Publicado em 5 de maio de 2023 por Tribuna da Internet
Rafael Moraes Moura
O Globo
Antes mesmo de começar a trabalhar, a CPI dos Atos Golpistas já colocou aliados do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Congresso em um dilema. Integrantes do governo e parlamentares da órbita petista ouvidos pela equipe da coluna ao longo dos últimos dias divergem sobre um ponto crucial: a conveniência política de convocar generais para depor sobre a omissão e a cumplicidade nos episódios que culminaram com a depredação das sedes dos três poderes em 8 de janeiro.
O tema tem potencial de desgastar ainda mais as relações do Palácio do Planalto com as Forças Armadas, que já vivem em clima de desconfiança mútua e acumulam uma série de atritos nesses primeiros meses de governo, com as trocas no comando do Exército e do Gabinete de Segurança Institucional (GSI).
PT QUER CONVOCAR – Por um lado, a presidente nacional do PT, Gleisi Hoffmann, e o vice-líder do governo no Congresso, deputado Lindbergh Farias (PT-RJ), defendem da convocação dos generais alinhados a Jair Bolsonaro, como o ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional Augusto Heleno e o ex-ministro da Defesa Walter Braga Netto, companheiro de chapa do ex-presidente na última disputa eleitoral.
Para eles, tais depoimentos devem ajudar a reforçar a acusação de que a gestão Bolsonaro trabalhou contra as instituições democráticas e as urnas eletrônicas, insuflando extremistas e criando as condições para a invasão do Planalto, do Congresso e do Supremo após a vitória de Lula.
Na opinião da dupla, os depoimentos dos bolsonaristas teriam impacto tão positivo para o governo Lula que valeria a pena até mesmo enfrentar a convocação do general Gonçalves Dias, ex-chefe do Gabinete de Segurança Institucional de Lula.
PERAMBULANDO – Conhecido como Gê Dias, ele foi flagrado em imagens do circuito interno perambulando pelo Palácio do Planalto no momento em que extremistas depredavam a sede do governo federal.
Mas nem todos concordam com a avaliação de Gleisi e Lindbergh, nem na bancada governista e nem no primeiro escalão de Lula. “Quanto menos barulho a CPI fizer, melhor. Prefiro confiar nas investigações do STF”, disse à equipe da coluna um influente parlamentar governista com bom trânsito nas Forças Armadas.
Para esse aliado, o ideal seria “terceirizar” o trabalho e deixar o ministro Alexandre de Moraes, do STF, capitanear as apurações sobre os atos golpistas, tirando o foco do Congresso. E mais: se a CPI murchar e simplesmente não fizer nada até lá, melhor.
OUTRO RISCO – Um ministro do governo Lula aponta outro risco, caso os generais sejam realmente convocados a depor: de que versões conflitantes sobre os informes de inteligência e o esquema de segurança coloquem em rota de colisão integrantes das próprias Forças Armadas, tensionando a temperatura política na caserna. “Temos que ter cuidados para não jogar uns contra os outros.”
Na oposição, a convocação de generais que serviram ao governo passado tampouco é um assunto confortável. Mas como a tropa de choque bolsonarista já sentiu a hesitação dos lulistas, tem feito pressão para transformar em prioridade a convocação de Gê Dias.
Em entrevista à Globonews em 18 de janeiro, dez dias após os atentados, Lula disse que “uma comissão de inquérito pode não ajudar” e “pode criar uma confusão tremenda”.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Nesse caso, é preciso lembrar Oduvaldo Vianna Filho e Ferreira Gullar no início do regime militar: “Se correr o bicho pega, se ficar o bicho come”. A situação é a mesma e os generais terão de depor, nem que seja debaixo de vara, como se dizia antigamente, mas que agora se chama de condução coercitiva. (C.N.)