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terça-feira, fevereiro 24, 2009

Pelourinho, lamúrias e mudanças

Li o artigo de Ângela Chaves, bacharela de Direito, respeitada professora de inglês, intitulado “Pelourinho, mentiras de Momo”. Achei o texto melancólico. Tipo assim coisa de quem envelheceu com amargura. Devo ter freqüentado o Pelourinho em momentos diferentes da queixosa. A “crônica” dela não bate com o que vi e vivi, todos os dias. Claro que no Carnaval é muito fácil fotografar ruas em momentos de intervalo. Mesmo nos circuitos do Campo Grande e da Barra/Ondina as câmaras flagram tais momentos. Então, não me venham mostrar ruas vazias para “provar” o desânimo do Carnaval.

Fui ao Pelô durante as tardes e vi uma programação adequada para crianças. Quem chega às 19h vê as mães levando seus filhos para casa, através dos becos e vielas do Pelô. Em direção contrária, chegando, vem a turma da noite. Neste momento normalmente há uma troca de atores. Quase que uma paradinha. Pois ainda sim vi e vivenciei coisas incríveis. A Cia de Dança Patuá, com seus maravilhosos dançarinos e dançarinas arrastavam, não digo multidões, porque o Pelô não tem essa característica, mas muita gente vinha atrás. Também segui o “Bola Cheia” com animação total. Vi até performance de “pastorinhas”.

No Carnaval, como no futebol, a unanimidade é impossível. Na segunda-feira, durante a Mudança do Garcia, ouvi de um velho negro morador, sentado em sua cadeira postada na calçada: “É...a Mudança do Garcia está mudando...”. E como mudou a “Mudança do Garcia”. Aquela singela manifestação popular de 30 anos atrás não existe mais. O Garcia transformou-se num verdadeiro circuito alternativo. Estive no bar de D. Zuzu, no final-de-linha. Aquela turma que sai no “Povo Pediu” e no “Paroano sai milho” estava lá e ninguém se queixava de nada.

Não vou perder meu tempo com o suposto “sabido descaso” com que a “atual administração”, segundo Ângela Chaves, trata o Pelourinho. Aquela fórmula do “Cabeça Branca” de queimar dinheiro público com negócios de amigos e familiares, em nome do turismo, era insustentável (para os cofres da viúva). Com certeza um outro caminho teria que ser descoberto.

Continuo achando que Ângela Chaves visitou o Pelô em hora errada. Ela transmite um tom lamuriento. Como disse o velho lá no Garcia “a Mudança está mudando”. Tudo muda. O Pelô também. E não se trata de avaliar se para melhor ou pior. Os tempos mudam. Se antes Caetano e Morais nos embalavam, hoje, outros compositores nos animam. E a Praça Castro Alves não é mais a mesma. E daí? O Encontro dos Trios não acontece mais. Provavelmente, os empresários dos trios escolheram outro local.

Defintivamente, o Pelô que vi e vivi não é o Pelô de Ângela Chaves. Que decadência que nada. É verdade que as bandinhas eram musicalmente pobres. Mas, e daí? Musicalmente pobre é Bel Marques do Chiclete, com aquela chata repetição de jingle do...Chiclete, mas, arrastando multidões de jovens de classe média. Não é mesmo um concurso de música, é apenas Carnaval, muito barulho e diversão.

De fato, a Internet não fornece toda a programação e com a clareza necessária. Mas, não vi ninguém dizendo que não brincou o Carnaval por defeito na comunicação.

Acho que não se pode censurar ninguém. Trios elétricos existem porque uma boa parte da população gosta daquilo. O ritmo afro existe porque boa parte da população adora aquilo. No carnaval vi até grupos de evangélicos dançando e pregando. Não me incomodaram. Também ouvi grupos de rock.

Dou graças a Deus que o tempo do Cabeça Branca tenha passado. Aquela roubalheira descarada. Não posso sentir saudade daquela gente no poder. Nem da farsa que era manter as fachadas do Pelourinho, com nosso dinheiro, para sustentar negócios de amigos da famiglia.

Pela primeira vez, senti no Carnaval da Bahia um peso maior para a cultura afro. Atribuo o avanço ao secretário da Cultura Márcio Meirelles. Não há demagogia alguma. O que vejo é gente da antiga elite incomodada com a mudança.

O Carnaval da Bahia melhorou muito. Saí no Habeas Copus, na Barra e no Pelô, fui ouvir “O Povo Pediu” no bar de D. Zuzu e, como não encontrei informação do “Paroano sai milho”, vesti a camisa de 2008. No Pelô me diverti bastante. Na Barra, constatei mais uma vez a pobreza da axé music e testemunhei o ardor com que a juventude segue o trio. Eles querem é pular e beijar na boca. Bem que a Secretaria da Saúde cumpriu sua obrigação alertando a população. Mas, quem vai censurar quem?
Fonte: Bahia de Fato

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