Não investigar a corrupção no MEC é compactuar com bandalheira numa pasta fundamental para futuro do País
É imperativa a instalação, pelo Senado, da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre os escândalos relacionados ao Ministério da Educação (MEC). Com a obtenção de mais de 27 assinaturas, o direito constitucional da minoria de fiscalizar o Executivo deve ser garantido. Não há alternativa ao presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), que não a de ler em plenário o pedido protocolado pela oposição. É esse o papel que a sociedade espera que o Senado cumpra nos derradeiros meses de um governo que, malgrado seus inúmeros malfeitos, parece seguro da impunidade.
Se não bastasse o desmazelo com que o governo tratou a área desde o início do mandato – foi ausente na pandemia e envolveu-se mais com a pauta ideológica do bolsonarismo do que com problemas reais da educação –, o MEC é hoje a principal fonte de escândalos da administração pública. Estupefato, o País tomou conhecimento, por intermédio do Estadão, que havia no MEC um “gabinete paralelo” integrado por pastores que negociavam propina para liberar verbas a prefeitos. Nem o negacionismo do presidente Jair Bolsonaro foi suficiente para impedir a demissão do então ministro da Educação Milton Ribeiro.
Se o funcionamento do gabinete paralelo no MEC é algo tão grave a ponto de se tornar alvo da Polícia Federal, o esquema liderado pelos pastores não é o único motivo a justificar a abertura da CPI. Merece profunda investigação dos senadores – e uma consequente reforma – a governança do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), há anos nas mãos de lideranças do Centrão. Em um País onde há 3,5 mil escolas com obras paradas por falta de recursos, este jornal mostrou que dinheiro do FNDE tem sido usado para autorizar a construção de milhares de novas unidades sem qualquer perspectiva de sair do chão, em um esquema muito semelhante a golpes aplicados em pirâmides financeiras. Não fosse o trabalho da imprensa, a verba do mesmo fundo teria viabilizado uma licitação para a compra de ônibus escolares com sobrepreço.
Ao contrário do que o governo quer dar a entender, o rol de escândalos relacionados ao Ministério da Educação não é simplesmente um erro ocasional. Nestes e em todos os outros casos revelados pela imprensa, há evidente intenção de privilegiar aliados – sejam políticos em campanha, sejam empresários em busca de enriquecimento, sejam pastores que atuam como atravessadores de recursos públicos. Há, portanto, muito mais do que um único fato determinado para justificar a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito.
Ademais, com a Câmara dos Deputados cooptada por emendas do orçamento secreto, resta ao Senado assumir a atividade de fiscalizar o Executivo, função que ganha ainda mais relevância quando sobram indícios de interferência de Bolsonaro na Polícia Federal. Não abrir a CPI do MEC por qualquer razão – pedidos de CPI protocolados anteriormente ou o calendário eleitoral – seria o mesmo que compactuar com a bandalheira em uma área fundamental para o futuro do País. Que o Senado não passe novamente pelo vexame de aguardar ordem expressa do Supremo Tribunal Federal para instalá-la.
O Estado de São Paulo