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quinta-feira, junho 30, 2022

Planos de Bolsonaro não se detêm diante das leis - Editorial




Bolsonaro vai aos poucos derrubando o arsenal de austeridade com o qual assumiu e outros mais

A prisão do ex-ministro da Educação Milton Ribeiro trouxe mais reveses inesperados para Jair Bolsonaro, em um mês repleto deles. Os dissabores causados pela traficância de interesses no MEC se somam ao dos mercadores de vacinas inexistentes no Ministério da Saúde, revelado pela CPI da Covid, e ambos roubam argumentos do discurso do presidente de que não há corrupção em seu governo. Os problemas não terminaram: o juiz Renato Borelli encaminhou o caso ao Supremo Tribunal Federal, porque o Ministério Público viu “indício de vazamento da operação policial e interferência ilícita do Presidente da República”.

Com a disparada dos preços de combustíveis e da inflação, as chances eleitorais de Bolsonaro estão diminuindo, assim como o tempo que lhe resta para melhorar sua performance nas pesquisas até as eleições, daqui a 95 dias. Com a Justiça no encalço de pastores que visitavam o Planalto e no do incompetente ministro da Educação, a estratégia de Bolsonaro e seus amigos do Centrão mudou ao sabor das necessidades. Sem planejamento e destrutivo, o governo, que ainda não conseguiu encontrar uma fórmula de suavizar as altas dos combustíveis, desistiu de compensar os Estados que zerassem o ICMS do diesel e do gás e também de fazê-lo para os Estados que perdessem receitas com a redução das tarifas do ICMS à média padrão de 17%-18% por serem considerados bens essenciais.

A PEC dos combustíveis, que passou na Câmara e está no Senado, reservou R$ 29,6 bilhões para esse fim. O governo resolveu utilizá-los em uma nova cartada eleitoral, passando por cima da regra do teto de gastos, da Lei de Responsabilidade Fiscal e da lei eleitoral, que proíbe programas como os que Bolsonaro e Lira querem implantar a pouco mais de três meses do primeiro turno.

A manobra consiste em aumentar até o fim do ano em R$ 200 o Auxílio Brasil, dobrar o valor do vale gás e conceder R$ 1 mil aos caminhoneiros, por fora do teto de gastos. Para driblar a restrição do teto, cogita-se inserir na PEC no Senado até mesmo a decretação do estado de emergência, que abriria a porteira das despesas públicas, que possivelmente não ficariam restritas aos benefícios mencionados, mas às carências imensuráveis de um candidato em sérios apuros eleitorais.

Os áudios do ex-ministro Milton Ribeiro revelam que Bolsonaro teria ligado para ele, quando viajava para os Estados Unidos para a Cúpula das Américas, e teria avisado que tivera um “pressentimento” de que poderia haver operação de busca e apreensão na casa do pastor. O presidente esteve acompanhado na viagem do ministro da Justiça, Anderson Torres, a quem a Polícia Federal, que realizou as buscas, é subordinada. O delegado da PF, Bruno Callandrini, que conduziu as operações, disse que houve “interferência” na condução do processo e que Ribeiro teve “tratamento privilegiado”. As suspeitas sobre o caso, que agora envolvem Bolsonaro, podem dar impulso à CPI do MEC que, se instalada, manteria em pleno período eleitoral um clima adverso ao presidente.

A cúpula do Centrão, que acompanha o presidente em sua empreitada eleitoral, estimulou Bolsonaro a adotar as únicas medidas que poderão reduzir danos à imagem de um governo sitiado pela carestia: a distribuição direta de auxílio financeiro aos eleitores. As contas feitas pelo relator da PEC dos combustíveis no Senado, Fernando Bezerra (MDB-PE), estimam necessidade de R$ 34,8 bilhões para as medidas, que ainda incluem gratuitade de idosos nos transportes urbanos e manutenção da competitividade do etanol.

Como não há dinheiro para isso e, mesmo se houvesse, as leis proíbem que se faça uso desses recursos em período eleitoral, o governo parece decidido a mandar tudo para os ares. Bezerra estuda um meio de reconhecer o estado de emergência em transportes para liberar os recursos. Ou seja, basta o governo inventar uma emergência para driblar a Constituição e as leis, inscrevendo na própria Carta Magna uma emenda que contraria seu espírito, desmoralizando-a ao modificá-la para inscrever medidas temporárias que não duram 6 meses.

Bolsonaro vai aos poucos derrubando o arsenal de austeridade com o qual assumiu e outros mais. Caio Paes de Andrade, indicado por Bolsonaro para presidir a Petrobras, claramente não preenchia os requisitos exigidos pela lei das estatais para ocupar tal posição. Para agradar ao presidente, a lei foi deixada de lado e essa avacalhação da institucionalidade não costuma terminar bem.

Valor Econômico

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