ÉPOCA
Mensalão: Época revela todas as provas da polícia sobre o maior escândalo do governo Lula
—O dinheiro que alimentava o valerioduto saía mesmo dos cofres públicos
—Marcos Valério pagou segurança pessoal de Lula em 2002
—O cheque de R4 247 mil que financiou a campanha do ministro Fernando Pimentel
—Os contratos secretos da empresa do banqueiro Daniel Dantas para dar R$ 50 milhões ao PT
—As novas acusações contra Romero Jucá, Vicentinho, Benedita da Silva, Pimenta da Veiga...
Era uma vez, numa terra não tão distante, um governo que resolveu botar o Congresso no bolso. Para levar a cabo a operação, recorreu à varinha de condão de um lobista muito especial, que detinha os contatos, os meios e o capital inicial para fazer o serviço. Em contrapartida, o lobista ganharia contratos nesse mesmo governo, de modo a cobrir as despesas necessárias à compra. Ganharia também acesso irrestrito aos poderosos gabinetes de seu cliente, de maneira a abrir novas perspectivas de negócios. Fechou-se o acordo – e assim se fez: o lobista distribuiu ao menos R$ 55 milhões a dezenas de parlamentares da base aliada do governo. O governo reinou feliz para sempre.
Mas somente por dois anos. Há seis anos, em junho de 2005, pela voz do vilão e ex-deputado Roberto Jefferson, a fantástica história do maior escândalo de corrupção já descoberto no país, conhecido como mensalão, veio a público. O governo quase ruiu. Seu líder, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, disse que “devia desculpas” ao país. Os dirigentes do PT, o partido responsável pelo negócio com o lobista, caíram um após o outro, abalroados pelas evidências de que, não, aquela não era uma história de ficção: era tudo verdade.
Sobrevieram as investigações de uma CPI (a última que chegou a funcionar efetivamente no país) e a enfática denúncia do procurador-geral da República, que qualificou o grupo como uma “organização criminosa”, liderada pelo primeiro-ministro informal desse governo, o petista José Dirceu. A realidade dos fatos abateu-se sobre as lideranças do partido. Tarso Genro, um deles, falou em refundar o partido. Lula pediu desculpas mais uma vez. O então deputado José Eduardo Cardozo reconheceu que houve mensalão, e que era preciso admitir os fatos.
Parecia que haveria um saudável processo de depuração ética em Brasília. Parecia. Os anos passaram, e a memória dos fatos esvaiu-se lentamente, carregada pelo esforço dos mesmos líderes petistas de reconfigurar o que acontecera através das lentes da má ficção. Dirceu começou a declarar que não houve compra de votos. Petistas disseram que o esquema não fazia sentido, uma vez que, como eram governistas, não precisariam receber dinheiro para votar com o governo – esquecendo que o valerioduto também contemplava o pagamento de campanhas políticas com dinheiro sujo. Delúbio Soares, o tesoureiro que coordenou os pagamentos, disse que tudo se tornaria piada de salão. Agora, obteve apoio para voltar ao partido, de onde fora expulso quando era conveniente a seus colegas. Por fim, quando estava prestes a terminar seu mandato, Lula avisou aos petistas: “O mensalão foi uma farsa. Vamos provar isso”.
São as voltas que o planeta político dá. Em Brasília, como se percebe, ele gira com especial rapidez. José Eduardo Cardozo agora é ministro da Justiça. Foi sob o comando dele que a Polícia Federal produziu sigilosamente um documento devastador, cujas 332 páginas resultam demolidoras para muitos dos próceres da República. Trata-se do relatório final da Polícia Federal sobre o caso do mensalão, que encerra oficialmente os seis anos de extensas investigações conduzidas por delegados, agentes e peritos especializados no combate ao crime organizado. A peça já está sobre a mesa do procurador-geral da República, Roberto Gurgel, e deverá seguir em breve para o gabinete do ministro Joaquim Barbosa, o relator do caso do mensalão no Supremo Tribunal Federal.
