Por: DENISE MOTTA (O Tempo - MG)
Os caras-pintadas, pelo menos os de Minas Gerais, já não são mais os mesmos. Por baixo das tintas verde e amarela nos rostos, sinais do tempo. Exemplo disso são as aposentadas Marina Flores, 70, e Maria Giselda Silva, 65.
Ontem elas se destacavam no meio do tímido grupo de mineiros que participou, na praça Sete, do Dia da Dignidade Nacional, movimento que mobilizou milhares de pessoas em mais de 20 cidades do Brasil, em passeatas simultâneas.
O grupo de manifestantes em Belo Horizonte, cerca de 60 pessoas, subiu no pirulito da praça Sete, e, vestidos de preto, com as faces pintadas, cantou o Hino Nacional diversas vezes, chamando a atenção de quem passava pelo local. Marina conta que sempre foi engajada politicamente e que continuará lutando, sempre, por um país melhor.
"Eu, que passei pela ditadura militar, hoje percebo que a democracia não existe mais. O país está uma baderna, a roubalheira, generalizada", lamenta, emendando que o jovem atualmente se sente desmotivado para lutar por seus ideais porque, entre outras coisas, não tem incentivo dos pais.
Mas não é só a falta de engajamento político por parte dos jovens que leva Marina à indignação. Mineira, ela reclama da falta de liderança política do Estado no cenário nacional. "Antigamente tínhamos políticos honestos e preocupados com o bem-estar da população. Hoje está tudo corrompido", opina.
Maria Giselda, assim como Marina, representa a nova classe de cidadãos indignados que vão às ruas, com os rostos pintados de verde e amarelo, para dizer basta à corrupção.
Também sempre engajada politicamente ao longo de seus 65 anos, ela faz uma dura análise da atual situação política do Brasil. "Vivemos numa escravidão. Somos escravos da pobreza, da desigualdade. É preciso mudar as leis para termos um país mais justo", diz ela.
Baixa adesão
O organizador do Dia da Dignidade Nacional em Belo Horizonte, Eduardo Augusto Souza, lamenta que apenas 60 pessoas tenham participado da passeata na capital mineira, que teve início por volta das 15h de ontem e terminou duas horas depois na praça da Liberdade.
"Todo grande movimento começa assim, com poucas pessoas. Da próxima vez, reuniremos mais pessoas", afirmou. Estudante de informática, ele conta que decidiu tomar frente do Dia da Dignidade Nacional em Belo Horizonte depois de saber da existência do Reforma Brasil, movimento apartidário de São Paulo.
Anarquistas
Na contramão da realidade de jovens mineiros alienados com a política nacional, a estudante do 1º ano do ensino médio, Cecília Reis Aquino, 16, esteve ontem na praça Sete, mesmo tendo ficado sabendo da manifestação horas antes.
"Infelizmente o jovem, hoje, é mais preocupado com bebidas e festas. Hoje, dia de futebol, eles não dão importância a um movimento como esse. Em ano de Copa do Mundo, todo mundo veste a camisa da seleção, mas depois guarda o patriotismo na gaveta. Isso me deixa triste, mas também me motiva a mobilizar meus amigos em próximas passeatas", diz ela.
Outros presentes na praça Sete ontem era um grupo de anarquistas, cerca de 15, que se mobilizou por meio da Internet. "Quem tem poder, tem poder para fazer corrupção, somos a favor de um país sem corrupção, apesar do anarquismo pregar ideais libertários e próximos ao socialismo", disse Otávio Vieira, 22.
A divulgação do encontro foi feita por email e pelo Orkut (comunidade de relacionamentos na Internet). Quase 300 pessoas integram a comunidade no Orkut feita por integrantes do "Dia da Dignidade Nacional", em Belo Horizonte.
O movimento partiu de São Paulo - de uma organização não governamental chamada Reforma Brasil - e caiu nas graças dos mineiros em setembro do ano passado. Na comunidade de São Paulo participam cerca de 3.000 pessoas.
Já a do Rio tem perto de 2.000 membros. Desde que teve início, em maio do ano passado, a crise política despertou reações de internautas. Quase 60 mil pessoas integram a comunidade no Orkut "Eu quero meu mensalão".
Na apresentação para angariar membros, a comunidade diz: "Para você que achou ridículo o aumento salarial de 0,01% do servidor federal e está cansado de ver seus rendimentos acabarem antes do final do mês. Junte-se a nós, lute por um digno mensalão de R$ 30 mil."
A comunidade "Fora Lula 2006" é uma das mais cheias: tem quase 110 mil membros, enquanto a "Lula Presidente 2006" tem pouco mais de 30 mil integrantes. "Odeio PT" reúne aproximadamente 93 mil pessoas, ao passo que a comunidade oficial do PT tem pouco mais de 12 mil membros.
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