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quarta-feira, maio 31, 2006

BRASIL - 1950

Por: Yahoo! - Copa do Mundo 2006

As batalhas do Maracanã
Campeão:
Uruguai
Vice:
Brasil
Ficha técnica
Sede: BrasilPaíses inscritos: 13Participantes: 13Gols: 88Média de gols: 4Média de público: 60.773
Em 16 de julho, cumpria-se o último capítulo da história da quarta Copa do Mundo. Uma história que começara 12 anos antes, em 1938, quando o jornalista Célio de Barros, representando a CBD no congresso que a FIFA realizara em Paris, lançara oficialmente a candidatura do Brasil à organização da Copa do Mundo de 1942. Com a Alemanha fora de cogitação, o Brasil ficava como único candidato à organização da próxima Copa do Mundo, marcada de início para 1949 e um ano depois transferida para 1950.
Imediatamente, no Rio, os preparativos tiveram início. Um colossal estádio, nos terrenos do antigo Derby Club, teria de ser construído em tempo recorde: faltavam menos de dois anos para a abertura da Copa do Mundo quando a pedra fundamental do Maracanã foi lançada. Outros estádios - em São Paulo, Belo Horizonte, Porto Alegre, Curitiba e Recife - eram ampliados ou remodelados em poucos meses.
A quarta Copa do Mundo, se por um lado contava com duas presenças ilustres - o Uruguai, que depois de 20 anos voltava a lutar pela taça de ouro, e a Inglaterra, que finalmente se filiava à FIFA -, por outro se caracterizaria pela ausência de um punhado de países não menos ilustres. Hungria, Tchecoslováquia e Polônia nem chegaram a se inscrever. A Alemanha, arrasada pela guerra, não tinha sequer uma federação nacional. Na América do Sul, as desistências de Argentina, Peru e Equador reduziam de cinco para quatro os classificados nas eliminatórias continentais: Uruguai, Chile, Paraguai e Bolívia. Como resultado, não se conseguiu chegar aos 16 finalistas previstos.
Desde o início, embora entre os convocados estivessem os mais legítimos representantes de uma das mais brilhantes gerações de craques brasileiros, as atenções do torcedor se concentravam em um santista de 43 anos, alto, robusto, de bigodes espessos e poucos sorrisos, em cujas mãos parecia estar o próprio destino do Brasil naquela Copa do Mundo: o técnico Flávio Costa. Na época treinador do Vasco, era então um dos homens de maior prestígio no futebol brasileiro.
Começam as críticas A quarta Copa do Mundo começou fria. Conforme determinava o regulamento, os 13 finalistas foram divididos, por sorteio, em quatro grupos. Uma divisão técnica e aritmeticamente imperfeita, como se verá. O Comitê Organizador cometera a imprudência de confiar apenas no sorteio, em vez de adotar o critério semi-dirigido que prevaleceria nas Copas subseqüentes.
Assim, no Grupo l, ficaram Brasil, Iugoslávia, México e Suíça; no Grupo 2, Inglaterra, Espanha, Chile e Estados Unidos; no 3, Itália, Suécia e Paraguai; e, no 4, apenas Uruguai e Bolívia. Desse modo, enquanto o Brasil, ou a Espanha por exemplo, tinha de disputar três jogos para chegar ao turno final, o Uruguai não precisava de mais do que um - e assim mesmo com a modestíssima Bolívia. Mas, curiosamente, na época ninguém protestou.
Em 24 de junho, o jogo de abertura. Com todos os seus problemas, o Brasil não teve de se esforçar muito para impor-se ao México por 4 x 0. A goleada de estréia não deu para camuflar, aos olhos do torcedor, os defeitos da Seleção Brasileira. Muitos retoques tinham de ser feitos até que ela se tornasse uma equipe realmente capaz de chegar ao título. Por isso, o torcedor paulista que lotou o Pacaembu, naquela quarta-feira, 28 de junho, para ver diante da Suíça o segundo teste da Seleção, tinha motivos de sobra para desconfiar.
Habilmente, visando conquistar aquele torcedor exigente, Flávio fez radicais modificações na equipe. De saída, escalava toda a linha média que era uma espécie de espinha dorsal do São Paulo: Bauer, Rui e Noronha. E, no ataque, se mantinha Baltazar e Friaça em seus postos, mexia nas demais posições, passando Maneca para a meia direita, Ademir para a esquerda no lugar de Jair e - como que para provar aos paulistas que não estava errado na história do curinga - Alfredo II na ponta direita.
Foi um desastre. Onze jogadores que jamais - nem mesmo nos treinos experimentais de Araxá - tinham atuado juntos fatalmente não poderiam entender-se dentro do campo. E o Brasil, depois de virar o primeiro tempo vencendo 2 x 1, acabou esbarrando no ferrolho suíço durante todo o segundo tempo. O torcedor já se impacientava, ao ver o ataque brasileiro afunilar-se entre os beques adversários, e chegava mesmo a esboçar as primeiras vaias, quando, a dois minutos do fim, os suíços contra-atacaram e empataram o marcador.
