Publicado em 27 de fevereiro de 2022 por Tribuna da Internet
Carlos Newton
O apresentador de TV, animador cultural, ator, compositor e produtor artístico Carlos Imperial (1935-1992) teve uma curta e exitosa experiência na imprensa escrita. Durante alguns meses, dividiu com o grande jornalista e cronista Raul Giudicelli a direção da “Fatos & Fotos”, na Editora Bloch. Foi a fase em que revista conseguiu a maior vendagem, exorbitando na capacidade de criticar e elogiar a tudo e a todos, numa confusão editorial da melhor qualidade.
“Sem liberdade para elogiar, nenhuma crítica é válida”, dizia Imperial à equipe da “Fatos & Fotos”, e às vezes enaltecia personagens que estavam sob ataque implacável do resto da mídia, inclusive da revista “Manchete”, que funcionava em outro andar da Bloch.
BOLSONARO É EXEMPLO – O caso da invasão e guerra na Ucrânia é um bom exemplo. A mídia inteira está batendo impiedosamente em Bolsonaro por não criticar a invasão da Ucrânia. É um verdadeiro festival e Putin está sendo até comparado a Adolf Hitler…
Mas aqui na Tribuna, fizemos questão de deixar claro que o assunto não é tão simples assim e a posição de neutralidade do Brasil deve ser a mais indicada, como indica a trajetória da diplomacia brasileira desde o insuperável Barão de Rio Branco, um verdadeiro cidadão do mundo, altamente democrático.
E neste sábado, o consultor Celso Serra publicou um importante artigo aqui na TI, sob o irônico título “Ucrânia caiu na lorota do acordo de não-invasão, como se fosse possível acreditar nas grandes potências…”. Em poucas linhas, num texto direto e inquestionável, Serra liquidou o assunto.
A ORIGEM DE TUDO – Conhecido por seus estudos de estratégia, Celso Serra lembrou a origem de tudo – o Memorando de Budapeste sobre Garantias de Segurança, assinado em 1994 por Rússia, Reino Unido, Estados Unidos e pelas três ex-repúblicas soviéticas com armas nucleares, Bielorrússia, Ucrânia e Cazaquistão.
Por esse acordo, os três países recebiam garantias de que suas soberanias territoriais seriam respeitadas, de que não seriam ameaçados pelas potências nucleares e de que os demais signatários não usariam a pressão econômica para influenciar suas políticas internas. Bielorrússia, Ucrânia e Cazaquistão concordaram, e se livraram em definitivo de seus arsenais “herdados” em 1991, com o desmantelamento da União Soviética.
Não estava escrito no acordo que as três ex-nações soviéticas poderiam voltar a ter armas nucleares instaladas pela OTAN. Era uma impossibilidade tão óbvia que a Rússia nem a exigiu. E o tratado foi assinado no governo de Bill Clinton, um democrata até pacifista em comparação a seu antecessor, o presidente George Bush, ex-diretor da CIA.
E TUDO MUDOU… – Bem, 25 anos depois, os Estados Unidos, o Reino Unido e seus aliados da OTAN, não mais que de repente, como diria Vinicius de Moraes, decidiram criar uma nova versão do Memorando de Budapeste, para incluir justamente a Ucrânia como novo país-membro do pacto anti-Rússia.
Assim, reeditando o episódio da crise dos mísseis em 1962, quando o presidente John Kennedy peitou a União Soviética e impediu a instalação de armamentos balísticos russos em Cuba, agora Putin perde a paciência e invade a Ucrânia.
A mídia ocidental, que é hegemonicamente americanófila, oculta toda a origem da crise e demoniza o presidente russo Vladimir Putin, que está reagindo contra a quebra de um importantíssimo acordo de desarmamento nuclear. Como assinalou Celso Serra aqui na TI, realmente não é possível acreditar nas grandes potências…
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P.S. – Na política internacional, não adianta se levar pelas aparências. Esse intrincado imbróglio na Ucrânia não é assunto do Brasil, que é membro do grupo BRICS (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul). O bom-senso recomenda neutralidade, conforme acertadamente Bolsonaro se postou, e está recebendo críticas de todos os lados. Bem, como dizia Carlos Imperial, quando todos criticam e ninguém elogia, alguma coisa está fora da ordem, até porque Nelson Rodrigues já nos ensinou que toda unanimidade é burra. (C.N.)