Por: Lena CastellónColaborou Cilene Pereira (ISTOÉ)
Ele é bem mais inteligente do que sepensava e precisa interagir cedo comos pais para aprimorar habilidades
Por Lena CastellónColaborou Cilene Pereira
Qual pai não se encanta com a primeira palavra do filho? E que mulher nunca tentou ensinar seu bebê a pronunciar “mamãe”? Para Deb Roy, um canadense de 37 anos que vive em Boston, nos Estados Unidos, essa experiência terá elementos que vão além do prazer de notar que o pequeno está crescendo. Especialista em robótica e professor do prestigiado Instituto de Tecnologia de Massachusetts, ele faz parte de um ambicioso projeto que tentará decifrar os mecanismos que levam uma criança a falar. No centro desse trabalho, anunciado recentemente, está seu filho com a cientista Rupal Patel. O menino nasceu há nove meses e vem sendo filmado desde o dia em que deixou a maternidade e se instalou em casa. “Este estudo mostra como a criança integra contextos visuais com o aprendizado da fala, do sentido das palavras e até do princípio da gramática”, explica a ISTOÉ o pai da criança, que completa um ano em julho, quando Roy apresentará os primeiros resultados da pesquisa. A experiência, batizada de Speechome Project (uma mistura de speech, discurso, com home, lar), é um dos mais recentes trabalhos numa área em que a ciência está dando passos importantes: o estudo do processo de aprendizagem das crianças e, por tabela, do cérebro infantil. “Os especialistas estão progredindo para um campo novo que pode ser chamado de Neurociência do Desenvolvimento Social”, sublinha o americano Andrew Meltzoff, um dos nomes mais respeitados da neuropediatria.
Isso quer dizer que não se trata mais de apenas estudar quanto o bebê enxerga, por exemplo, mas fazer correlações entre a complexidade neurológica e determinados comportamentos. A pergunta deixou de ser “como ele está vendo o mundo” e passou a ser “o que acontece na mente dele quando olha um objeto de que gosta”. Deseja-se entender ainda como aquelas criaturinhas sedutoras desenvolvem estratégias para obter o que querem. Desde o choro para receber atenção nos primeiros meses até as táticas de “chantagem emocional” praticadas pelas crianças maiores. De certo modo, muitas sabem como dobrar um adulto, que em tese seria mais esperto do que o filho.
Contato: Anna participa dasaulas com a pequena Milla
Uma razão para essa tendência da ciência é a modernização do instrumental. Antes, os médicos estabeleciam teorias sem fazer grandes experimentos devido a limitações técnicas e éticas. Mesmo assim surgiram boas novidades. Meltzoff, por exemplo, causou rebuliço em 1977 ao mostrar que crianças com três semanas de vida imitam caretas, um trabalho registrado em fotografias que entraram para a história da neurologia. Os especialistas se surpreenderam com o fato de a criança estabelecer essas conexões tão precocemente. De lá para cá, surgiram recursos poderosos para examinar as reações do nenê aos estímulos.
Outra razão é que os cientistas estão cada vez mais concentrados em investigar como o cérebro evolui desde a vida uterina e os primeiros dias do nascimento.Isso porque inúmeras pesquisas vêm demonstrando que nossos herdeiros são muito mais inteligentes do que os pais mais corujas poderiam supor. Também comprovam que eles têm emoções complexas em tenra idade. “Há muito a descobrir. Não percebíamos reações como o medo de altura. Ele surge quandoa criança começa a andar?”, pergunta o neurologista Mauro Muszkat, da Universidade Federal de São Paulo.
Se depender do empenho de algumas universidades, os aspectos emocionais dos pequeninos ganharão mais atenção. Um estudo da Texas Tech University acompanhou mães e nenês com idades entre seis e oito meses para demonstrar que as crianças podem ser ciumentas. A professora Sybil Hart fez centenas de experiências e os resultados se repetiram. Sybil convocava mãe e bebê para uma tarde em seu laboratório. A criança ficava num cadeirão enquanto a mulher recebia um livro infantil e trocava impressões com a pesquisadora. Não lançava um único olhar para o filho. Em geral, ele permanecia quieto, às vezes entediado. Depois de alguns minutos, Sybil entregava nos braços da mãe um boneco imitando um perfeito nenezinho. A mulher o embalava com cantigas, sem manifestar interesse por outra coisa. A criança, então, caprichava no sorriso. Sem resultado, agitava-se e dava chutes. Nada? Abria o berreiro, exigindo que lhe fosse dada a devida atenção. A mãe era de quem, afinal?