Liderada pelo policial Luís Flávio Zampronha, delegado que coordena o caso desde o início e integra a divisão de Repressão a Crimes Financeiros, a PF vasculhou centenas de contas bancárias, esmiuçou dezenas de documentos internos das empresas envolvidas no esquema e ouviu cerca de 100 testemunhas. Produziu-se esse minucioso trabalho por determinação do ministro Joaquim Barbosa. O objetivo era produzir provas acerca dos pontos que não haviam sido contemplados nas investigações da CPI dos Correios e da Procuradoria-Geral da República. As dúvidas dividiam-se em três perguntas elementares:
1. O mensalão foi financiado com dinheiro público?
2. Houve mais beneficiários do valerioduto?
3. Qual era o limite da influência de Marcos Valério no governo petista?
A investigação da PF dissolve essas incertezas – e faz isso com muitas, muitas provas. A resposta às duas primeiras perguntas é sim, sem dúvida. A resposta à terceira? Nenhum. Não há mais argumentos falaciosos, teses descabidas ou teorias conspiratórias que permitam ignorar os fatos colhidos pela PF. Derrubam-se, assim, os mitos que setores do PT, sobretudo sob a liderança moral e simbólica do presidente Lula, tentaram impor à opinião pública. O mensalão não foi uma farsa. Não foi uma ficção. Não foi “algo feito sistematicamente no Brasil”, como chegou a dizer o ex-presidente. O mensalão, como já demonstravam as investigações da CPI dos Correios e do Ministério Público e agora se confirma cabalmente com o relatório da PF, consiste no mais amplo (cinco partidos, dezenas de parlamentares), mais complexo (centenas de contas bancárias, uso de doleiros, laranjas) e mais grave (compra maciça de apoio político no Congresso) esquema de corrupção já descoberto no país. O significado político e, sobretudo, simbólico do fim desse debate é enorme – e pode alterar os rumos do processo do mensalão no STF, que até o momento tendia para uma vagarosa morte jurídica.
Ao responder ao que lhe foi pedido, a PF avança ainda mais. Eis as principais descobertas expostas no relatório:
* Chegou-se, finalmente, ao elo mais grave do esquema do valerioduto: a conexão com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O segurança Freud Godoy, que trabalha com o petista desde a campanha de 1989 e desfruta a intimidade da família de Lula, confessou à PF que recebeu R$ 98 mil de Marcos Valério. Disse que se tratava de pagamento dos serviços de segurança prestados a Lula na campanha de 2002 e durante a transição para a Presidência;
* Os peritos da PF rastrearam o envolvimento de mais grão-políticos no esquema. Direta ou indiretamente, seja por meio de assessores ou de familiares, em campanhas políticas ou no exercício do mandato, receberam dinheiro do valerioduto políticos poderosos, como o minis-tro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, do PT, e o eterno líder do governo no Congresso, senador Romero Jucá, do PMDB. Descobriu-se também, ou se conseguiu confirmar, a participação de mais sete deputados federais, dois ex-senadores e um ex-ministro (leia a nova lista do esquema abaixo);
* O banqueiro Daniel Dantas, que participava de uma das mais renhidas e bilionárias disputas societárias do Brasil – e que, para resolver seus problemas, precisava desesperadamente de aliados no Palácio do Planalto –, tentou mesmo garantir o apoio do governo petista por intermédio de dinheiro enviado às empresas de Marcos Valério. Depois de se reunir com Dirceu, então ministro da Casa Civil, Dantas recebeu de Delúbio um pedido especial de ajuda financeira: US$ 50 milhões. Segundo a PF, a propina foi aceita. Pouco antes de o mensalão vir a público, uma das empresas controladas pelo banqueiro fechou contratos fajutos com Valério – apenas para que houvesse um modo legal de depositar o dinheiro. Houve tempo suficiente para que R$ 3,6 milhões fossem repassados ao publicitário. Encaminhou-se esse total a doleiros, mas a PF ainda não descobriu os reais beneficiários do dinheiro;
* São comprovadamente fajutos os empréstimos que, segundo a defesa de Marcos Valério, explicariam a origem do dinheiro do mensalão. Esses papéis serviram somente para dar cobertura jurídica a uma intrincada operação de lavagem de dinheiro. Apurou-se que houve duas fontes de recursos para bancar o mensalão e as demais atividades criminosas de Marcos Valério. Uma, a principal, qualificada pela PF de “fonte primária”, consistia em dinheiro público, proveniente dos contratos do publicitário com ministérios e estatais. O principal canal de desvio estava no Banco do Brasil, num fundo de publicidade chamado Visanet, destinado a ações de marketing do cartão da bandeira Visa. As agências de Marcos Valério produziam algumas ações publicitárias, mas a vasta maioria dos valores repassados pelo governo servira tão somente para abastecer o mensalão. A segunda fonte de financiamento, chamada de “secundária”, estipulava que Marcos Valério seria ressarcido pelos pagamentos aos políticos por meio de contratos de lobby com empresas dispostas a se aproximar da Presidência da República. Foi o caso do Banco Rural, que tentava obter favores do Banco Central e do banqueiro Daniel Dantas, que precisava do apoio dos fundos de pensão das estatais.
