Por: Rui Nogueira (Primeira Leitura)
Instalou-se em parte da mídia e do debate parlamentar aquilo que alguns jornalistas e políticos já apelidaram de um “empurra-empurra entre PSDB e PT” sobre a crise da segurança pública em São Paulo – em todo país, a rigor. Trata-se de mais uma vitória do princípio petista do empate cínico sobre o signo do já manjado “somos todos iguais”. Reduzir o bom debate a um “empurra-empurra” torna tudo mais fácil, mais rasteiro.
Essa linha de raciocínio evita que se apresentem os números, os orçamentos, que se detalhem as responsabilidades circunstâncias e as responsabilidades estruturais. Abre-se, assim, uma planície para o cinismo sem limites liderado pelo presidente da República, secundado pelo ministro Tarso Genro (Relações Institucionais) e suplantado pela ignorância indômita do secretário Paulo de Tarso Vannuchi, dos Direitos Humanos.
Entusiasmado com a prosa destrambelhada do governador Cláudio Lembo (PFL), aquela que responsabiliza o descaso social da “elite branca” pela violência em São Paulo, Vannuchi chafurdou no lamaçal pensante corrente e deu a contribuição dele à baixaria sociológica reinante. Ele disse, na Folha de S.Paulo desta segunda-feira, que o elitismo brasileiro “tem suas raízes no nosso passado colonial escravista” e revelou preocupação com “toda a simbologia que há no episódio Daslu”. Assim, do quase nada, eis a Daslu no debate!
O ministro Vannuchi podia ter parado por ali, assim, como quem cria uma situação apenas provocadora, apenas propositalmente maldosa. Que nada! Ele “sociologou” em cima, querendo demonstrar a solidez do pensamento, e mandou ver sobre as lojas Daslu, em São Paulo, exibindo toda a desqualificação mental possível: “Primeiro, aquele monumento faraônico de exaltação de um luxo que funciona como uma espécie de insulto aos miseráveis que vivem do lado e a presença do ex-governador [Geraldo Alckmin] em festas da Daslu. Em seguida, o envolvimento da Daslu em práticas que estão ainda em investigação, mas com fortes indícios de graves sonegações fiscais. Isso é o retrato de uma certa elite brasileira”.
Esse homem, mestre em ciência política pela USP, amigo de Lula, ex-presidente do Instituto Cidadania (um dos braços financeiros do petismo travestido de ONG social), ex-assessor do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo (SP) e secretário-executivo do comitê central da campanha de Lula à Presidência, em 2002, é secretário com status de ministro da República Federativa do Brasil. Ele é mestre em ciência política, mas não se dispõe a fazer um raciocínio, tão ligeiro quanto o da Daslu, sobre o exemplo edificante do metalúrgico Luiz Inácio Lula da Silva, condestável da ética nacional, no Planalto, a exaltação à faraônica corrupção patrocinada pelo mensalão e o insulto que a “quadrilha” petista perpetrou no poder.
A intimidade de Alckmin com a Daslu é tão republicana que a empresária foi investigada e responde, dentro da lei, ao que o Estado de Direito quiser saber dela. É da vida democrática, que estabelece as regras do direito de acusação e de defesa. Delúbio Soares, o ex-tesoureiro do PT que acendia charutos na boca de Lula, nunca teve suas propriedades invadidas pela PF atrás das provas do relacionamento criminoso entre o PT, Marcos Valério e companhia. Tudo azeitado, como diria o mestre Vannuchi, em “fortes indícios” de corrupção institucional sem-par na história do país.
Genro: outra perdiçãoDescompostura institucional foi notada, no sábado passado, pelo editorial da mesma Folha de S.Paulo, intitulado Palanques de Sangue, sobre as declarações recentes do ministro Tarso Genro em torno da crise paulista. O jornal foi ao ponto, com palavras que não admitem mais rodeios: “Uma das mais lamentáveis exibições de oportunismo eleitoral sobre o sofrimento e o sangue alheios”. O editorial disse ser natural que o “tema da segurança pública [entre] na lista de principais discussões nas campanhas eleitorais neste ano”, e acrescentou onde Genro se situou nesse debate. Eis alguns trechos do editorial, que destaquei em nota na edição do fim de semana, mas transcrevo aqui novamente:“Irresponsável” – “Nada justifica a partidarização irresponsável da selvageria promovida pelo PCC, desrespeitando o luto de familiares dos agentes da lei covardemente assassinados, perdendo de vista que o crime organizado é inimigo comum de todos os políticos comprometidos com o Estado de Direito”.
“Oportunismo eleitoral” – “Das mais lamentáveis exibições de oportunismo eleitoral sobre o sofrimento e o sangue alheios foram algumas frases do ministro das Relações Institucionais, Tarso Genro. Na quarta, o petista atacou o governo paulista, dizendo que preferiu ‘negociar com criminosos’ a aceitar ajuda federal para debelar a crise”.
Esperteza – “Nem se mencione o fato de Genro esconjurar ‘negociações com criminosos’ pouco depois de 11 petistas ou ex-petistas terem sido denunciados criminalmente pelo mensalão. Frise-se que o ministro apenas revelou sua indignação num momento preciso: após o Datafolha ter mostrado que a maioria dos paulistanos gostaria do apoio de tropas federais”.
“Tese oca” – “Negociação com o PCC, naquele contexto explosivo, terá sido escandalosa se o poder público ofereceu vantagens fora da lei aos líderes dos motins. Do contrário, tratou-se de atitude de bom senso para poupar vidas (...). Essa dúvida, entre uma negociação ilegal e uma ação legítima, dado o contexto, somente o Ministério Público e a Justiça podem tirar, após exame cuidadoso dos fatos. Não caberia a Genro prejulgar, quanto mais quando era o momento de demonstrar união. Mas o autor da tese oca da ‘refundação do PT’ preferiu perfilar-se no time dos muitos políticos que não souberam ler a crise paulista.”
O que mais dizer?!
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