Por: Dora Kramer
Em tese, madeira que bate em Chico bate em Francisco. O problema da teoria é que, na prática, outros quinhentos prevalecem. Não fosse por esse detalhe atroz, todos os candidatos às eleições de 2010 estariam liberados para começar suas campanhas a presidente, governador, senador, deputado federal e deputado estadual, agora mesmo.
A partir do momento em que o Tribunal Superior Eleitoral definiu que a presença da ministra Dilma Rousseff no palanque, em companhia do presidente Luiz Inácio da Silva, não guarda a menor relação com campanha eleitoral, todos os candidatos à eleição de 2010 poderiam se considerar liberados. Não o fazem, porém, por dois motivos: por receio de que nesse tipo de julgamento sejam usados pesos e medidas diferentes e por uma impossibilidade real imposta pela legislação eleitoral em vigor.
De acordo com a lei, as campanhas só podem começar depois da escolha oficial das candidaturas nos respectivos partidos. Como as convenções são realizadas (por lei) em junho do ano eleitoral, as campanhas só podem começar a partir daí. Isso, em relação a atos gerais de propaganda e também no tocante à arrecadação de recursos.
Legais, obviamente. Dentro do terreno da legalidade, o candidato no Brasil dispõe de três meses entre a oficialização da candidatura e a eleição. Os pretendentes apoiados pelos ocupantes do poder não estão submetidos a essa premência. Podem se utilizar (acabou de autorizar o TSE) da condição de governantes, usar todos os instrumentos à disposição de governos e, quando chega a data oficial apenas informa, também oficialmente, que daquele momento em diante não governam, buscam votos. Por mais que as ações sejam semelhantes.
Trata-se, obviamente, de um faz de conta. Seria inócuo e meramente formal caso não representasse um efetivo desequilíbrio nas condições de igualdade entre candidatos preconizada pela Constituição. Mas significa mais ainda. Incentiva a prática do caixa 2, pois trabalha com o prazo irrealista de três meses para arrecadação de recursos pelos meios legais.
A atual legislação brasileira anula, por exemplo, qualquer argumento em favor do modo de arrecadação adotado pelo então candidato a presidente dos Estados Unidos Barack Obama. Lá, Obama dispensou o financiamento público e optou pelas contribuições de pessoas físicas via internet. Não há termo de comparação possível com o nosso sistema, pois Obama começou esse movimento em fevereiro de 2007 para uma eleição que aconteceria em novembro de 2008.
Quase dois anos antes, em contraposição aos três meses permitidos no Brasil. Noventa dias de prazo, convenhamos, é um elogio à improvisação. Ou um incentivo à contabilidade paralela, como, na realidade, ocorre.
Fala-se em reforma política, mas não se fala na revisão de prazos eleitorais que obrigam o ocupante de um cargo público a se desincompatibilizar 60 dias antes do prazo para o início da campanha oficial. O governante precisa deixar o posto em abril, mas fica no limbo até junho, sendo candidato sem ser.
Essas talvez sejam distorções cuja correção mereça mais urgência e atenção por parte do Congresso. Principalmente agora que o TSE deixou o governo livre para transgredir.
Tudo dominado
É natural que o governo se mobilize contra a CPI da Petrobrás. Mas, em princípio, não há razão para temer coisa alguma. Isso independentemente do mérito das alegações da oposição e do fundamento das irregularidades a serem investigadas.
A questão, por ora, resume-se aos métodos e às circunstâncias, amplamente favoráveis ao Planalto. Primeiro, havia o recurso da retirada das assinaturas até meia-noite da última sexta-feira. Mesmo na improvável hipótese de o governo não ter conseguido a desistência de seis senadores, há o fato de a oposição estar dividida. O DEM favorável ao cumprimento do acordo de esperar a audiência do presidente da Petrobras, Sergio Gabrielli, daqui a uma semana, e o PSDB no patrocínio da CPI.
Além disso, o histórico recente de comissões de inquérito é uma conta de soma zero. Seja porque os governistas detêm o controle de todas elas, seja porque a oposição já mostrou que só vai até um determinado ponto e não ultrapassa nenhum limite que possa esbarrar nos interesses de quem já foi e pretende voltar a ser governo.
Outro motivo que não autoriza grandes expectativas é a crescente irrelevância das CPIs, autodesmoralizadas pela ação das tropas de choque e pelos acordões avalizados pela oposição. Finalmente, e assaz importante, há o cotejo - já usado por Lula na queixa de falta de “patriotismo” do PSDB - entre o prestígio de que dispõe a Petrobras perante a opinião pública e o descrédito em relação ao Congresso, em particular à sua autoridade para investigar o alheio.
Fonte: Gazeta do Povo
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