O almoço não é grátis: Bondade no IR será compensada em outros tributos
Na semana passada, a Receita Federal acenou com o que parecia ser um raro alívio para o bolso dos contribuintes. Ela elevou em 4,5% o valor mínimo que determina quem deve pagar Imposto de Renda (IR). A faixa de isenção do IR subiu de R$ 1.499,15 para R$ 1.566,61 por mês. Com a medida, menos pessoas pagarão IR, os atuais contribuintes pagarão um pouco menos e a Receita arrecadará R$ 1,6 bilhão a menos. Mas não existe bondade no mundo tributário.
Para compensar a perda de arrecadação com o IR, a Receita elevou em 15%, em média, a taxação sobre bebidas (cerveja, refrigerante, energéticos e água mineral). E subiu de 2,38% para 6,38% a alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para transações com cartão de crédito no exterior. As duas medidas deverão render R$ 1,75 bilhão, R$ 150 milhões acima da “perda” com o IR. É a saída para sustentar os crescentes gastos públicos e para cumprir a Lei de Responsabilidade Fiscal, que obriga o governo a encontrar outra fonte quando abre mão de arrecadação.
Na pista dos desaparecidos
Ivan Mota Dias, estudante de história, era conhecido como o Comandante Cabanos da Vanguarda Popular Revolucionária (VPR). A VPR era um dos mais agressivos grupos da esquerda armada que combatiam as forças da ditadura militar (1964-1985). Em 15 de maio de 1971, Dias foi preso no Rio de Janeiro por agentes do Cisa, o serviço secreto da Aeronáutica. Sua família o procurou, em vão. Seu corpo nunca apareceu. Documentos oficiais não registram seu destino. A história de Ivan é semelhante à de outros desaparecidos e as dúvidas que cercam seu destino são compartilhadas por outras famílias. Agora, 40 anos depois, surgem pistas. Os corpos de Ivan e de outros 16 desaparecidos podem ter sido enterrados como indigentes, ou com nomes falsos, em covas rasas no cemitério de Petrópolis, no Rio de Janeiro.
Sem alarde, no ano passado, a Secretaria de Direitos Humanos empreendeu durante oito meses a mais sistemática busca por restos mortais de desaparecidos políticos já feita no país. As buscas foram feitas em quatro Estados por uma equipe formada por funcionários da Secretaria, agentes da Polícia Federal, procuradores da República e um consultor externo. Um dos principais focos foi Petrópolis. Pelo menos entre 1970 e 1974, funcionou na cidade um cruel centro de tortura e assassinato mantido pelas Forças Armadas fora de suas instalações oficiais. A Casa da Morte – codinome Codão – ficava na Rua Arthur Barbosa, 668, no bairro Caxambu. Era um cárcere privado mantido pelo Centro de Informações do Exército (CIE). Para ele eram levados os presos que poderiam ser convertidos em agentes duplos. Mas a função primordial era torturar e matar sem deixar rastros. Isso incluiria a norma macabra de picotar os corpos.
As informações levantadas pela missão, no entanto, podem mudar o pouco que se sabe sobre esse episódio sombrio. Ex-militante que foi torturado no DOI-Codi paulista e cumpriu pena na década de 1970, Ivan Seixas foi o consultor da equipe da Secretaria. Há mais de dez anos, ele recebeu uma informação sobre os mortos em Petrópolis. “Procure no cemitério atrás do Quitandinha. Lá você pode achar o pessoal da casa”, disse um intermediário. Quitandinha é um hotel desativado, um dos cartões-postais de Petrópolis. Atrás dele fica o bairro onde está o cemitério municipal.
