Publicado em 16 de julho de 2022 por Tribuna da Internet
Flávio Ferreira, Mateus Vargas e Jéssica Alves
Folha
O senador Davi Alcolumbre (União Brasil-AP) usou seu prestígio de presidente do Senado nos dois primeiros anos do governo Bolsonaro para transformar o Amapá em destinatário de expressiva parcela dos recursos da Codevasf (Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba).
Esta empresa federal foi entregue pelo presidente Bolsonaro ao controle do Centrão em troca de apoio político.
A REBOQUE DAS EMENDAS – Antes voltada para o atendimento de estados nordestinos e de Minas Gerais, principalmente a região do semiárido banhada pelo Rio São Francisco, a Codevasf hoje alcança regiões litorâneas e amazônicas.
A estatal cresceu em contratos no atual governo. De 2018 a 2021, o valor empenhado (reservado no orçamento para pagamentos) pela estatal avançou de R$ 1,3 bilhão para R$ 3,4 bilhões, a reboque das famosas emendas parlamentares —tudo isso sem planejamento e com controle precário de gastos.
Como mostrou a Folha, a Codevasf mudou de foco e passou a investir em pavimentações feitas a partir de licitações afrouxadas para escoar emendas parlamentares no governo Bolsonaro. A nova postura já resultou em obras precárias, paralisadas e superfaturadas.
EMENDODUTOS – Sob Bolsonaro, a estatal cresceu 63% no número de municípios atendidos, passando de 1.641 em 2018, na gestão de Michel Temer, para 2.675 a partir de lei de 2020, que adicionou inclusive o estado do Amapá à área de atuação. Hoje estão sob sua abrangência 15 estados e o Distrito Federal.
Dentro disso o Amapá se transformou em um dos principais emendodutos da Codevasf. A estatal ganhou um escritório regional e uma superintendência durante o governo Bolsonaro, a partir de projeto de lei de Alcolumbre.
O senador direcionou obras da estatal Codevasf para a empreiteira Engefort, alvo de investigações do Tribunal de Contas da União, por ser responsável pelo uso de empresa de fachada em licitações federais e campeã em contratos de pavimentação no governo Bolsonaro. Desde então, das quatro licitações de pavimentação já feitas pela Codevasf no estado, a Engefort ganhou três, somando contratos no valor total de R$ 145 milhões.
INFLUÊNCIA POLÍTICA – Ao mesmo tempo em que é acusada de irregularidades no Amapá, a Engefort registra negócios de meio milhão de reais com uma empresa chamada Gran-Amapá do Brasil, que formalmente tem como donos o presidente da Assembleia Legislativa do Amapá, Kaká Barbosa (PL), e uma ex-assessora da Casa, que consta como sócia-administradora da companhia, de acordo com levantamento da Folha.
A defesa da Gran Amapá diz que a relação entre as firmas é somente comercial e a empresa amapaense fez vendas de brita e outros insumos à Engefort que totalizaram cerca de R$ 500 mil em 2021. A Engefort também afirma que a ligação entre elas é exclusivamente comercial e a Gran Amapá é sua fornecedora.
A Gran Amapá afirma que pagou à Engefort pela venda de brita, mas é exatamente esse o material que foi objeto de desvios nas obras da Codevasf no estado, segundo os técnicos do TCU.
IRREGULARIDADES – A fiscalização do TCU foi à Ilha de Santana, em um trecho do rio Amazonas no Amapá, e constatou que a Engefort apresentou medições e faturas por quantidades de brita que na verdade nunca foram usadas nas pavimentações da localidade.
“Foram constatados indícios de faturamento por serviços não realizados pela empresa contratada e de utilização de dados que não condizem com os serviços executados nos boletins de medição, nos laudos técnicos e na documentação de aprovação pela fiscalização”, diz relatório do TCU.
A fiscalização afirma que o montante atual de desvio é R$ 212 mil, mas pode atingir R$ 6 milhões no decorrer da execução contratual. No total, as irregularidades podem levar a prejuízos aos cofres públicos de R$ 11 milhões.
###
NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – Esta é a segunda parte da matéria da Folha, que foi enviada à Tribuna por José Antonio Perez. As denúncias do TCU são gravíssimas e demonstram o mau uso das chamadas emendas parlamentares, uma espécie de Mensalão que o governo Bolsonaro instituiu para ter apoio no Congresso. O mais impressionante é a desenvoltura com que o senador Davi Alcolumbre faz negócios com recursos públicos e nada lhe acontece. Rigorosamente nada. (C.N.)