Dora Kramer
A recente derrota do Brasil na disputa por uma representação na Organização Mundial de Saúde (OMC) não foi uma derrota qualquer. Destaca-se não pelo resultado em si, mas pelo conjunto da obra absolutamente desastrosa.
Ficou ruim para todo mundo: para a ministra Ellen Gracie, para o ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, e para o Brasil, que já se notabiliza como um colecionador de fracassos individuais naquele tipo de certame, tantas foram as apostas erradas feitas durante o governo Luiz Inácio da Silva.
Celso Amorim, como bem aponta o embaixador Rubens Ricupero, conhece o nome e as regras do jogo. Portanto, seria leviano atribuir os equívocos grosseiros e os argumentos mal-ajambrados usados na defesa do nome de Ellen Gracie à qualificação dele como diplomata.
Tampouco é verossímil que o presidente da República tenha tomado a si a questão e imposto a Amorim a forma de agir. No mínimo teria consultado o chanceler a respeito dos prós e contras envolvidos.
É de se supor que um diplomata experiente como Celso Amorim soubesse que as chances eram pequenas tendo em vista que o posto reivindicado acabara de ser ocupado por outro brasileiro (Luís Olavo Baptista) durante oito anos.
É de se imaginar também que um diplomata experiente como Celso Amorim soubesse das exigências do comitê de seleção da OMC em relação ao conhecimento na área de comércio internacional, tido como insuficiente no currículo da candidata.
É de se presumir que um diplomata experiente como Celso Amorim soubesse da impropriedade do argumento rudimentar de que a candidata brasileira era a escolha acertada justamente pela carência de conhecimento específico. Daria a ela um olhar livre de preconceitos sobre as questões em julgamento.
Portanto, é de se concluir que o chanceler seguiu uma orientação. Se foi apenas realista, no tocante à realidade de governo que o cerca, ou se foi mais realista que o rei, não importa. Em qualquer das duas hipóteses, uma coisa é certa: Celso Amorim segue à risca o propósito anunciado desde o início de “servir ao governo Lula”.
Por mais caro que isso custe ao Estado brasileiro a quem o Itamaraty, assim como as Forças Armadas, deve por princípio de ofício servir, sejam quais forem os compromissos ideológicos do governo em curso.
Em tese, o dever de um diplomata experiente como Celso Amorim é alertar o governo sobre as condições adversas, ponderar a respeito dos riscos e, se for o caso, orientar a estratégia de forma a reduzir os danos.
O que se vê neste, nos casos anteriores e no perigo da repetição do fracasso na escolha da diretoria-geral da Unesco é um diplomata experiente pondo sua competência em xeque em nome do desejo de “servir”.
Uma estranha aspiração, pois nem sempre a subserviência compensa.
Santa de casa
A ministra Ellen Gracie não deu sorte. Vários candidatos brasileiros a organismos internacionais já perderam disputas parecidas – é do jogo –, mas ela perdeu por uma conjugação de fatores especialmente desagradáveis, cuja ordem numa escala de importância não altera a má qualidade do produto.
Ex-presidente do Supremo, dona do dístico “primeira mulher a ocupar uma cadeira no STF”, respeitada por sua capacidade na área jurídica, admirada pela categoria nas maneiras, Ellen Gracie sai do episódio maculada.
Não merecia, embora não se possa atribuir toda a responsabilidade ao governo. Se há um atributo que um magistrado precisa conservar aguçado é o discernimento. Assim, intriga o fato de a ministra não ter aplicado sua capacidade de examinar as variantes, pesar as condições existentes e julgar a situação de modo a se preservar.
Vitória régia
O ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, participa de passeata em prol da legalização da maconha, chama a bancada ruralista de “vigarista” e do governo não se ouve reparo algum. De duas, uma: ou Minc está com carta-branca para pintar e bordar ou é visto como espécime de extravagância rara e, por isso, destinado à preservação.
Rede de proteção
Se confirmada a escalação da líder do governo no Congresso, Ideli Salvatti, como presidente, e do líder do governo no Senado, Romero Jucá, como relator da CPI da Petrobras, fica patente a intenção do Planalto.
Não é só controlar os trabalhos da comissão. Isso todo governo faz apoiado no regimento, embora a maioria nem sempre garanta o controle de fato. Muito menos dos fatos. A ideia é tentar impedir que a CPI ande para qualquer lado, transformando qualquer questão – da requisição de documentos à convocação de depoentes – em uma batalha regimental que tomará tempo e renderá desgaste.
Fonte: Gazeta do Povo
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