O PL, partido do presidente Jair Bolsonaro, arrecadou uma quantia milionária graças a doações vultosas feitas por parlamentares - entre os quais um investigado por suspeitas de desvios de emendas -, por advogados e por empresários ligados à cúpula da legenda. Nos últimos anos, as contribuições renderam ao menos R$ 3,7 milhões à sigla controlada pelo ex-deputado Valdemar Costa Neto.
A principal doadora é a deputada Magda Mofatto (dir.) (GO), esposa do presidente do diretório goiano, Flávio Canedo. Condenado por tortura em segunda instância, ele foi considerado ficha-suja e não pôde concorrer à Prefeitura de Caldas Novas, em 2020. Entre 2017 e 2020, a deputada repassou R$ 1,1 milhão ao diretório nacional.
Ela fez 31 transferências no período, sendo 26 de R$ 1,6 mil e outras cinco que variaram de R$ 180 mil a R$ 300 mil. Este valor é quase dez vezes superior ao salário da deputada, de R$ 33,7 mil. A doação mais recente, conforme os registros disponíveis, foi em maio de 2020, de R$ 280 mil. Aliado de Bolsonaro, o casal posou para fotos com o presidente na cidade goiana três meses depois, quando ele foi a Caldas Novas receber uma homenagem.
Assim como outros partidos, o PL prevê contribuições obrigatórias para aqueles que exercem mandatos eletivos e também para filiados, além de contribuições voluntárias. Tais valores se somam ao repasse do Fundo Partidário na manutenção da legenda. Em 2020 (último dado disponível), por exemplo, o PL recebeu R$ 1,2 milhão em doações para uma receita total de R$ 181 milhões.
A doação em si não significa qualquer irregularidade. O financiamento empresarial das campanhas foi banido, mas pessoas físicas podem contribuir para partidos e campanhas eleitorais, respeitado um teto calculado sobre o total de rendimentos. O que chama atenção no caso da deputada Magda Mofatto é que está acima da média das demais contribuições. O líder do partido na Câmara, Wellington Roberto, por exemplo, só fez transferências de R$ 1,6 mil. Questionada sobre o motivo das doações, a deputada disse que não comentaria.
À Justiça Eleitoral, Mofatto declarou em 2018 um patrimônio de R$ 28 milhões, o que a torna, ao menos em tese, a deputada mais rica da Câmara. A fortuna cresceu ao longo dos três mandatos em Brasília. Em 2010, quando eleita pela primeira vez, declarou R$ 12,7 milhões em bens. Quatro anos depois já tinha R$ 20,9 milhões.
Na Câmara, a deputada tem atuação discreta. Pró-armas, teve destaque em junho passado ao protagonizar vídeo no qual aparecia a bordo de um helicóptero com um fuzil em mãos e criticava a demora das forças de segurança de Goiás para capturar o criminoso foragido Lázaro Barbosa, que matou quatro pessoas da mesma família no Distrito Federal.
Outra fonte de receitas importante do PL é o deputado Josimar Maranhãozinho (MA), além de pessoas ligadas a ele. O parlamentar também multiplicou a fortuna enquanto deputado. Declarava R$ 463 mil, em 2008. Em 2018, disse ter R$ 14,5 milhões em bens, sendo R$ 1,4 milhão em dinheiro vivo. Nesses dez anos, Josimar venceu todas as eleições e a política era a sua principal atividade.
Ao PL, ele doou R$ 327,2 mil. Em abril de 2020, foram R$ 150 mil em uma única transferência. Na época, ele já estava na mira da Polícia Federal por suspeitas de desvios de emendas parlamentares. Em outubro daquele ano, os agentes flagraram Maranhãozinho manipulando uma grande quantidade de dinheiro vivo dentro de seu escritório político em São Luís (MA).
No fim do ano passado, a Polícia Federal revirou 27 endereços ligados ao deputado para o inquérito sigiloso que tramita no Supremo Tribunal Federal (STF). A suspeita é que o dinheiro encontrado com o parlamentar tenha sido obtido por meio do direcionamento de licitações em favor de empresas de fachada controladas por ele.
As doações do grupo de Josimar Maranhãozinho ao caixa do partido somam R$ 597 mil. Além do próprio deputado, dois advogados ligados a ele fizeram repasses. Um deles, José Luna dos Santos, atua nos processos de prestação de contas do parlamentar. Foram quatro repasses, num intervalo de um pouco mais de um mês, que somaram R$ 120 mil.
Ao Estadão, ele disse que doou espontaneamente porque acredita nos projetos políticos de lideranças do PL e de outros partidos do Maranhão. "Tenho intimidade com bons políticos do Maranhão, que acho que vão colocar o Maranhão para frente. Por isso faço a doação. Doo para o partido e o partido distribui conforme achar que deve distribuir. Eu olho o programa partidário, gostei e resolvi doar", afirmou.
Outro doador ligado a Maranhãozinho é José Sekeff. Lotado no gabinete do deputado Edilázio Júnior (PSD-MA), recebe R$ 11,4 mil mensais. Ele fez oito repasses entre os dias 6 e 20 de maio de 2020 que somaram R$ 150 mil. O valor corresponde a quase um ano de salários. Ao Estadão, disse que advoga para vários partidos no Maranhão, de modo que o assessoramento parlamentar não é a única fonte de renda: "Se fosse a única atividade, não daria para sobreviver, não. É pouco".
O terceiro maior doador da sigla é o ex-deputado Bernardo Santana, de Minas Gerais. Advogado e ligado a empresas mineradoras, ele é filho do atual presidente do diretório mineiro do PL, o ex-deputado José Santana. Em 2019 e 2020, repassou R$ 200 mil ao partido de Valdemar Costa Neto. Procurada, a equipe do Santana informou que ele estava em viagem e não poderia comentar. No Estado, ele declara estar afastado da vida partidária desde 2016 e que só se envolveu com ela quando exerceu mandato, de 2011 a 2014.
Estadão / Dinheiro Rural