Jair Bolsonaro durante cerimônia do Dia do Soldado, em Brasília.
A rejeição do pedido de impeachment de Alexandre de Moraes pelo presidente do Senado foi apenas um dos movimentos dos chefes dos poderes para acalmar os ânimos elevados pelo presidente na capital
Por Afonso Benites
Brasília - Com o objetivo declarado de acalmar os ânimos em Brasília, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (DEM-MG), anunciou na noite desta quarta-feira a rejeição do pedido de impeachment do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes. O movimento de Pacheco foi o mais explícito dos esforços na capital federal para botar água na fervura político-institucional promovida pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido), mas está longe de ser o único. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), tem evitado pautar projetos polêmicos para não estimular embates. Tanto Lira quanto Pacheco se encontraram com o presidente do STF, Luiz Fux, nos últimos dias para manter aberto um canal de diálogo. Já o vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB) ofereceu seu gesto ao exaltar movimentos democráticos, enquanto o comandante do Exército, Paulo Sérgio Nogueira, defendeu que os militares têm de ser “inspiradores de paz, união, liberdade, democracia”.
O impeachment de Moraes era mais uma das cortinas de fumaça lançadas por Bolsonaro para se esquivar das críticas aos limites de seu Governo na gestão econômica e da pandemia do novo coronavírus. Também serviu para alimentar a sua radical militância, que promete realizar protestos em sue apoio Brasil afora no próximo dia 7 de setembro. Ao rejeitar o pedido de destituição apresentado na última sexta-feira por Bolsonaro, Pacheco alegou que a consultoria do Senado não identificou justa-causa nem tipicidade para o impeachment prosperar. “Quero crer que essa decisão possa constituir um marco de restabelecimento das relações entre os poderes”, declarou.
Nas últimas semanas, o senador, assim como Lira e o ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP-PI), mantiveram encontros separados com Fux. No centro do debate, o interesse em reduzir os atritos institucionais promovidos pelo presidente. Havia a previsão de que Bolsonaro participasse de uma reunião coletiva com todos eles no início do mês, mas, ao apresentar o pedido de impeachment de Moraes e ameaçar fazer o mesmo com Luís Roberto Barroso, outro ministro do STF, o presidente rompeu todas as pontes com os demais poderes. E o fez, ainda por cima, reforçando um discurso golpista, segundo o qual poderia agir “fora das quatro linhas da Constituição”.
Aparentemente, contudo, a radicalização não tem encontrado ecos internos. O comandante do Exército, general Paulo Sérgio, afirmou em discurso nesta quarta-feira, testemunhado por Bolsonaro, que todas as Forças Armadas agirão sempre amparadas na Constituição. E deu recados claros sobre os intentos autoritários. “Sejamos, junto aos irmãos brasileiros, inspiradores de paz, união, liberdade, democracia, justiça, ordem e progresso, que o nosso povo tanto almeja e merece, dedicando-nos, inteiramente, à defesa da soberania nacional e ao bem do nosso amado país”, discursou durante evento por ocasião do Dia do Soldado.
General da reserva, o vice-presidente Mourão mandou o seu recado pelas redes sociais. Disse em seu perfil no Twitter: “Neste Dia do Soldado, quando comemoramos o nascimento do Duque de Caxias, homenageio o Exército Brasileiro, rememorando seus feitos históricos e a luta pela democracia”.
Sem eco
Nem mesmo no Congresso Nacional, onde parte dos parlamentares já chegou a imaginar que Bolsonaro teria condições de dar um golpe, suas falas extremadas têm gerado efeito. “Por qualquer ruptura democrática o país pagaria um preço altíssimo. O prejuízo seria gigantesco, ninguém quer isso. Nem o próprio Bolsonaro. Ele sabe que não haveria apoio internacional ou nacional para qualquer golpe”, disse o deputado bolsonarista Capitão Augusto Rosa (PL-SP).
“Bolsonaro está mais isolado do que amparado”, constata o senador Rogério Carvalho (PT-SE), que identifica “uma reação acordada entre todos os setores democráticos da sociedade” contra o comportamento do presidente, inclusive entre os militares. Na visão dele, Bolsonaro não é um líder com apoio externo. “Ele é um pária para as democracias ocidentais, do ponto de vista dos direitos humano, ambiental, humanitário e sanitário”.
Sem esse apoio interno, das Forças Armadas, e externo, de outras nações, o que restaria ao presidente? Talvez estimular policiais militares a agirem em seu nome. Nesta semana, vieram à tona convocações de oficiais e ex-oficiais da Polícia Militar (PM) para que seus colegas participassem dos atos pró-Bolsonaro em 7 de setembro. “Bolsonaro provoca as manifestações para desrespeitar as instituições, afrontando a democracia. Se as instituições não se posicionam, dão vazão às pessoas que se sentirem desautorizadas a desrespeitar a lei. É o que tem acontecido com as PMs”, disse o líder do PT na Câmara, o deputado gaúcho Elvino Bohn Gass.
A Polícia Militar de São Paulo instaurou inquérito disciplinar contra o coronel Aleksander Lacerda cela convocação que fez para os protestos. No dia da independência do Brasil, está marcada uma série de atos pelas principais cidades brasileiras. Tanto apoiadores quanto opositores ao Governo devem se manifestar. Há uma preocupação de que haja confrontos entre os dois lados. Ainda que ambos prometam fazer um protesto pacífico. Sem mencionar diretamente qualquer dos eventos do dia, Bolsonaro postou um vídeo na noite desta sexta-feira para dizer que “a gente só ganha guerra se tiver informações”. “Se o povo estiver bem informado, tiver consciência do que está acontecendo... Alguns querem que a gente seja imediatista, eu sei o que a gente tem que fazer, dentro das quatro linhas da Constituição”, diz o presidente no vídeo, sem deixar claro sobre o que está falando. “Eu sei onde está o câncer do Brasil. Se esse câncer for curado, o corpo volta a sua normalidade”, completa, dizendo que não será mais explícito.
El País