Cerco às senzalas da moda
Quando os auditores do Ministério do Trabalho entraram na casa de paredes descascadas num bairro residencial da capital paulista, parecia improvável que, dali, sairiam peças costuradas para as Pernambucanas. Não fossem as etiquetas da loja coladas aos casacos, seria difícil acreditar que a empresa, cujo faturamento foi de R$ 4,1 bilhões em 2009, pagava 20 centavos por peça a imigrantes bolivianos que costuravam das 8 da manhã às 10 da noite. Para abastecer a terceira maior rede varejista em vestuário do país, os 16 trabalhadores suavam em dois cômodos sem janelas de 6 metros quadrados cada um. O ar era quente, havia fios elétricos pendurados do teto e sacos de roupa misturados a sacos de batata no chão. Costurando casacos da Argonaut, marca criada pelas Pernambucanas para os jovens, havia dois menores de idade e dois jovens que completaram 18 anos na oficina. Três crianças, filhas dos trabalhadores, circulavam entre as máquinas.
Como consequência dessa operação, as Pernambucanas foram autuadas, na semana passada, pela acusação de explorar, em sua cadeia produtiva, trabalho análogo ao escravo (crime que pode ser punido, segundo o Código Penal, com multa e reclusão de dois a oito anos). A empresa recebeu multa de R$ 2,2 milhões. Por meio de sua assessoria, emitiu uma nota em que afirma: “A Pernambucanas não produz, ela compra produtos no mercado e os revende no varejo”. É verdade que as Pernambucanas não contrataram os bolivianos diretamente. Eles trabalhavam para a Dorbyn, uma confecção intermediária que recebia as encomendas das Pernambucanas e levava as peças-piloto para a oficina. Fábio Khouri, um dos diretores da Dorbyn, disse que desconhecia as condições de trabalho na oficina. Um gerente da confecção, porém, ia à oficina a cada 15 dias. “Pensamos que a produção poderia ser feita apenas por três pessoas”, afirma Khouri.
ISTOÉ
José Alencar: As lições de um brasileiro
É difícil precisar em que momento, depois de se tornarem heróis, grandes homens viram mito. A construção de um herói é uma trajetória fartamente descrita. Há meio século um dos maiores estudiosos de mitologia e religiões do mundo, o americano Joseph Campbell, mostrou que para tornar-se um herói o personagem precisa ser dotado de uma misteriosa “centelha divina”. É o que, desde cedo, o distingue dos comuns mortais. Então, em determinado momento da vida, os heróis enfrentam uma “tragédia” que mudará seus destinos.
Os novos vampiros
Ministério da Saúde descobre que uma nova Máfia dos Sanguessugas instalada no governo do Distrito Federal desviou, só em 2009, mais de R$ 70 milhões destinados à compra de hemoderivados
Em maio de 2004, o País se surpreendeu com a prisão da Máfia dos Vampiros, que desviou R$ 2 bilhões do Ministério da Saúde em contratos superfaturados para fornecimento de remédios específicos para o tratamento da hemofilia. Agora, exatos seis anos depois, uma auditoria do Sistema Único de Saúde no Hospital de Apoio de Brasília percebeu que um esquema muito semelhante está ocorrendo na Capital Federal e recomendou que a Secretaria de Saúde do DF investigasse mais a fundo a compra e distribuição de hemoderivados. Pouco menos de três meses após a abertura da sindicância, o governo do Distrito Federal já descobriu que uma quadrilha muito semelhante àquela da Máfia dos Vampiros desviou, só em 2009, R$ 72 milhões dos R$ 180 milhões gastos na compra de hemoderivados na capital federal.
Os novos vampiros brasilienses ultrapassaram seus antecessores. Além das tradicionais artimanhas para roubar dinheiro público, como licitações viciadas ou superfaturamento de preços, agora os criminosos também estavam roubando medicamentos no transporte entre os laboratórios e os hospitais. Remédios que deveriam ser distribuídos gratuitamente à população estavam sendo vendidos em farmácias de cidades mineiras e goianas. “Entre roubo, produtos entregues próximo da data de vencimento, que tinham de ser inutilizados, e medicamentos não entregues, os desvios chegavam a 40% do dinheiro do DF para medicamentos”, diz uma autoridade que acompanha o caso.