A reação do torcedor foi de indignação. No Pacaembu, um grupo mais exaltado queimou uma bandeira da CBD. No Rio, em Belo Horizonte, em Porto Alegre, excomungava-se Flávio Costa, o homem que tivera quase quatro meses para armar uma grande seleção e que agora não fazia mais do que tatear, como um cego, as mil peças de um quebra-cabeças.
O intocável Bauer O jogo com a Iugoslávia, no sábado, 1º de julho, era decisivo. Os iugoslavos haviam derrotado sem dificuldade os suíços (3 x 0) e os mexicanos (4 x 1), de modo que, para eliminar os brasileiros e se classificar para o turno final, não precisavam nada mais que de um empate. O jogo seria no Maracanã. Flávio sabia que teria toda a torcida ao seu lado. Mas sabia, também, que aquela poderia ser sua última chance.
Conscientemente ou por acaso, o fato é que Flávio Costa acertou em cheio na escalação da equipe para o jogo que decidiu o Grupo 1. Com uma atuação quase perfeita - que fazia esquecer a má figura de três dias antes -, o Brasil venceu por 2 x 0, gols de Ademir e Zizinho, um em cada tempo. Depois da indefinição inicial, o Brasil não tinha encontrado apenas um time, mas também uma filosofia de jogo.
Uruguai, Suécia e Espanha foram os vencedores dos outros grupos. Como se esperava, os uruguaios passaram facilmente pelos bolivianos, massacrando-os por 8 x 0, em Belo Horizonte. Com essa única vitória - e quase sem suar a camisa - estavam no turno final. Os suecos, tendo pela frente a Itália e um Paraguai brioso, mas limitado, também se classificaram. Tinham uma equipe coesa, fisicamente bem preparada, com um jovem meia-esquerda - Nacka Skoglund, de 18 anos - que começava a pintar entre os craques do campeonato. Por último, os espanhóis, com uma das melhores seleções de toda a história do seu futebol, ficaram com a vaga que os experts europeus previam ser dos ingleses.
A vaga foi decidida no Maracanã - Espanha 1 x 0 Inglaterra -, mas o jogo que moralmente alijou "os reis do futebol" na Copa fora disputado três dias antes, em Belo Horizonte, com os Estados Unidos. Era justo esperar, naquele 29 de junho, no pequeno Estádio Independência, uma tempestade de gols ingleses nas redes do pobre goleiro americano Frank Borghi. Aos 37 minutos do primeiro tempo, Joe Gaetjens, cabeceando desajeitadamente uma bola centrada por Walter Bahr, marcou o que seria o gol único da partida: Estados Unidos 1 x 0 Inglaterra.
A Copa do Mundo, que começara fria, era uma sucessão de grandes emoções no seu turno final. No mesmo dia em que Espanha e Uruguai empatavam por 2 x 2, no Pacaembu, o Brasil partia firme para o título com uma goleada de 7 x 1 sobre a Suécia, no Maracanã. A seleção que vencera a Iugoslávia fora prudentemente mantida por Flávio Costa. E brindara sua torcida com um alegre show de gols, quatro deles de Ademir.
Mas o teste decisivo seria, mesmo, o segundo jogo, em 13 de julho, contra a Espanha. Pelo menos era o que se supunha. É bem possível que, naquela tarde, mais de 200 mil pessoas tenham ido ao Maracanã. Foi um jogo inesquecível. E os brasileiros acabaram conquistando uma histórica vitória por 6 x 1. Em termos de espetáculo, não faltara nada: gols sensacionais, dribles, passes, jogadas perfeitas. De Barbosa a Bigode, incluindo Augusto e Juvenal, uma defesa segura. Bauer e Danilo, uma extraordinária dupla de meio-campo. Zizinho, Ademir e Jair, três fantásticos atacantes.
Da noite de quarta à tarde de domingo, o coração do Brasil bateu em ritmo de festa. A última batalha da guerra seria travada em 16 de julho, com o Uruguai. E todo mundo reconhecia na Seleção Brasileira mais do que uma simples favorita. Para os 51 milhões de brasileiros - a população do país, segundo o censo de 1º de julho daquele ano -, a final seria mera formalidade.
Os jogadores, que até então tinham se concentrado no Joá, aguardavam a final nos alojamentos de São Januário, gentilmente cedidos pelo Vasco da Gama. Era ano de eleições. Já se dizia por toda parte que Flávio Costa teria sua candidatura a vereador lançada nos próximos dias por um partido importante. Mas, enquanto isso não acontecia, outros candidatos agiam. Enquanto isso, em seu quarto de hotel, Obdulio Varela dormia.
Uma tragédia não anunciadaNo dia seguinte, a grande final. Por volta de meio-dia, o Maracanã já estava literalmente lotado (nunca se soube ao certo quantas pessoas estiveram lá, mas não há dúvidas de que o total superou em muito o número oficial de 173.850). Na tribuna de honra, Jules Rimet olhava, um tanto espantado, para o homem alto, de careca reluzente e gestos largos, que empunhava o microfone para um eloqüente discurso antes do jogo. Era o prefeito Ângelo Mendes de Morais: "O governo municipal cumpriu o seu dever construindo o estádio que aí está. Agora, jogadores do Brasil, cumpri o vosso!"