Som: Stella se relaciona comGabriel pela música
Não é o único sentimento complexo notado entre os bem pequenos. Cientistas italianos observaram a ocorrência de empatia. Eles fizeramcom que bebês ouvissem a gravaçãode seus iguais chorando. As crianças acompanharam as lágrimas alheias,em solidariedade. Porém, quando submetidos ao som de seus próprios choramingos, raramente molhavam a face. Há mais observações: criançascom seis meses tendem a exibircaretas, em vez de chorar, dianteda tristeza de seus amiguinhos. Asde um ano tentam confortá-los.
Outra constatação é que as emoções exercem papel fundamental para o amadurecimento cerebral. “Se o recém-nascido for bem acolhido, ele aprende que alguém cuida dele e fica seguro. Esse começo valioso estabelece alicerces para o futuro”, diz Saul Cypel, neuropediatra do Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo. É claro que a influência dos sentimentos não se limita ao período em que ele é absolutamente dependente. As pesquisas mostram que a interação entre pais e bebês é essencial. Ao observar o que os adultos fazem, eles estabelecem conexões neuronais e entendem por que determinadas atividades são importantes. Só que para isso ocorrer é preciso que ele perceba que aquilo é prazeroso e que os pais gostam de ouvir aquele som ao seu lado, por exemplo. De outro modo, ele se aborrecerá e deixará de prestar atenção na música. Por isso, os médicos recomendam que se ofereça à criança aquilo que é bom para os pais. Fã da banda Oasis, a publicitária Stella Bitelman, de São Paulo, viu que a filha Camilla, sete anos, adquiriu o gosto pelo estilo e pela língua, o inglês. Com o filho Gabriel, que acaba de completar um mês, acredita que acontecerá o mesmo. “Coloco a música e ele fica calminho”, diverte-se.
É decisivo, portanto, dar atenção ao filho. O quanto puder. A médica carioca Anna Gabriela Fuks reservou um horário para acompanhar as aulas de natação da pequena Milla. “Entro na água com ela. Percebo que esse contato ajuda no seu desenvolvimento”, diz. Atividades culturais e físicas estimulam o cérebro, mas não podem substituir a interação com os pais. Por valorizarem demais esses aspectos, algumas pessoas estão sobrecarregando as crianças com múltiplas tarefas. “Falar em janelas para determinados aprendizados é uma bobagem. É de aproximação com os pais que o bebê precisa. E seu melhor brinquedo é a família”, afirma José Salomão Schwartzman, especialista em neurologia infantil. O administrador paulista Henrique Aragoni, pai de Rafael, quatro anos, faz a lição de casa. “Levo e busco meu filho na escola e brinco com ele de igual para igual”, conta.
Futebol: Aragoni e Rafael jogam juntos. Para os pequenos, os melhores brinquedos são mesmo os pais
Para Meltzoff, se os pais querem que a criança tenha duas línguas, será útil se ela tiver contato com o segundo idioma entre os cinco e os dez anos. Já quanto à matemática e à ciência, os filhos não necessitam ser submetidos a aulas particulares antes de ir para a escola. Basta que sejam atendidos em sua curiosidade natural pelo mundo. Eles, de fato, sabem bastante a esse respeito. Estudos mostram que crianças com três dias de idade têm orientação espacial. Elas localizam estímulos visuais em seu entorno, apesar de enxergar mal. Caso isso pareça pouco, que tal saber que com três meses e meio o bebê tem noções de balística? Isso mesmo. Se um objeto colorido for estendido para ele repetidamente, logo o nenê compreenderá onde o brinquedo deverá estar na vez seguinte. Basta brecar o movimento para comprovar isso. Ele fechará as mãozinhas no local que calculou. Um feito para qualquer pai se gabar das proezas do filhote.
Agradecimento: Hospital Israelita Albert Einstein
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