Rosana Hessel
Correio Braziliense
O Tesouro Nacional fez emissões recordes em 2020, e, como resultado, o perfil da dívida pública piorou bastante, o que será um dos principais desafios para a retomada do crescimento em 2021. Conforme levantamento feito pelo economista Sergio Goldenstein, consultor da Ohmresearch Independent Insights, no ano passado, as emissões do Tesouro somaram R$ 1,24 trilhão, em grande parte para cobrir o deficit primário acima de R$ 700 bilhões nas contas públicas devido às medidas emergenciais no combate à pandemia de covid-19.
Desse montante, 67% foram emissões de papeis prefixados (LTN e NTN-F), bem acima dos 50% computados em 2019. Já os papeis indexados à taxa básica de juros (Selic), conhecidos como LFTs, representaram 18% desse volume, praticamente a metade dos 38% contabilizados no ano anterior.
ÚLTIMO BIMESTRE – O estudo divulgado nesta sexta-feira mostra ainda que, apenas no último bimestre de 2020, as emissões brutas foram recordes, somando R$ 337 bilhões, e, descontando os vencimentos do período, a emissão líquida somou R$ 320 bilhões, um dado “bastante expressivo”.
Apesar de avaliar que o Tesouro está sendo bem-sucedido na gestão da dívida pública por conseguir rolar boa parte dos títulos vencidos no ano passado, o analista demonstrou preocupação com a piora no perfil da dívida pública, que teve os prazos encurtados.
“Em 2020, observou-se deterioração do perfil da Dívida Pública Mobiliária Federal Interna, para a qual contribuíram, além do agravamento do quadro fiscal do país, a redução bastante acentuada da taxa Selic”, destacou o documento.
RETORNO NEGATIVO – De acordo com o estudo, a LFT perdeu sua principal atratividade (baixo risco) em momentos de maior incerteza, pois o comprador do papel já inicia o carregamento do título com expectativa de retorno real negativo durante um bom tempo. “O Tesouro passou a concentrar suas emissões em títulos prefixados de curto prazo, o que, em conjunto com o aumento do déficit fiscal, acarreta elevação das necessidades de financiamento”, acrescentou.
Na avaliação de Goldensein, é praticamente consensual entre os analistas que o agravamento do cenário fiscal representa o principal risco na conjuntura macroeconômica do país neste ano. “O exame dos indicadores da dívida pública, em particular da dívida mobiliária, e do seu gerenciamento permite uma avaliação mais criteriosa do balanço de riscos”, complementou.
“COLCHÃO DE LIQUIDEZ”– No levantamento, o analista apontou ainda que o “colchão de liquidez” da dívida pública era de R$ 800 bilhões em novembro de 2020, o suficiente para cobrir com folga R$ 670 bilhões de papéis que vencem até abril de 2021.
Mas o governo brasileiro tem nada menos do que R$ 1,3 trilhão de títulos da dívida pública interna vencendo até janeiro de 2022. Pelos cálculos do economista Sergio Goldenstein, “o governo precisa evitar uma redução muito drástica deste colchão de liquidez para não voltar a gerar temores no mercado”.