Renan Ramalho
Gazeta do Povo
Mesmo sem aprovação do projeto de lei para regulamentar as redes sociais, um órgão administrativo do Ministério da Justiça insiste em se antecipar na fiscalização das plataformas digitais.
Desde o início do ano, a Secretaria Nacional do Consumidor (Senacon), chefiada pelo ex-deputado petista Wadih Damous, tem intensificado a vigilância sobre as empresas, usando como base regras genéricas e antigas da atual legislação e também argumentos de quem defende a proposta que tramita na Câmara dos Deputados, com alta rejeição entre o público e parlamentares.
CONTROLE DO CONTEÚDO – Assim como o ministro da Justiça, Flávio Dino, também Damous tem usado a invasão às sedes dos Três Poderes, em 8 de janeiro, e a onda de ameaças e crimes violentos em escolas, como pretextos para pressionar as redes sociais a um maior controle de conteúdo.
Em fevereiro, por exemplo, o secretário cobrou de executivos da operadora de telefonia Vivo empenho contra a disseminação de “fake news”.
“Pautamos um compromisso que estamos buscando com todas as empresas, no sentido de não patrocinarem, não monetizar qualquer órgão, serviço de informação, plataforma, programa ou veículo de comunicação que traga desinformação ou mensagem de ódio que gerem desinformação e insegurança aos consumidores”, justificou Damous à época.
GOLPE DO CARTÃO – Em março, a Senacon exigiu que Google e Facebook retirassem do ar, sob pena de uma multa diária de R$ 15 mil, vídeos e postagens que propagavam um golpe, dizendo que pessoas poderiam resgatar taxas que seriam cobradas pelo governo no cartão de crédito, o que era falso.
Para fundamentar essa decisão, o órgão argumentou que as empresas tinham o “dever jurídico” de coibir fraudes em suas plataformas.
Em situações que envolvem crimes, argumentou, elas não estariam protegidas pelo Marco Civil da Internet, que diz que provedores só podem ser punidos por conteúdo gerado por terceiros caso descumpram uma ordem judicial de remoção.
NA LINHA DO PROJETO – Trata-se da mesma premissa do Projeto de Lei das Fake News, que busca obrigar as empresas a retirar do ar, sem necessidade de ordem judicial, manifestações que possam configurar diversos tipos de crimes, de racismo a atentados contra instituições, passando por incitação à violência contra crianças e adolescentes.
Críticos da proposta em tramitação no Congresso insistem que essa avaliação deve ficar a cargo do Judiciário, pelo risco de que as plataformas passem a remover, de forma massiva, postagens de usuários relacionadas a esses assuntos, mas que não configurem esses delitos.
Assim, a ideia é que essa avaliação seja feita por um juiz, após análise mais aprofundada do caso.
###
NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Inquietante essa pequena reportagem, enviada por Mário Assis Causanilhas. Parafraseando o pensamento eterno do poeta inglês John Donne, pode-se dizer que nenhum país é uma ilha. Assim, é conveniente que os três poderes brasileiros se baseiem no que está sendo feito nos países mais desenvolvidos. A humanidade está diante de algo novo — a comunicação imediata e direta entre os cidadãos, pelo avanço da internet e da telefonia. O que pode ser considerado uma dádiva não deve ser apressadamente tratado como uma maldição. Aliás, o Brasil está muito atrasado em termos jurídicos, é o único país da ONU que não prende criminosos após condenação em segunda instância. Portanto, fica ridículo tentar parecer moderninho no que tange às liberdades dos cidadãos ainda não condenados. Pense sobre isso. (C.N.)