Não à toa, o SUS constatou que o consumo de remédios para hemofílicos no Distrito Federal foi 179% maior do que a média do País em 2009. Brasília apresentou consumo de 83.732 UI (unidades internacionais) por paciente/ano, enquanto a média do Brasil foi de 34.452 UI por paciente/ano. Diante das distorções, o governo do DF decidiu recadastrar os hemofílicos. Dos 470 pacientes que tinham recebido medicamentos no Hospital de Apoio em anos anteriores, menos de 100 compareceram para se recadastrar. Até uma ONG que participa do programa de medicamentos para hemofilia, a Ajude-C, terá seus cadastros de pacientes revistos.
Aberta a caixa de Pandora de Brasília
Na semana passada, secretários do governo do Distrito Federal revelaram à ISTOÉ que José Moacir Vieira, titular da Secretaria de Desenvolvimento Econômico, começou a receber ameaças de morte. Na noite da quarta-feira 30, alegando “razões pessoais”, Vieira pediu demissão. Seus antigos colegas não têm dúvida de que, apesar do respaldo dado pelo governador Agnelo Queiroz, as razões pessoais alegadas pelo ex-secretário estão relacionadas à chamada Máfia dos Terrenos, descoberta há cerca de 50 dias pela recém-criada Secretaria de Transparência. Formada por pseudoempresários, há pelo menos oito anos, a Máfia dos Terrenos se locupleta vendendo ou desvirtuando o uso de lotes obtidos do governo por meio de um programa batizado de Pró-DF. Vieira vinha tentando desmontar o esquema que começou a funcionar no governo de Joaquim Roriz e ganhou fôlego nas gestões de José Roberto Arruda e Rogério Rosso. O programa Pró-DF foi criado para motivar empresas a se instalar no entorno de Brasília. Para isso, além dos terrenos, o governo concede uma série de incentivos fiscais. O que se descobriu nos últimos dois meses é que, em nome desse projeto, uma quadrilha se aproveitou dos benefícios para promover fraudes em série. Muitos terrenos que deveriam abrigar grandes empresas acabaram vendidos e há casos até em que sobre eles foram construídas quitinetes para locação. O golpe, segundo as investigações, ganhou maior intensidade no ano passado. Em 2010, o governo distribuiu 381 terrenos, número maior do que a soma dos lotes entregues entre 2007 e 2009. Só em outubro, mês da eleição, 51 lotes foram doados.
“Quase todos os projetos não seguiram os trâmites legais”, confirmou à ISTOÉ o subsecretário de Desenvolvimento Econômico, Laerte de Oliveira Santos. O governo também já descobriu que a Máfia dos Terrenos pagava propina para que seus processos passassem à frente de outros e eles conseguissem a posse e, em seguida, a escritura definitiva dos terrenos. “Quem não pagou, não recebeu”, confirmou Santos. Diante desse quadro de generalizada corrupção, o ex-secretário passou a tomar medidas drásticas. Determinou o cancelamento dos incentivos e a retomada de terrenos irregulares, que seriam colocados à venda por meio de licitação da Companhia Imobiliária de Brasília (Terracap).
Parte das irregularidades foi desvendada a partir de auditorias realizadas, no início deste ano, pela Secretaria de Transparência, criada pelo governo atual para passar a limpo as denúncias da Operação Caixa de Pandora, da PF, que derrubou o então governador José Roberto Arruda. Quando assumiu o Palácio do Buriti, o governador Agnelo Queiroz determinou que se fizesse uma verdadeira devassa nos contratos celebrados nas últimas gestões. O resultado preliminar chocou os responsáveis pela devassa. “O levantamento nos causou espanto”, disse Queiroz à ISTOÉ. Entre os integrantes do governo do Distrito Federal acredita-se que a partir dessas investigações poderá se chegar aos financiadores do Mensalão do DEM. “Em troca da liberação dos terrenos, servidores públicos recebiam propinas e o dinheiro era posteriormente repassado à base aliada dos ex-governadores”, diz um dos técnicos que investigam o caso. Em Santa Maria, um lote de 195 mil metros quadrados foi liberado em apenas seis dias, quando a tramitação normal para um projeto considerado de altíssima relevância para o desenvolvimento econômico de Brasília, como a instalação de uma indústria farmacêutica, por exemplo, demora pelo menos 90 dias. Segundo revelou o ex-secretário de Relações Institucionais de Arruda, Durval Barbosa, em depoimentos à PF, mais de R$ 50 milhões foram pagos em propinas para transformar glebas rurais em urbanas, aumentando seu valor de venda em até 1.000%, negócio que poderia render à Máfia dos Terrenos cerca de R$ 13 bilhões.
