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domingo, outubro 31, 2021

Bolsonaro destaca vacinação e “apoio popular muito grande” ao vender seu Governo no G20




Bolsonaro tira a máscara para posar ao lado de Mario Draghi na chegada à cúpula do G20, em Roma, neste sábado.

Enquanto segue semeando dúvidas sobre os imunizantes contra a covid-19 no Brasil, presidente celebra número de vacinados no país, diz que a Petrobras é “problema” e critica mercado “nervosinho”

Por Rodolfo Borges, Andrea RizziCarlos E. Cué e Daniel Verdú

São Paulo / Roma - Roma conheceu neste sábado ao menos dois Bolsonaros. Em sua versão oficial, o presidente brasileiro exaltou, durante discurso na cúpula do G20, a campanha de vacinação contra a covid-19 e disse que seu Governo está comprometido “com uma agenda de reformas estruturantes”. Nos bastidores do encontro e em entrevista a jornalistas, Jair Bolsonaro disse que a economia nacional está ”voltando bem forte”, que “a Petrobras é um problema” e que tem “um apoio popular muito grande”, além de criticar o mercado “nervosinho”, que estaria jogando contra o país. Mas muito pouco do que o presidente projetou sobre seu Governo na capital italiana se sustenta na realidade.

No discurso, Bolsonaro disse que ”o Brasil se comprometeu com um programa extensivo e eficiente de vacinação, em paralelo a uma agenda de auxílio emergencial e preservação do emprego para a proteção dos mais vulneráveis”. Não mencionou, contudo, a demora para o início da campanha nacional de vacinação ou o fato de que ele próprio não se vacinou e que segue semeando dúvidas sobre os imunizantes contra o coronavírus, algo que levou Facebook e YouTube a retirar do ar o vídeo de uma de suas lives. Os detalhes sobre os tortuosos caminhos do auxílio emergencial, cuja continuidade ameaça romper o teto de gastos, também não ajudariam o presidente a vender seu Governo no exterior, assim como as dificuldades para avançar no Congresso Nacional com qualquer das reformas estruturantes com as quais sua gestão se diz comprometida.

Um Bolsonaro bem mais próximo do real se revelou diante do presidente turco Recep Tayyip Erdogan. Em breve conversa informal, intermediada por tradutores e flagrada pelo colunista do EL PAÍS Jamil Chade, o brasileiro disse que a economia nacional está “voltando bem forte” —na verdade, começam a surgir projeções de recessão para 2022—, que a “Petrobras é um problema”, porque o Governo estaria enfrentando uma reação muito grande por quebrar seus monopólios, e que ele mantém “um apoio popular muito grande” —a aprovação de seu Governo não ultrapassa os 30% em nenhuma pesquisa de opinião. “Temos uma boa equipe de ministros. Não aceitei indicação de ninguém. Foi eu que botei todo mundo. Prestigiei as Forças Armadas. Um terço dos ministros [é de] militares profissionais. Não é fácil. Fazer as coisas certas é mais difícil”, finaliza o brasileiro.

Mais tarde, ao voltar para a embaixada brasileira em Roma, onde está hospedado, Bolsonaro desabafou contra o mercado financeiro, que tem punido com oscilações os descaminhos de seu Governo. “O mercado tem de entender que, se o Brasil for mal, eles vão se dar mal também. Nós estamos no mesmo time. O mercado, toda vez nervosinho, atrapalha em tudo o Brasil”, criticou o presidente diante dos microfones da imprensa, defendendo que não influenciou negativamente a economia brasileira e repetindo o discurso de que sempre foi contra o “fique em casa” durante a pandemia de covid-19.

Questionado sobre as propostas do Brasil para a COP26, a conferência mundial sobre mudanças climáticas que começa na segunda-feira, Bolsonaro disse que o país vai apresentar “uma posição surpreendentemente otimista”. E aproveitou para alfinetar os europeus, dizendo que, ao sobrevoar o continente, dificilmente se vê mata ciliar. “O Brasil preserva dois terços aproximadamente daquilo que recebemos em 1500. O Brasil é um exemplo para o mundo. Há uma campanha difamatória muito grande em cima do Brasil”, disse, acrescentando que o progresso do agronegócio brasileiro “incomoda muita gente”, assim como o estímulo que seu Governo estaria dando para os indígenas produzirem.

Ao contrário da maioria de seus pares do G20, Bolsonaro não vai para a COP26, que acontece em Glasgow, na Escócia. Preferiu agendar uma visita à pequena cidade italiana de Anguillana Veneta, de onde seus bisavós emigraram e cuja Câmara de Vereadores lhe concedeu o título de cidadão honorário. Antes de deixar a Itália, o brasileiro ainda passa por Pistoia, onde visita o cemitério que abriga 500 pracinhas mortos durante a Segunda Guerra Mundial. Na sexta-feira, o vice-presidente Hamilton Mourão defendeu a decisão de Bolsonaro de não comparecer à COP26: “É aquela história: sabe que o presidente Bolsonaro sofre uma série de críticas, então ele vai chegar em um lugar em que todo mundo vai jogar pedra nele”, disse Mourão, destacando que “está uma equipe robusta lá, com capacidade para, vamos dizer, levar adiante a estratégia de negociação.”

Imposto corporativo

Neste sábado, os líderes do G20 deram um novo impulso ao imposto corporativo mínimo global de 15%. Os mandatários das maiores economias do mundo expressaram na primeira sessão do encontro um “apoio amplo e transversal” ao acordo alcançado no âmbito da mediação da OCDE e que cerca de 140 países assinaram. A mensagem das grandes economias do G20, que representam mais de 80% do PIB mundial, tem o valor de dar vigor político a um processo que, após o pacto, enfrenta um percurso complexo de implementação. O objetivo é ativar a nova arquitetura tributária, que também prevê medidas para tributar as grandes empresas digitais, em 2023.

O novo impulso dado pelo G20 atesta o sucesso de um acordo em que a OCDE vinha trabalhando há mais de sete anos, em um projeto conhecido como Marco Inclusivo sobre BEPS (erosão da base tributária e transferência de lucros), de que mais de 130 países participam, para que as grandes multinacionais paguem impostos onde fazem negócios e não onde é mais barato para elas. O impulso dado pela última cúpula do G7, realizada no início de junho em Londres, foi decisivo para se chegar a um acordo mínimo, assim como a liderança da nova administração dos Estados Unidos do presidente Joe Biden e sua secretária do Tesouro, Janet Yellen. Também contribuiu o encontro entre os ministros da Economia no âmbito da presidência do G20, realizado em Veneza, em julho passado.

Sobre esse assunto, o Bolsonaro oficial disse, durante o discurso deste sábado, que “o histórico acordo concluído pelo G20 e por outros países sobre tributação internacional, no âmbito da OCDE, é também uma contribuição significativa para a sustentabilidade fiscal e econômica”.

El País

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