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segunda-feira, agosto 02, 2021

Remédio usado por Joice Hasselmann é ligado a relatos de apagão de memória e de acidentes


Crédito: Reprodução/TV

Remédio usado por Joice é “leve” mas pode causar acidentes

Valéria França e Cláudia Collucci
Jornal de Brasília/Folha

Uma discussão sobre os efeitos colaterais do zolpidem, substância hipnótica usada para induzir o sono, ganhou espaço nos últimos dias após o incidente relatado pela deputada federal Joice Hasselmann (PSL-SP), que disse ter acordado em seu apartamento no último dia 18 com fraturas e hematomas pelo corpo.

Após o caso, que está sob investigação em Brasília, surgiram inúmeros depoimentos de pessoas que tiveram crises de sonambulismo, acompanhadas de apagões de memória e até a ocorrência de acidentes de carro, após o uso do medicamento. Joice não descarta ter sofrido um atentado.

NÃO SE LEMBRA – A parlamentar disse que, na noite anterior, estava assistindo a uma série com o marido e tomou seu remédio para dormir. Segundo Joice, ele foi para o quarto, e ela continuou a ver TV, mas não se lembra do que ocorreu depois. No dia seguinte, acordou no chão, machucada, sem saber o que aconteceu.

Segundo sua assessoria de imprensa, “os médicos descartaram a possibilidade de uma queda acidental” ter provocado as escoriações.

As câmeras de segurança do prédio onde fica o apartamento funcional da deputada não registraram a entrada de nenhuma pessoa estranha entre os dias 15 e 20 de julho, segundo perícia da Polícia Legislativa, que apura o caso. Mas não há câmeras nas escadas, halls e em pontos da garage. Laudos também apontam que ela não deixou o apartamento no período.

INVESTIGAÇÕES – O inquérito sobre o caso foi enviado para o Ministério Público Federal, que pediu novas diligências. A Polícia Civil do Distrito Federal também fez perícias no local.

Após prestar depoimento na Polícia Civil, no último dia 26, Joice disse acreditar que o responsável pelo suposto atentado que sofreu é alguém que a “odeia muito” e que quis dar um susto nela. “Eu já sofri muitas ameaças para parar, ameaças verbais, de estupro. Talvez tenha sido um recado mais duro, tipo ‘somos capazes de ir além’”, afirmou ela a jornalistas.

“O recado foi entendido, mas eu não vou fazer o que eles querem. Eu não vou me acovardar”, prosseguiu. “A única coisa que eu descarto é uma tentativa de assalto, porque eu tinha um computador que vale quase 30 mil reais, eu estava com os brincos, anéis e bolsa com cartão de crédito e dinheiro.”

SONÍFERO – A deputada revelou em entrevistas fazer uso do Stilnox, remédio à base de zolpidem, há cerca de 20 anos. Desenvolvida há 30 anos, de início para regular o jet lag de pessoas que fazem viagens internacionais, a substância é considerada segura pelos médicos desde que usada de acordo com as indicações da bula, na dose certa e por tempo adequado.

Entretanto, cerca de 5% dos pacientes que fazem uso do hipnótico zolpidem estão sujeitos a diminuição ou perda total da memória (amnésia), especialmente nas quatro primeiras horas após a ingestão, quando a medicação ainda está na corrente sanguínea.

O paulistano especialista em marketing Ciro Nardi, 57 anos, está dentro do pequeno grupo de 5%. Ele, que vive em São Paulo, começou a ter insônia ao iniciar um trabalho pela internet com uma empresa de Portugal, país com diferença de fuso horário de quatro horas com o Brasil.

PROBLEMAS MEMÓRIA – “Passei a dormir como um bebê com a nova medicação, mas, depois de um tempo de uso, percebi que estava com problema de memória recente. Minhas filhas diziam, por exemplo, que eu entrava durante a noite no quarto delas para brincar, e eu não me lembrava”, conta Nardi.

Até que, no início deste ano, ele acordou ao bater o carro em um poste de madrugada. “Eu despertei com a batida. Não entendi nada. Não me lembrava de ter saído da cama, me vestido, aberto a garagem e dirigido ao longo de 12 quadras.” Por sorte, ele não se machucou.

“A pessoa pode fazer e vivenciar coisas, que não ficam retidas na memória”, afirma o psiquiatra Mauro Aranha. Nessa situação, mesmo parecendo estar acordado, o indivíduo não tem os mesmos reflexos nem o mesmo raciocínio.

DIZ O PSIQUIATRA – Segundo o psiquiatra, se a pessoa acordar durante as quatro horas em que o fármaco circula na corrente sanguínea, ela pode não se lembrar do que fez. “Mas, se despertar quando a substância não está mais circulando no corpo, provavelmente já estará consciente dos próprios atos”, explica.

A bula do medicamento alerta sobre “as propriedades farmacológicas do zolpidem, que podem causar sonolência, diminuição dos níveis de consciência —levando a quedas e, consequentemente, a lesões severas—, sonambulismo ou outros comportamentos incomuns (como dormir na direção e durante a refeição), acompanhado de amnésia”.

 “O zolpidem é mais adequado e leve que os benzodiazepínicos no tratamento da insônia, mas isso não quer dizer que possa ser tomado sem indicação médica”, diz o neurocirurgião Pedro Pierro. Segundo ele, o remédio “causa menos adição, mas também leva à dependência química, se administrado por longo tempo”.


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