Ataque à Ucrânia cria risco de quadro recessivo global, que impacta o Brasil
Com a ofensiva armada pela Ucrânia em curso e o anúncio de sanções econômicas à Rússia por parte das potências ocidentais, começam a se desenhar os impactos econômicos da guerra, que devem ocorrer em múltiplas frentes.
O primeiro e mais evidente é o salto das cotações de petróleo e gás, além de outras matérias-primas. No dia da invasão ao território ucraniano, o preço do barril de petróleo chegou a US$ 103, o maior desde 2014 —recuando quando ficou claro que o pacote de sanções europeias e americanas não atingiria o setor de energia.
Mesmo assim, a ação russa põe em risco as linhas de suprimento e, no caso do gás, a infraestrutura de transporte na Europa.
Com a maior inflação desde os anos 1980 e juros em alta no Ocidente, um choque adicional poderia levar a economia global a um quadro recessivo. Os bancos centrais teriam a inglória tarefa de endurecer a política monetária em meio à piora do emprego.
O problema será maior quanto mais tempo durar o conflito militar. No caso europeu, o encarecimento brusco do gás e, no pior cenário, a interrupção parcial ou total da oferta, implicaria forte contração da atividade industrial.
A outra frente de riscos advém justamente das sanções ocidentais, que se estendem ao bloqueio de transações com grandes bancos, empresas e oligarcas russos, controles de exportações de tecnologias sensíveis e outras medidas.
Por cálculo econômico, dada a dependência do gás russo em parte da Europa e o papel da Rússia no mercado mundial de alguns insumos essenciais, como fertilizantes, as sanções não incluem transações nas áreas de energia e agricultura.
Embora não seja suficiente para alterar a investida de Vladimir Putin, o custo para a economia do país será crescente. Caso o conflito se prolongue e cresça o número de vítimas, as sanções poderão ser ampliadas —no limite, até o bloqueio da compra de gás e petróleo.
Nesse caso, seria provável uma retaliação russa, que poderia interromper as vendas de fertilizantes, metais especiais e outros produtos críticos, com impacto negativo para o restante do mundo.
Cumpre não esquecer que, nessa hipótese extrema, a China provavelmente atuaria como compradora de última instância, garantindo o fluxo de dinheiro para Putin.
As consequências para o Brasil seguem essas linhas. Mais inflação e juros no mundo seriam ruins para o país, pois o fluxo de capitais para cá tenderia a ser menor.
Cotações de petróleo mais altas dificultariam a gestão doméstica dos preços dos combustíveis, o que reforçaria as tendências intervencionistas de Jair Bolsonaro (PL) e as ameaças aos cofres públicos.
Folha de São Paulo