Por Vera Magalhães (foto)
O governo Jair Bolsonaro é marcado pelo amadorismo em todas as suas ações. A reação apavorada, tardia, atabalhoada e, por tudo isso, cara para os cofres públicos à CPI do MEC é típica de um agrupamento disfuncional que não enxerga um palmo adiante do nariz.
Basta lembrar que, pouco mais de uma semana atrás, o mesmo governo trapalhão garganteava a possibilidade de ele próprio encabeçar a abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar a Petrobras, empresa de que é sócio majoritário. CPIs, deveria ser desnecessário dizer, são instrumentos de minorias para se contrapor à força de impedir apurações exercida por… governos.
A bravata funcionou para que José Mauro Coelho antecipasse sua saída do comando da Petrobras, pouco mais de 40 dias depois de ter sido designado para o cargo pelo próprio Bolsonaro, que passou a chantageá-lo. E, claro, a CPI governista nunca saiu do papel, que aceita tudo.
Agora, com a CPI do escândalo dos pastores do MEC, a coisa muda de figura. Faltou um mínimo de articulação ao governo para impedir que a oposição conseguisse as assinaturas necessárias para apresentar o requerimento: na verdade, sobraram assinaturas, num sinal evidente de tibieza do governo na Casa.
Diante da constatação, que deveria ser óbvia se o governo contasse com o mínimo de articulação política, de que Rodrigo Pacheco não pretende matar no peito este caso como tentou fazer com a investigação sobre as ações do governo na pandemia, instalou-se um deus nos acuda no Planalto.
Ameaças de recursos ao Supremo esbarram na dificuldade óbvia: qual a alegação possível, diante da reiterada manifestação da Corte de que a instalação de CPIs é obrigatória quando elas cumprem os requisitos de fato determinado e 27 assinaturas?
O regimento do Senado, diferentemente do da Câmara, não limita o número de CPIs que podem funcionar concomitantemente. Tampouco estabelece uma ordem cronológica para seu funcionamento, uma vez lidos os requerimentos.
Caberá aos partidos correr para viabilizar suas CPIs a partir da indicação dos integrantes. E, aqui, a oposição também tem vantagem, porque a distribuição de assentos pelos partidos prenuncia, de novo, uma maioria anti-Bolsonaro no colegiado.
Como há um entendimento de que, uma vez indicados dois terços dos titulares (oito senadores), a CPI pode funcionar, a capacidade de obstrução apenas sentando em cima das indicações é incerta.
E aí, diante do fracasso retumbante do governo de impedir a CPI por todos esses expedientes, resta a tentativa de usar o Orçamento para comprar apoio, como se não fosse justamente essa a gênese do escândalo de traficância de recursos da Educação que se quer investigar.
A derrama de dinheiro público que Bolsonaro vem promovendo para tentar escapar de toda sorte de infortúnios eleitorais não encontra precedentes em magnitude nem em leniência por parte do Ministério Público Federal e do Tribunal de Contas da União.
Desde que foi determinada a prisão preventiva de Milton Ribeiro e dos pastores lobistas do MEC, bem como de assessores que operavam o esquema corrupto de liberação de recursos do Fundo Nacional de Educação, corre solta a liberação de emendas do orçamento secreto.
Como se não bastasse, em outras frentes o governo prepara uma burla à luz do dia das vedações da lei sobre a campanha para despejar dinheiro e tentar injetar combustível eleitoral no tanque de um presidente que vem rodando na banguela.
Há muita dúvida quanto à viabilidade e ao impacto de uma CPI concomitante com o calendário eleitoral. Mas o salve-se quem puder que sua aproximação desencadeou mostra que o governo Bolsonaro vai entrando rapidamente naquele abandono do barco que o prenúncio das tragédias propicia. Com coletes salva-vidas em número insuficiente para todos os que querem pular ao mar.
O Globo