O Brasil inteiro, como Obdulio Varela imaginara, estava ali, naquele estádio. Só que a festa não haveria de ser brasileira. Foi uma final disputadíssima, com um primeiro tempo nervoso, em que os donos da casa, mais ofensivos, tiveram duas excelentes oportunidades de gol. Contudo, desde o início se notara que, desta vez, Zizinho, Ademir e Jair teriam de jogar o dobro para vencer a sólida defesa uruguaia. Lá na frente, lançado sempre na base da velocidade, Ghiggia obrigava Bigode a fazer uma verdadeira ginástica para marcá-lo.
Depois do primeiro tempo sem gols, o Brasil, logo aos 2 minutos do segundo, acordou para o que se acreditava ser uma grande vitória. Friaça, ao receber um passe de Zizinho, bateu Rodríguez Andrade na corrida e chutou cruzado para vencer Máspoli. Todo o Brasil comemorou o gol, sofrido, suado, demorado, mas por fim conquistado.
Os uruguaios, porém, não se entregaram. Com a caracterísitica raça, empataram o jogo, aos 26 minutos: Obdulio Varela entregou a Ghiggia, este passou rápido por Bigode, foi até a linha de fundo e de lá cruzou para Schiaffino emendar de primeira, sem chance para Barbosa.
Faltavam apenas 10 minutos para acabar a partida quando Jules Rimet, recomendado a descer lentamente os lances de escada até o vestiário, deixou a tribuna de honra. Ao seu lado, além de delegados da FIFA e representantes do alto comando da CBD, iam meia dúzia de guardas armados com a missão de proteger a taça de ouro que Rimet levava nas mãos. Lentamente, a comitiva descia em direção ao campo.
Aos 36 minutos - os uruguaios se superando, os brasileiros sem saber se lutavam para manter o marcador ou se se lançavam à frente em busca do segundo gol - deu-se o lance capital do jogo. Mai uma vez acionado pela direita, Ghiggia ameaçou duas vezes passar por Bigode. O zagueiro brasileiro recuava, Ghiggia avançava. Nessa indecisão de Bigode, o jogador uruguaio correu finalmente até a linha de fundo. E, quando se esperava um novo passe para o centro da área, como no lance do primeiro gol, Ghiggia chutou mal, espirrado, torto. E a bola entrou sob o corpo de Barbosa.
O gol de Ghiggia foi recebido em silêncio por todo o estádio. No entanto, sua força fora tão grande, seu impacto de tal forma violento, que o gol, um simples gol, parecia dividir a vida do brasileiro em duas fases distintas: antes e depois dele. Em Montevidéu, dois uruguaios morreram de emoção ao ouvir pelo rádio aquele desfecho inesperado. Aqui, dois brasileiros também não resistiram: um deles foi traído pelo coração, no instante do gol de Ghiggia; outro, procurou a morte por conta própria, atirando-se, tão logo o jogo acabou, do alto da arquibancada para o pátio interno que circunda o estádio.
Eis o MaracanazoQuando Jules Rimet chegou ao campo, para entregar a taça de ouro ao grande capitão Augusto da Costa, não entendeu nada. O jogo já tinha acabado, mas não havia guardas enfileirados, equipes perfiladas, nada, enfim, do que estava previsto pelo cerimonial preparado por Mário Pollo. Com a taça de ouro nas mãos, Rimet via, atônito, um bando de jogadores de camisa azul-celeste saltando de alegria no campo: como vinte anos antes, o Uruguai era o campeão do mundo.
Enquanto os jogadores brasileiros deixavam, desolados, o campo em que haviam perdido a última batalha, Rimet, ainda sem saber ao certo o que tinha acontecido, sentiu a taça escapar-lhe bruscamente das mãos. Pensou em gritar, mas logo viu que os jogadores uruguaios a tinham levado para a tradicional volta olímpica. Depois, o próprio Obdulio Varela veio trazê-la a Rimet, para que o presidente da FIFA, então, a entregasse oficialmente a ele, el gran capitán. Era um uruguaio alto, forte, de cabelos crespos, sisudo e caladão, que tinha a camisa encharcada de suor, como se tivesse, mesmo, enfrentado e vencido um país inteiro.
Artilheiro

Ademir (Brasil), 9 gols
Nome completo: Ademir de MenezesNascimento: 8 de novembro de 1922, em RecifeClubes: Sport, Vasco e Fluminense
Por causa de seu maxilar avantajado, foi conhecido como "Queixada". Foi um dos principais jogadores do Brasil na década de 1940, liderando o "Expresso da Vitória", grande equipe do Vasco na época. Em 1946, o técnico Gentil Cardoso chegou ao Fluminense e disse: "Dêem-me o Ademir que eu lhes darei o título". O atacante foi contratado e o Tricolor ganhou o estadual daquele ano.

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