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segunda-feira, novembro 19, 2007

Mobilização da Igreja derruba proposta sobre aborto

BRASÍLIA - A mobilização bem-sucedida dos setores contrários à ampliação do aborto, com apoio explícito da Igreja Católica e da Pastoral da Criança, levou os delegados da 13ª Conferência Nacional de Saúde a rejeitarem ontem a proposta de legalização total do aborto no País. Os delegados da Região Nordeste, que atenderam ao apelo da Igreja, foram fundamentais para a vitória antiaborto.
A decisão impôs uma derrota ao ministro da Saúde, José Gomes Temporão, que defende a descriminalização do aborto por meio de projeto de lei, e deve reforçar as pressões no Congresso contra projetos favoráveis à interrupção de gravidez. Realizada a cada quatro anos, a Conferência tem as deliberações usadas na formulação de políticas públicas.
A proposta de legalização do aborto foi a primeira a ser votada no plenário final do encontro, que reuniu em Brasília cerca de 5 mil participantes, 3.068 deles com direito a voto.
A redação original da moção sobre a livre interrupção da gravidez não tinha a palavra "aborto", mas um grupo de delegados, orientados pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), conseguiu tornar explícita a intenção com a inclusão da palavra no texto.
A expectativa do governo era de que a descriminalização do aborto fosse aprovada no plenário final, já que 7 das 10 plenárias prévias aprovaram a proposta. Mas de sábado para ontem, os setores contrários intensificaram o corpo-a-corpo junto aos delegados e organizaram uma estratégia bem-sucedida para derrubar a proposta.
Eles chegaram cedo ao local de votação, ocuparam as primeiras cadeiras e conseguiram eliminar o último debate, aquele que precede a decisão definitiva. É que as regras da Conferência permitem que cada lado faça a defesa - a favor ou contra - antes da votação final. Mas a maioria votou que esse debate não era necessário.
"O governo fica enfraquecido na sua decisão, porque a Conferência decidiu que em relação ao aborto nos próximos quatro anos a posição é essa", comemorou Clóvis Boufleur, da Pastoral da Criança, e um dos principais articuladores do movimento contra o aborto.
Segundo ele, a vitória só foi possível depois que a palavra "aborto" foi incluída no texto da proposta a ser votada. "Muitas pessoas não sabiam direito o que estavam votando", disse o representante da Pastoral, autor do recurso para incluir a palavra "aborto" na moção.
Para Boufleur, a decisão reflete a posição da sociedade e reforça a pressão política no Congresso contra a aprovação de projetos a favor do aborto. Um deles, de autoria do deputado José Genoino (PT-SP), está pronto para ser votado na Comissão de Seguridade Social da Câmara - o projeto propõe a legalização total do aborto, deixando a decisão a cargo das mulheres.
"O Congresso deve ouvir sempre o povo e não só alguns focos de opinião popular. Então, certamente se algum deputado ou senador ainda está em dúvida sobre o que as pessoas ligadas à saúde querem, essa Conferência já definiu", disse.
Representante do ministro Temporão no último dia do encontro, o diretor de Ações e Programas Estratégicos do Ministério da Saúde, Adson França, favorável à proposta rejeitada, criticou a decisão, classificando-a de "hipócrita".
Segundo ele, o aborto é um problema de saúde pública, que precisa ser enfrentado pela sociedade. França reclamou do fato de a proposta ter sido a primeira a ser votada, quando o plenário ainda não estava cheio e era ocupado, na maioria, por representantes mobilizados pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
"Não houve o debate final e nem todo mundo estava presente ainda. Não foi o melhor horário para o debate", criticou. Ele disse que soube ontem de manhã que a proposta seria a primeira a ser votada. O presidente da 13ª Conferência Nacional de Saúde, Francisco Batista Júnior, disse que o resultado da votação refletiu o trabalho de articulação e mobilização dos movimentos contrários ao aborto.
Pelos seus cálculos, cerca de 70% dos delegados votaram a contra a proposta. Os votos são dados pelos delegados levantando os crachás. "Nós achávamos que seria necessária uma contagem dos votos", disse. A diretora da Rede Nacional Feministas da Saúde, Clair Castilhos, lamentou a decisão, mas destacou que o debate vai continuar.
Para ela, a decisão reflete o fundamentalismo de setores da sociedade brasileira. "Todo o caminho da libertação é longo e doloroso", ponderou. Ao longo dos três dias da conferência, as feministas fizeram várias manifestações em defesa do direito da mulher ao aborto.
Fundações
Além da proposta de descriminalização do aborto, o ministro da Saúde, José Gomes Temporão, também sofreu outra derrota na Conferência. Os delegados rejeitaram o projeto do governo que cria as Fundações Estatais de Direito Privado.
O projeto, em tramitação no Congresso, é considerado fundamental por Temporão para dar maior agilidade e eficiência aos hospitais. "A partir de agora, vamos pressionar o governo para retirar o projeto do Congresso e abrir um grande debate na perspectiva de implementar medidas que nós do Conselho Nacional de Saúde estamos defendendo, como profissionalização da gestão e carreira da saúde", disse Batista Júnior. Para ele, a criação das fundações seria o fim do Sistema Único de Saúde (SUS).
Fonte: Tribuna da Imprensa

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