Com a aproximação do pleito eleitoral, surgem, nos mais diversos Estados do Brasil, iniciativas importantes que visam à conscientização dos eleitores a respeito do seu papel fundamental no processo eleitoral em curso, tendo em mira os propósitos das eleições limpas e do voto consciente.
O próprio Tribunal Superior Eleitoral produziu, neste ano, peças publicitárias muito mais diretas e enfáticas a esse respeito, com a intenção de demonstrar que os eleitores são responsáveis, sim, com sua ação ou com sua omissão, pelo que ocorrerá nos municípios em que residem nos próximos quatro anos.
Todo o discurso veiculado nessas campanhas tem a finalidade de qualificar o processo eleitoral através da participação cada vez mais decisiva dos eleitores, estimulando a realização de atos de cidadania. Cidadania que, por óbvio, não se restringe ao voto consciente, embora não possa existir sem ele.
A mobilização vem em boa hora já que é preciso direcionar os esforços da sociedade no fortalecimento de nossa democracia, ainda incipiente, neste momento difícil em que, perplexos e atônitos com os maus exemplos, e por que não dizer, com os delitos seqüenciais praticados por boa parte da classe política brasileira, boa parte dos eleitores começa a desacreditar nesse instrumento fundamental de construção da democracia, que é o voto, e passa a aderir, de maneira desavisada, a campanhas de cunho anarquista que apenas agravam a situação política por que passa o país, como a campanha pelo voto nulo, que já conquista, segundo pesquisas, parcela expressiva de eleitores brasileiros.
A campanha pelo voto nulo, que tem na internet o seu campo especial de propagação, se alimenta de dois falsos argumentos, quais sejam, o de que se mais da metade dos eleitores vier a anular o voto nas próximas eleições o pleito seria invalidado, e o de que os candidatos que concorrerem nesse primeiro pleito estariam proibidos de participar de uma nova eleição. Ora, nem há amparo legal para a anulação da eleição nessa hipótese - o código eleitoral só prevê a possibilidade de anulação do pleito nos casos de corrupção ou fraude generalizada -, e nem há instrumentos em vigor, caso essa anulação fosse possível, para impedir a participação em uma segunda eleição dos candidatos que tenham concorrido no primeiro pleito.
O próprio Tribunal Superior Eleitoral esclareceu isso ao julgar, ainda em 2006, o Recurso Especial Eleitoral nº 25.937, quando teve oportunidade de afirmar que “não se somam, para fins de novas eleições, os votos nulos decorrentes de manifestação apolítica do eleitor, no momento do escrutíneo, seja ela deliberada ou decorrente de erro”.
O que se observa é que, a partir de um estado de indignação perfeitamente compreensível – já que os eleitores brasileiros, que trabalham quase 05 meses do ano somente para pagar impostos, não conseguem ser atendidos de forma satisfatória nos seus anseios mais básicos, como saúde, educação, segurança e emprego, e ainda estão a observar, no dia-a-dia, um número significativo de políticos, dos mais diversos partidos, tentando se enriquecer ilicitamente através dos mandatos que lhes foram conferidos pelo povo -, muitos partem para a reação, fácil e equivocada, de simplesmente ignorar o processo eleitoral em curso, desinteressando-se pela política e adotando o discurso vazio do voto nulo que, é bom frisar, não nos levará a dias melhores.
Ora, se levarmos em conta que essa reação do voto nulo está fazendo coro, exatamente, em eleitores bem informados/instruídos, que não mais suportam acompanhar os escândalos políticos que permeiam a história do nosso país, chegaremos à inequívoca conclusão de que esse quadro somente se agravará se esses eleitores qualificados – que formam a classe média em geral – não se mobilizarem para ajudar a eleger pessoas comprometidas com a ética e o bom uso dos recursos públicos, e para combater os vícios do processo eleitoral, deixando o caminho livre para a eleição dos políticos inescrupulosos, os quais certamente obterão os seus mandatos de maneira ainda mais fácil, através de votos ou quocientes eleitorais cada vez mais reduzidos, utilizando-se da costumeira prática ilícita da compra de votos.
É hora, portanto, de partirmos para uma reação positiva e construtiva. Neste momento, é exigido de nós, enquanto eleitores e cidadãos, um esforço de mobilização para a construção de um processo eleitoral mais limpo, livre especialmente dos efeitos deletérios da compra de votos e do caixa dois, e para o compromisso inadiável do voto consciente, dado a pessoas honestas e que tenham um histórico de bom uso do dinheiro público, a partir de um rígido acompanhamento da história política e de vida dos candidatos em campanha.
Nesse sentido, não custa frisar que nunca houve tantas ferramentas disponíveis na internet para pesquisar as atividades e a história de vida dos políticos, como os sites da AMB (www.amb.com.br) e da Transparência Brasil (www.transparencia.org.br).
Apesar dessa necessária reação, duas pesquisas recentes descortinam cenários preocupantes a respeito da apatia política e eleitoral dos brasileiros.
A primeira, feita pela Associação dos Magistrados Brasileiros, em 2008, revela que se o voto não fosse obrigatório 38% dos eleitores brasileiros não participariam do processo eleitoral.
Já o resultado do Latinobarômetro, de 2007, que mede os índices de apoio popular à democracia na América Latina, mostra que o Brasil obteve um dos menores índices (43%), bem abaixo da média já insatisfatória da região, que foi de 54%.
Em suma, se o quadro político e eleitoral do país não é realmente dos mais satisfatórios, ao invés de abandonar o barco e deixar os piratas se aproveitarem do butim, os brasileiros têm que retomar o controle do timão, em busca de águas mais calmas e serenas, de forma a impedir o naufrágio de nossa incipiente democracia.
Ou em outras palavras, para destacar a frase que marca a campanha contra a corrupção que vem sendo realizada pelo Ministério Público em parceria com a Controladoria-Geral da União em todo o país, que bem resume o papel que cabe aos brasileiros nesse momento especial da vida política nacional: um país só muda quando os indivíduos que nele residem resolvem mudar!
Fábio George Cruz da NóbregaProcurador Regional da República na 5ª. Região (Recife)
Fonte: A Voz do Cidadão