Onde foram parar os comunistas?
Até agora, o Partido Comunista do Brasil (PCdoB) não digeriu a nomeação do ex-presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, para o comando da Autoridade Pública Olímpica (APO), que retirou do Ministério do Esporte o bilionário orçamento da Olimpíada de 2016. Na briga pela manutenção de seu espaço no governo Dilma Rousseff, os comunistas batem o pé pelo controle da área do esporte. A irritação é tal que dirigentes do PCdoB ameaçam abandonar a base aliada, da qual fazem parte desde a primeira campanha presidencial de Lula em 1989. Se no passado, movido por questões ideológicas, lutou pela criação de uma sociedade igualitária e chegou a promover a guerrilha rural contra a ditadura militar, o partido agora se empenha por questões bem mais comezinhas, como cargos no segundo escalão de ministérios e estatais. Mas continua a confiar que está no rumo certo. “Temos que nos defender”, diz o presidente do PCdoB, Renato Rabelo. Ele resiste à ideia de perder poder na Esplanada e diz que as negociações ainda não terminaram. “Nós mostramos à presidente Dilma Rousseff o papel que tivemos no governo Lula. Ela que julgue”, afirma Rabelo.
Vale lembrar que a sinuca de bico em que o PCdoB se encontra foi criada pelo próprio partido. Assim que foi eleita, Dilma, durante a transição, fez contato com a cúpula comunista e sugeriu que o Ministério do Esporte fosse ocupado por uma mulher, seguindo o plano de ter maior representatividade feminina em seu governo. O nome mais cotado era o da deputada federal Manuela D’Ávila (RS), política jovem com carisma e grande apelo junto ao movimento estudantil. Mas a sugestão foi vetada por Rabelo, sob o argumento de que pretende lançar Manuela como candidata à Prefeitura de Porto Alegre, em 2012. Dilma pensou então em Luciana Santos, prefeita de Olinda por dois mandatos e a primeira comunista a governar uma cidade no País. Mas Rabelo também se recusou a liberá-la e insistiu na permanência de Orlando Silva na esperança de que mais à frente o ministro fosse indicado para ocupar a presidência da APO. Queria matar dois coelhos com uma cajadada só, com o Orlando na APO e outro apadrinhado no Esporte. E o resultado foi que o PCdoB teve de engolir o nome de Henrique Meirelles. E, se entornar o caldo, pode ficar de mãos abanando.
O racha dos verdes
Há 15 dias, a Executiva Nacional do Partido Verde decidiu adiar por um ano qualquer discussão sobre mudanças internas. Sepultou, de vez, as perspectivas de renovação da cúpula da legenda, defendida pelo grupo de ex-senadora Marina Silva e levou a ex-senadora a comentar com correligionários que já pensa em deixar a sigla. Antes disso, no entanto, ela e seu grupo decidiram entrar em confronto direto com a atual Executiva Nacional do partido. Sem espaço para realizar a tão prometida refundação, os aliados de Marina declararam guerra ao deputado José Luiz Penna (SP), há 12 anos no comando do PV. Um dos políticos mais afinados com a ex-senadora, o deputado Alfredo Sirkis (PV-RJ) diz que o grupo de Penna é fechado e protegido por uma burocracia que tem por objetivo a preservação de seus cargos. “O adiamento foi uma manobra oportunista, visando à presidência vitalícia, o que vai contra o ideário do partido inteiro”, critica Sirkis.
