Por: carlos Chagas
BRASÍLIA - Um novo tempo se abrirá na história do Congresso caso prossiga e progrida a candidatura de Pedro Simon à presidência do Senado. Porque o ex-governador do Rio Grande do Sul é carne de pescoço e não esconde que, tornado sucessor de Garibaldi Alves, mudará por completo a vida dos senadores e do Legislativo.
Disposto a não criticar qualquer de seus antecessores, Simon se disporia, de início, em só aceitar a tramitação de medidas provisórias de real sentido de urgência e relevância. Sem declarar guerra ao Executivo, buscaria convencer o presidente Lula e seus auxiliares da inocuidade de insistir em propostas supérfluas e capazes de ser objeto de projetos de lei.
Em contrapartida, porém, limparia não só a pauta, mas as gavetas do Senado onde dormem projetos de toda ordem. Nada ficaria para o dia seguinte, cristalizando-se aí outra das grandes mudanças por ele definidas: sessões deliberativas durante a semana inteira, não só de segunda a sexta-feira, mas com freqüência aos sábados. E sob a obrigatoriedade de comparecimento, com o conseqüente corte nos subsídios de ausentes incapazes de justificar a ausência.
Mas tem mais. Pedro Simon cortaria pela raiz os gastos com viagens de senadores ao exterior. Missões para fora do território nacional, só excepcionalmente, quando as circunstâncias exigissem.
Não se trata de qualquer arrocho ou puxão de orelhas em seus colegas, mas do fiel cumprimento da lei e do regimento da casa. Talvez por isso o senador gaúcho cultive o ceticismo, porque vive repetindo que até sua mulher, se fosse senadora, não votaria nele.
Só que a situação, agora, é diferente. Com a suposta desistência de José Sarney em aceitar sua candidatura, nem por isso a bancada do PMDB abre mão de indicar o novo presidente, majoritária que é. As oposições fechariam com Simon de olhos fechados, valendo registrar que até senadores do PT dispõem-se a apoiá-lo, com Eduardo Suplicy à frente. Interessa a todos que o Senado se redima de uma série de pecados, em especial porque as eleições estão chegando. Para a renovação dos mandatos de dois terços do Senado, será preciso demonstrar ao eleitorado que todos cumprem fielmente seu dever. Convém aguardar.
Horrores
Diante do horror perpetrado pela natureza em Santa Catarina, o ser humano não fica atrás. Busca empatar o jogo, evidência estampada em fotos e imagens vindas de diversas cidades encharcadas. Fala-se dos saques verificados no comércio e nas residências abandonadas. Trata-se de minoria, é claro, que se aproveita da desgraça geral para demonstrar a profunda semelhança entre homens e animais. Em alguns municípios dos mais atingidos, estabeleceu-se o toque de recolher. Ninguém pode sair às ruas (ou seriam braços de rios?) depois das dez horas da noite. A polícia está instruída para deter quantos não apresentem justificativas.
Infelizmente, não somos diferentes de outros povos. Na África, têm sido freqüentes os saques acontecidos a qualquer pretexto, mesmo distintos das catástrofes naturais, como revoluções e guerrilhas. Não se diga ser diferente nos países ricos e desenvolvidos, pois estão na lembrança de todos os episódios de Nova Orleans, para não falar dos traumas gerados pelo assassinato de Martin Luther King. Em Paris, não faz muito, carros eram incendiados nos subúrbios como pretexto para assaltos ao comércio local.
O que choca é a ocorrência de saques num dos estados mais evoluídos cultural, econômica e politicamente no Brasil. Santa Catarina fica devendo, apesar de todas as dificuldades, a apuração e punição de quantos vêm desonrando sua tradição.
Aí tem...
Mais uma vez, a terceira em duas semanas, o governador José Serra foi recebido pelo presidente Lula no Palácio do Planalto. Foi sexta-feira, à tarde, durante mais de uma hora. É claro que o governador do maior estado nacional sempre terá o que tratar com o presidente da República, mas é sempre bom lembrar episódios passados em que detentores do poder receberam pretendentes ao próprio, dentro da maior cortesia.
Fernando Henrique acolheu Lula em seu gabinete e até pediu que o então candidato sentasse na cadeira presidencial, vaticinando que um dia ela seria dele. Itamar Franco também recebeu o então presidente do PT, servindo-lhe uma cachacinha do interior de Minas. Os generais-presidentes freqüentavam-se quando o visitante era mera hipótese, e Juscelino Kubitschek, antes da eleição de outubro de 1960, convidou Jânio Quadros para conhecer a sede do governo, aceitando fumar um cigarro que o depois sucessor ofereceu.
A exceção de tanta cordialidade aconteceu quando Juscelino, candidato, mas ainda governador de Minas, procurou Café Filho no Palácio do Catete, para tratar de questões ligadas ao preço mínimo do café. De modo inusitado, o presidente foi gentilíssimo, pedindo a JK que sentasse em sua cadeira.
Constrangido, ele sentou, sendo então surpreendido por grosseira afirmação: "Agora levante-se, porque esta foi a primeira e a última vez que você ocupou essa cadeira!" Juscelino contava, com muita graça, que irritadíssimo deixou o gabinete de Café Filho, sendo em seguida cercado pelos jornalistas. Eles ignoravam o episódio e indagaram se havia sido resolvido o problema dos preços do café. Resposta: "De que café você está falando, meu filho? O vegetal ou o animal?"
Não dá para imaginar grosserias por parte de Lula contra Serra, mas certamente o presidente não convidou o governador para sentar-se em sua cadeira. Agora, que tem alguma coisa estranha nesse recente relacionamento entre os dois, isso tem...
Vigílias
A moda pegou, depois da vigília da semana passada no Senado, comandada por Paulo Paim para conscientizar os colegas em favor da votação de aumento real para os aposentados. Acontecerá agora em Porto Alegre, não mais restrita a parlamentares e políticos, mas à população gaúcha. Será num estádio de esportes, sendo que, além de pressionarem o presidente da República a sancionar a lei, os presentes levarão alimentos não perecíveis e até dinheiro em espécie para ajudar os atingidos pelas enchentes em Santa Catarina. Tomara que se realizem os dois objetivos.
Fonte: Tribuna da Imprensa
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