Gustavo Uribe, Danielle Brant e Julio Wiziack
Folha
Em meio à disputa política que têm obstruído a pauta legislativa, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) planeja fazer até o final do ano novas concessões ao bloco do Centrão, com a indicação de nomes para o segundo escalão. A primeira sigla contemplada será o PSD. O Palácio do Planalto acertou com a bancada do partido na Câmara dos Deputados a nomeação de Jarbas Valente para o comando da Telebrás.
O engenheiro eletrônico fez carreira no setor de telecomunicações e foi conselheiro da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações). Durante o governo do ex-presidente Michel Temer, ele presidiu a Telebrás por indicação de Gilberto Kassab, um dos fundadores do PSD, que era então ministro de Ciência e Tecnologia.
BANDA LARGA – Com um satélite em órbita, a Telebrás será usada para fazer um programa de massificação da banda larga em lugares ainda carentes de serviços pelas operadoras do mercado. O programa tem potencial político, porque prefeitos podem fechar parcerias com a estatal para levar internet a seus municípios, especialmente em lugares mais afastados.
Atacado na campanha por Bolsonaro como sendo exemplo do que chama de velha política, composto por congressistas adeptos do “toma lá da cá”, o Centrão reúne cerca de 200 dos 513 deputados. O grupo é formado principalmente por PP, PL, Republicanos, PTB e PSD (esse último nega fazer parte). DEM, MDB e Solidariedade também fazem parte do bloco na Câmara, comandado pelo líder do PP, Arthur Lira (AL).
O movimento do governo de abrir mais espaço para o Centrão ocorre no momento em que a disputa pelo comando da CMO (Comissão Mista de Orçamento) do Congresso levou a uma paralisação da pauta legislativa, atrasando projetos prioritários. Além do PSD, legendas como PP e PL também devem ser acomodadas em secretarias ministeriais.
SECRETARIAS – Segundo assessores do governo, integrantes das siglas discutem com a articulação política indicações para postos no Ministério do Desenvolvimento Regional. No alvo, estão os comandos das secretarias nacionais de Habitação e de Saneamento. A primeira é responsável pelo programa Casa Verde e Amarela, o antigo Minha Casa Minha Vida, e hoje tem à frente o economista Alfredo Eduardo dos Santos, que assumiu o posto em dezembro.
A segunda é comandada também pelo economista Pedro Ronald Borges, que, segundo assessores palacianos, tem como padrinho político o senador Roberto Rocha (PSDB-MA).O PSDB não faz parte da base aliada, o que tem sido questionado por integrantes do Centrão. O bloco partidário também tem demonstrado interesse, de acordo com assessores do governo, pela Secretaria de Desenvolvimento Social, do Ministério da Cidadania, responsável pelo programa Bolsa Família, que o presidente pretende reformular no próximo ano.
PP e PL são os partidos que detêm as maiores bancadas no bloco do Centrão, com 40 e 41 deputados federais, respectivamente. Desde a metade do ano, Bolsonaro tem feito acenos às duas legendas para mantê-las na nova base aliada. A intenção do presidente é ainda azeitar a relação com os dois partidos em um momento em que ele precisa dos votos das siglas para aprovar projetos para o período pós-pandemia do novo coronavírus.
REFORMA MINISTERIAL – Em conversas reservadas, Bolsonaro também sinalizou que as duas siglas podem ser contempladas, no início do próximo ano, em uma reforma ministerial que ele pretende promover para fidelizar a aliança com o bloco partidário. Uma das opções avaliadas é oferecer o comando da Cidadania, hoje comandada por Onyx Lorenzoni, do DEM. O aliado de primeira hora de Bolsonaro, que no início do ano foi retirado da Casa Civil, perdeu prestígio junto ao presidente.
Segundo assessores palacianos, o desempenho do ministro à frente da pasta não tem agradado Bolsonaro. O presidente avalia que a permanência de Onyx no cargo também não agrega apoio político, já que ele não é próximo do comando do DEM e sua indicação não foi considerada partidária.
O Planalto também cogita fazer uma mudança no Meio Ambiente. Na tentativa de arrefecer a imagem negativa do ministro Ricardo Salles na condução da política ambiental, ele avalia deslocá-lo para o Turismo, o que abriria mais um posto para os novos aliados.
FNDE – Até o momento, o Centrão foi contemplado com alguns postos no segundo escalão, autarquias federais e órgão do governo, como o FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação). Ele ainda detém o comando do Ministério das Comunicações, controlado pelo deputado federal Fabio Faria (PSD-RN).
A acomodação dos aliados no governo ocorre no momento em que Bolsonaro enfrenta disputas internas na Câmara. O presidente tem sofrido as consequências de um confronto antecipado pelo comando da Câmara dos Deputados. O candidato considerado favorito de Bolsonaro, Arthur Lira (PP-AL) tenta emplacar desde setembro um nome na presidência da CMO, rompendo acordo feito em fevereiro para eleger Elmar Nascimento (DEM-BA), aliado do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ).
O que começou como uma disputa pela sucessão da Casa se tornou uma demonstração de força do Centrão em relação ao governo. Sem um acordo sobre CMO, Lira tem liderado o bloco em uma obstrução no plenário. Como resultado, perderam validade medidas provisórias caras ao governo, como a 984, que dava ao mandante do jogo de futebol o direito exclusivo de transmiti-lo ou negociar a transmissão. Outros projetos prioritários, como o que regula a navegação por cabotagem e a lei cambial, seguem travados.
PRESSÃO – Na Esplanada dos Ministérios, a pressão do Centrão na Câmara também é vista como uma forma de reforçar ao governo o peso do grupo e pressionar pela liberação dos cargos de segundo escalão.
Bolsonaro se aproximou dos parlamentares no primeiro semestre quando se sentiu ameaçado de ser alvo da abertura de um processo de impeachment. A aliança política levou o presidente a compor uma base aliada, o que ele não havia formado desde o início de seu mandato.