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quarta-feira, junho 29, 2022

Crimes de guerra na Ucrânia: criar um tribunal especial para Putin e Lukashenko




A Europa falhou na promessa de "nunca mais". As atrocidades cometidas pelos soldados russos nas cidades ucranianas são chocantes, semelhantes às que foram praticadas nos tempos de Hitler e Stálin. 

Por Rasa Juknevičienė e Jeroen Lenaers 

Desde o início da guerra na Ucrânia, já foram registados mais de 10.000 incidentes de alegados crimes de guerra e crimes contra a humanidade e já foram identificados mais de 600 suspeitos.

No dia 25 de fevereiro, a Amnistia Internacional afirmou que os ataques russos às cidades de Vuhledar, Kharkiv Uman, Mariupol e muitos outros locais eram suscetíveis de constituir crimes de guerra. Todos assistimos às horríveis imagens das vítimas dos massacres de Bucha, onde mais de 400 civis perderam as suas vidas. No primeiro julgamento por crimes de guerra desde o início desta guerra de agressão, um tribunal ucraniano condenou o comandante de um tanque russo a prisão perpétua pela morte de um civil. No entanto, o Governo russo nega ter civis como alvo. O Tribunal Penal Internacional (TPI) já enviou os seus investigadores e peritos forenses para Ucrânia. Para além disso, as autoridades ucranianas, polacas e lituanas criaram uma Equipa Conjunta de Investigação, que é apoiada pela Eurojust e pelo gabinete do Procurador do TPI em Haia, para recolher provas sobre os alegados crimes internacionais fundamentais cometidos na Ucrânia, com vista à sua perseguição penal.

A Europa falhou na sua promessa de “nunca mais”. As atrocidades cometidas pelos soldados russos nas cidades ucranianas são chocantes, semelhantes aquelas que foram presenciadas nos tempos de Hitler e Estaline. Há denuncias recorrentes de crimes graves, tais como homicídio, violação e tortura de crianças, homens e mulheres, deportação forçada e perseguição em massa.

A lista é longa: violação, tortura, tomada de reféns, bombardeamento de áreas residenciais e infraestruturas civis, deportação forçada de civis para o território da Federação Russa, incluindo a Sibéria – a área para a qual milhões de pessoas foram deportadas pelo regime soviético. O Kremlin parece estar deliberadamente a tentar exterminar pessoas por serem ucranianas. Não podemos aceitar isto na Europa hoje. O que podemos fazer para acabar com este sofrimento?

É evidente que é necessário acusar o soldado que cometeu crimes de guerra, mas é da maior importância responsabilizar o líder político que ordenou esta guerra ilegal e não provocada, assim como os comandantes militares e os seus aliados. O Presidente Putin e o seu servo Lukashenko devem ser responsabilizados e julgados.

É notório que os instrumentos legais disponíveis para punir aqueles que iniciaram esta guerra de agressão são insuficientes. O mundo democrático deve encontrar uma forma de trazer os responsáveis à justiça, tal como foi feito em Nuremberga após a Segunda Guerra Mundial.

Neste momento, o TPI está a investigar os crimes de guerra e crimes contra a humanidade cometidos durante a guerra da Rússia contra a Ucrânia. No entanto, ao contrário de outros crimes internacionais fundamentais, o TPI enfrenta dificuldades objetivas na jurisdição sobre o crime de agressão – e isto por uma variedade de razões. Por conseguinte, é necessário colmatar esta lacuna e estabelecer um Tribunal Especial que teria uma jurisdição específica sobre o crime de agressão contra a Ucrânia.

As negociações prosseguem sobre como criar efetivamente um tribunal deste género, de modo a que este tenha uma legitimidade abrangente. Isto poderia ser feito através de um organismo internacional como as Nações Unidas ou sob os auspícios de um grupo de Estados individuais, tal como foi o caso do tribunal de Nuremberga, que foi criado pela União Soviética, os Estados Unidos, o Reino Unido e a França, após a Segunda Guerra Mundial.

Com o conflito ainda a decorrer, existe o risco de as provas relacionadas com crimes de guerra ou crimes contra a humanidade não poderem ser armazenadas em segurança no território da Ucrânia e, por conseguinte, é pertinente estabelecer um armazenamento central num local seguro. O Parlamento Europeu aprovou a extensão do mandato da Eurojust, a Agência Europeia de Cooperação em matéria de Justiça Penal, e dotou-a de novos poderes. Estas novas capacidades permitirão à agência preservar, armazenar e analisar provas relacionadas com crimes de guerra, genocídio e crimes contra a humanidade. Ao abrigo das novas regras, a Eurojust poderia também processar os dados relacionados com estes tipos de crimes e partilhar esses dados com o TPI e outras organizações internacionais, assim como com as autoridades dos Estados-Membros da UE. No entanto, a extensão do mandato da Eurojust abrange apenas três dos quatro crimes reconhecidos no Estatuto de Roma, a pedra angular do TPI, pelo que também será necessário ajustar o mandato da Eurojust para incluir o crime de agressão.

Não pode haver qualquer tipo de impunidade para os crimes de guerra na Ucrânia. Os responsáveis por esses crimes devem julgados. A comunidade internacional tem de fazer tudo ao seu alcance para punir os responsáveis e restabelecer a justiça, para que o “nunca mais” não permaneça uma promessa por cumprir.

Observador (PT)

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