Jorge Béja
Sérgio Moro, ao que tudo indica, não tem dormido. Passou a viver intranquilo. Talvez até arrependido de ter pedido exoneração da magistratura. Tudo para servir ao governo Bolsonaro que convidou Moro para integrar sua equipe de governo. Ou melhor, para servir à pátria, visto que na condição de juiz federal seu serviço à Nação era limitado a decidir os processos que, por sorteio, caíssem em suas mãos na 13ª Vara Federal de Curitiba. O próprio Moro reconheceu que no cargo de ministro da Justiça poderia ser muito mais útil ao país do que como juiz federal.
Até esta última sexta-feira as coisas vinham correndo razoavelmente bem. Foi quando surgiram dois episódios. Um, nada tem a ver com Moro. Foi a explosão de incivilidade que Onyx Lorenzoni teve com um jornalista que lhe fez uma pergunta que incomodou o futuro ministro-chefe da Casa Civil de Bolsonaro. Já o outro episódio tem tudo a ver com Sérgio Moro. Se não tem a ver agora, terá a partir de 1º de janeiro de 2019.
FAMÍLIA BOLSONARO – É, tem sim tudo a ver. Por azar (ou sorte) Moro terá que investigar a família Bolsonaro. O presidente eleito já antecipou que o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF), criado pela Lei nº 9613 de 3.3.1998 e subordinado ao Ministério da Fazenda passará a ser subordinado ao Ministério da Justiça, com Sérgio Moro ministro. E para que o COAF passe de um ministério para outro, Bolsonaro, já no dia 1º de Janeiro de 2019, após tomar posse na presidência da República, se verá obrigado a editar Medida Provisória para alterar a lei que criou o COAF a fim de submeter o órgão ao Ministério da Justiça.
O COAF destina-se a disciplinar, aplicar penas administrativas, receber, examinar ocorrências suspeitas de atividades ilícitas relacionadas à origem de dinheiro e, constatando a possibilidade de crime, oficiar ao Ministério Público para a adoção das providências que à promotoria pública compete.
NAS MÃOS DE MORO – Ora, este caso da movimentação milionária na conta-corrente de um ex-assessor do filho de Bolsonaro, além da distribuição de dinheiro para os filhos dele (do ex-servidor) e para a própria esposa do presidente eleito, tudo incompatível com o salário do ex-servidor parlamentar, já está sendo investigado pelo COAF, por ora subordinado ao Ministério da Fazenda.
No entanto, a partir da posse de Bolsonaro, a investigação permanece no COAF já integrante do Ministério da Justiça, tendo como sua autoridade mais alta o ministro da Justiça. E quem será ele? Sérgio Fernando Moro, o homem reto, incorruptível, sereno, justo, imparcial, severo, que deixou a magistratura federal para melhor servir ao Brasil.
ALGO IMPREVISÍVEL – Então, teremos o COAF de Sérgio Moro investigando o caso que envolve a família presidencial! Em outras palavras ou numa frase: Sérgio Moro investiga a família Bolsonaro. Que azar, hein doutor Moro? O senhor não previa uma situação dessa, tão constrangedora. Capitular o senhor não vai, porque é homem de bem, de fibra, forte e justo.
Deixar o governo talvez seja a saída, porque o senhor, um ídolo nacional imaculado, não vai se sentir bem nem à vontade no seio de gente desonesta, mentirosa, trapaceira…Voltar à magistratura o senhor não poderá mais, a não ser se prestar novo concurso público. Depois que o senhor pediu exoneração e o ato exonerativo foi publicado, torna-se juridicamente impossível a reintegração ao cargo.
DECEPÇÕES – Sobreviver, o senhor e sua família, com o dinheiro gerado com a aplicação de suas economias também não vai será suficiente. E nem o senhor tem fortuna para produzir a renda necessária a levar uma vida suficientemente mediana. Ir trabalhar em escritório de advocacia parece que o senhor não leva jeito para isso. É inimaginável Sérgio Moro defendendo criminosos, visto que sua área na magistratura sempre foi a penal.
É, doutor Sérgio Moro, o senhor e sua família devem estar muito apreensivos. O senhor desceu dos céus e ingressou no inferno. O senhor terá muitas decepções à frente do Ministério da Justiça. Talvez contra bandidos comuns, contrabandistas, milicianos, policiais corruptos, tráfico de entorpecentes e de armas e algo um pouco mais, o senhor encontre o meio de combate eficaz.
BARREIRAS – Mas….mas quando chegar nos políticos, nos deputados, senadores, para citar apenas duas corporações, aí o senhor vai encontrar barreiras intransponíveis. Veja só que o governo Bolsonaro ainda não começou e já explode este caso do ex-assessor do filho do presidente eleito, caso que competirá ao senhor, como ministro da Justiça comandar a investigação, constrangedora investigação.
Se fosse como juiz, o senhor poderia se declarar impedido ou suspeito, sem a necessidade de dizer o motivo. Mas como ministro não tem saída. Ou melhor, tem saída sim. Ou o senhor encara o que vem pela frente e, sem constrangimento, faz valer sua autoridade — e foi por causa dessa vocação de servir à Pátria que o senhor deixou a magistratura — e toma as providências contra quem seja, não importando o cargo, ou o senhor, pela segunda vez na vida, pede exoneração. E sem Sérgio Moro no governo federal, o navio afunda mais uma vez.
Feliz Natal, doutor Sérgio Moro e próspero Ano Novo.