SÃO PAULO - João Vicente Goulart, filho do ex-presidente João Goulart, o Jango, deposto em 1964 por um movimento militar, afirmou ter certeza que uma investigação sobre a morte de seu pai comprovaria que ele foi envenenado por substâncias colocadas nos medicamentos que tomava por militares uruguaios, a pedido da ditadura brasileira. Depois de muitas suspeitas, em novembro de 2006 João Vicente ouviu do uruguaio Mário Neira Barreiro, preso em Charqueadas (RS), a revelação de que participara da vigilância a Jango e do seu assassinato.
Esse depoimento foi o principal elemento para um pedido de reabertura das investigações da morte de Jango, através de uma Ação Civil Pública, entregue por João Vicente à Procuradoria Geral da República, em novembro de 2007. Até ele arrancar em primeira mão, há 14 meses, a revelação de Neira Barreiro, apenas se suspeitava do suposto assassinato de Jango.
Mas o pedido se ancorou, também, em documentos secretos liberados nos EUA, em uma entrevista do ex-embaixador americano no Brasil, Lincoln Gordon, e no depoimento do ex-governador Leonel Brizola a uma CPI da Câmara, em 2000. Em sua ida à CPI, Brizola relatou suspeitas de que Jango tinha sido fulminado por substâncias letais colocadas nos remédios que habitualmente tomava para seus problemas cardíacos.
A João Vicente, Neira Barreiro confessou que fez parte de um grupo militar uruguaio montado para vigiar Jango em sua fazenda La Villa, no município de Mercedes. O pedido para assassinar Jango teria sido transmitido a militares uruguaios pelo delegado Sérgio Fleury, que teria atribuído a decisão ao então presidente Ernesto Geisel.
Infiltração
No depoimento gravado por João Vicente em novembro de 2006, Neira Barreiro disse: "Não me lembro se colocamos no Isordil, no Adelpan ou no Nifodin (medicamentos que Jango tomava à época)". A forma escolhida para matar Jango teria sido colocar uma drágea com cloreto desidratado num esterilizador em meio aos comprimidos dos remédios que Jango tomava,importados da França, que simularia um enfarte.
A substância letal, disse Neira Barreiro, teria sido preparada pelo médico legista uruguaio Carlos Milles, depois morto em Montevidéu como queima de arquivo. A operação de cerco a Jango tinha o nome de Escorpião, uma pequena fração da Operação Condor, revelou Neira Barreiro a João Vicente na época.
O ex-agente uruguaio relatou que, para ter acesso aos remédios de Jango, um agente foi infiltrado entre os funcionários do Hotel Liberty, onde o ex-presidente ficava quando estava em Buenos Aires. João Vicente contou que começou a acreditar na veracidade das informações passadas pelo uruguaio quando ele lhe perguntou: "Não te acordas, Vicente, 27-3321?"
Logo se deu conta de que este era o número do telefone de La Villa. Por último, o uruguaio contou que se o corpo de Jango fosse necropsiado nas primeiras 48 horas, o veneno seria detectado. Mas a necropsia foi proibida pelos militares brasileiros.
Fonte: Tribuna da Imprensa
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