Marina tem se mantido relativamente longe da polêmica, mas silenciosamente prepara seu desembarque da breve aventura verde que a levou a conquistar 20 milhões de votos como candidata à Presidência da República. A exemplo do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, Marina estuda a possibilidade de criar um partido para chamar de seu. A ex-parlamentar já começou a fazer consultas informais com aliados políticos e especialistas em direito eleitoral sobre a possibilidade de construção de uma nova sigla. Apesar de ainda não ter um plano de voo claro, Marina já teria decidido o nome da legenda que gostaria de criar: Partido da Sustentabilidade.
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CARTA CAPITAL
O fantasma fardado
Militares insistem em comemorar o golpe de 1964. Vale até insubordinação. Exclusivo: documentos inéditos mostram aquilo que o inglês não viu
Memórias dos anos de chumbo
Um escritório próximo à Cinelândia, a pouquíssimos metros do teatro que foi palco do discurso oco de Barack Obama, tem sido o local das reuniões de pauta do jornal online Rede Democrática. Na noite de sexta-feira, 25 de Março, tive a felicidade de participar dessa reunião e, em seguida, entrevistar um de seus membros: Carlos Eugênio Paz.
Podem chamá-lo de comandante “Clemente”. Entrou para a Ação Libertadora Nacional (ALN), quando esta organização política ainda era o chamado “Grupo Marighela” do Partido Comunista. Era um jovem de 16 anos. Naquele ano, 1966, a ditadura brasileira estava no “olho do furacão”, como definiu, dizendo que talvez isso tenha contribuído para sua sobrevivência, além de, principalmente, a lealdade de seus companheiros.
Minha intenção era entrevistá-lo sobre a Lei de Anistia, mas a conversa, saborosamente informal, e acompanhada por outros quatro integrantes da “Rede”, todos ex-guerrilheiros, aos quais dei a liberdade de intervir no papo, durou mais de uma hora. Mesmo porque ele não tem o menor problema em falar sobre seu passado. Ao contrário, acha isso importantíssimo. Tanto que já escreveu dois livros sobre o assunto: “Viagem à luta armada” e “Nas trilhas da ALN”. Tem um terceiro, pronto pra ser publicado.
Frente pelo direito à comunicação sai do papel e vai à sociedade
Desde o início de março um grupo de parlamentares se articula para debater mudanças na legislação das comunicações do Brasil e a construção de um novo marco regulatório para a área. A Frente Parlamentar pela Liberdade de Expressão e o Direito à Comunicação está finalizando a fase de coleta de assinaturas no Congresso para sua instauração e será lançada no dia 19 de abril, em um ato público que pretende reunir militantes e movimentos da área, assim como apoiadores da causa.
Para dar impulso aos trabalhos da Frente, alguns deputados do grupo participarão de um debate em São Paulo, nesta sexta-feira (01). O tema em discussão será o papel da mídia na atualidade e também o novo marco regulatório das comunicações. Para os parlamentares é fundamental envolver a sociedade civil no debate e na luta por mudanças positivas no marco regulatório, já que a Frente enfrentará muitos obstáculos e opositores em seus trabalhos. Estão confirmados os deputados Emiliano José (PT/BA), Luiza Erundina (PSB/SP), Brizola Neto (PDT/RJ), Jandira Feghali (PCdoB/RJ) e Ivan Valente (PSOL).
STF encurralado
Ao dar o voto de desempate no caso da Lei da Ficha Limpa, o ministro Luiz Fux já tinha sobre a mesa a petição da Ordem dos Advogados do Brasil, assinada pelo advogado Fábio Konder Comparato, datada de 21 de março, na qual é solicitada ao Supremo Tribunal Federal uma definição expressa quanto ao dever de o Brasil cumprir ou não a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos quanto ao parecer sobre a Lei da Anistia.
Fux tornou-se o relator dos embargos em torno dessa lei em razão de ser herdeiro dos processos do ministro Eros Grau.
Na prática, apoiado em argumentos jurídicos, Comparato encurralou o STF. O Estado brasileiro, no exercício de sua soberania internacional, aderiu à Convenção Americana de Direitos Humanos em 1992. Em 1998, aceitou a jurisdição da Corte Interamericana de Direitos Humanos. O STF terá condições de desconhecer isso?
Estudo do BID
O México afunda. O Brasil desponta
Fonte: Congressoemfoco