sempre um general desses cheios de medalhas por tantos paus de arara, tantos choques elétricos, tantos estupros, tantas mortes, disposto a uma nova guerra na defesa do Brasil, leia-se, das empresas privadas e evidente, do “pão nosso de cada dia”. E é lamentável que um fato como esse ocorra num governo supostamente integrado ao resto dos países latino-americanos, ou ainda, um governo supostamente forte para enfrentar os bandidos/empreiteiros e não de capitular e fazer o jogo dessas quadrilhas. Por aqui o trem é fogo. Pastinha que é ladrão de mixaria transforma, ele e sua quadrilha, na verdade bando né, coisa de merreca, em grana viva mudando hotel em sede suntuosa. No Natal então, o dito fica doido atrás de “brindes”. Que dirá a Norberto Odebretch. O pessoal da Norberto Odebretch, como o da OAS, da Queiroz Galvão, essa turma toda, tem lugar certo em qualquer cadeia de qualquer país onde as leis sejam respeitadas e o desrespeito seja crime. O presidente do Equador não tomou a atitude que tomou como hostilidade ao Brasil, mas a criminosos brasileiros que ludibriaram seu país, assim causaram prejuízo a seu povo. O governo brasileiro deveria, sendo Lula, tomar as decisões corretas e punir empresários brasileiros que mundo afora vão fazendo trapaças e mais trapaças, caso dessa empreiteira e outros. Se assim não o fizer fica difícil acreditar que exista um mínimo de resquício de qualquer coisa que valha no governo Lula. Se o nosso complexo militar/empresarial queima no golpe porque diminuem os ganhos, azar deles. Já imagino o escarcéu que William Bonner vai fazer com um tipo de notícia assim. Deve convocar os brasileiros à guerra contra o Equador. A empresa faz parte do elenco que tem parte da GLOBO, falo da consciência (se isso existe por lá) da turma que mente a mentira nossa de cada dia na mídia comprável e a venda, sempre pronta a uma “gorjeta”. E Lula deve aprender a lidar com presidentes sérios, do contrário se desmoraliza nos achegos e arreglos com gente do tipo Bachelet, o tal “primeiro o nosso, depois o resto”.

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