Rosana Hessel
Correio Braziliense
Apesar de o Congresso finalmente ter aprovado a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2021 na semana passada, o governo não tem nada a comemorar em matéria de contas públicas, porque há uma bomba orçamentária prestes a explodir. O deficit primário de R$ 247,1 bilhões para o governo central, previsto na meta fiscal da LDO poderá ser muito maior com a falta de definição dos gastos no ano que vem e do verdadeiro tamanho do buraco fiscal que foi cavado durante a pandemia de covid-19.
Quem faz o alerta é o economista e consultor Paulo Rabello de Castro, ex-presidente do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
PANDEMIA ORÇAMENTÁRIA – Ele vê uma pandemia orçamentária pela frente. “Os números das contas públicas são catastróficos e pouca gente em Brasília tem verdadeira noção do desastre que está se armando em torno do orçamento de 2021. Será preciso um importante freio de arrumação”, alertou ele, em entrevista ao Blog. “O governo vai começar com um deficit de R$ 247 bilhões, mas ele poderá ser maior ao longo do ano, dependendo do que for ocorrendo”, acrescentou.
Na avaliação de Rabello de Castro, o governo ainda precisa explicar melhor os gastos emergenciais autorizados pelo orçamento de guerra durante a pandemia Ele desembolsou de R$ 600 bilhões a R$ 700 bilhões, mas apenas R$ 470 bilhões foram contabilizados até o momento, e, portanto, a conta não fecha.
“O governo tenta justificar que algo entre R$ 150 bilhões a R$ 200 bilhões era referente ao deficit primário já estimado. Ou seja, há aproximadamente R$ 100 bilhões que foram gastos e não existe explicação alguma quando olhamos os números”, denuncia.
FORAM OUTROS GASTOS – O economista lembrou ainda que os gastos efetivos relacionados à saúde no combate à pandemia são apenas 8% dos 92% do total de despesas extraordinárias. “Não faz sentido o governo dizer que gastou 8,5% do Produto Interno Bruto (PIB) contra a pandemia e ainda vermos hospitais no Amazonas sem respirador”, criticou.
Na avaliação de Rabello de Castro, o governo não está fazendo uma boa gerência desses gastos e, para piorar, despendeu recursos dos brasileiros de forma exagerada e sem o devido controle, porque a dívida pública está crescendo R$ 1 trilhão, neste ano, mas apenas R$ 300 bilhões desse montante tiveram efeito na atividade econômica.
“É como se o governo tivesse financiado um churrasco com dinheiro público, comprando carne e deixando uma parte no balcão do açougue e, em casa, o cachorro comeu um pedaço e ele teve que se virar com o que restou para os convidados”, comparou.
GASTOU EM QUÊ? – De acordo com estudo feito pelos economistas Rabello de Castro e Marcel Caparoz, da RC Consultoria, o coronavírus, como moléstia, respondeu por menos que 10% do total de gastos extraordinários autorizados pelo Congresso Nacional. Até outubro, “apesar das juras de austeridade como promessa de campanha, já gastou o equivalente a R$ 470 bilhões em despesas adicionais, todas atribuídas à pandemia da covid-19”.
“O terrível vírus só custou 8% desse total aos cofres públicos. De novo, faltam leitos e equipamentos; profissionais da saúde têm salários em atraso. Não houve encomendas tempestivas de vacinas ou seringas. Nada disso impactou o dilúvio de gastos ocorrido debaixo da pretensa responsabilidade da pandemia”, apontou o documento.
NOVO AUXÍLIO EMERGENCIAL – De acordo com Rabello de Castro, o governo precisará criar um novo programa de auxílio emergencial para cerca de 20 milhões de brasileiros que ainda vão precisar de ajuda do estado para sobreviverem.
“O desemprego está aumentando e deverá continuar elevado no ano que vem e, certamente, o governo não poderá ignorar esse fato. Mas esse benefício deverá ser muito mais cirúrgico, não podendo ser para 67 milhões de pessoas”, reconheceu.
Na avalição do especialista, a equipe econômica não está gerenciando devidamente os recursos. “Temos economistas estudados no governo, com competência teórica, mas que estão apresentando resultado zero quando o assunto é gestão orçamentária”, criticou. Para ele, o fato de boa parte da equipe do ministro da Economia, Paulo Guedes, ter debandado reflete essa falta de resultados.