André Souza, Julia Lindner e Dimitrius Dantas
O Globo
O deputado federal Luís Miranda (DEM-DF) e seu irmão, o servidor de carreira Luis Ricardo Miranda, lotado no Departamento de Logística do Ministério da Saúde, prestaram depoimento na CPI da Covid, no Senado, nesta sexta-feira. Entre o que foi dito, o parlamentar afirmou que o presidente Jair Bolsonaro (Sem partido) citou o nome do deputado Ricardo Barros (PP-PR) ao ouvir denúncia sobre irregularidades na compra da vacina Covaxin. Os irmãos haviam denunciado pessoalmente a Bolsonaro suspeitas de irregularidades na compra da vacina indiana Covaxin.
A confissão de Miranda sobre o nome do deputado citado pelo presidente só foi feita já no final da noite, horas após o início da sessão, e após diversos momentos em que afirmou não se lembrar do nome do parlamentar que foi mencionado pelo mandatário como responsável pelos casos de corrupção no Ministério da Saúde. Barros já é alvo de investigações por sua ligação com a Precisa.
MEDO DE PERSEGUIÇÃO – Pressionado pelos senadores Alessandro Vieira (Cidadania-SE) e Simone Tebet (MDB-MS), Luís Miranda afirmou que seria perseguido caso falasse mas, ao fim, revelou o nome de Barros.
— Foi o Ricardo Barros que o presidente falou, foi o Ricardo Barros. Eu não me sinto pressionado para falar, teria dito desde o primeiro momento, mas vocês não sabem o que eu vou passar. Apontar um presidente da República que todo mundo defende como uma pessoa correta honesta. Que sabe que tem algo errado, sabe o nome e não faz nada por medo da pressão que ele pode tomar do outro lado. Que presidente é esse que tem medo de pressão de quem está fazendo algo errado? De quem desvia dinheiro público das pessoas morrendo na porra desse Covid? — disse Luis Miranda.
PEDIDO DE PROTEÇÃO – Após a confissão de Miranda, o presidentae da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), reclamou da demora da Polícia Federal em fornecer proteção ao deputado e o irmão dele, e prometeu responsabilizar o próprio diretor da corporação, o delegado Paulo Maiurino.
— Caso aconteça alguma coisa, o diretor da Polícia vai responder — disse o senador, acrescentando: — Tem que parar o governo de manter pessoas sob seu controle. Isso é aparelhamento de polícia, de instituições, que não podemos permitir. Senhor diretor-geral, o ofício está na sua mão.
Depois, Aziz disse ter sido informado que CPI mandou ofício comunicando que o deputado tem que pedir proteção à Polícia Legislativa da Câmara. Luis Miranda disse que já fez isso, mas não houve resposta ainda. Diante disso, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) sugeriu que a Polícia Legislativa do Senado faça a proteção dos dois. Aziz também fez um apelo ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que dê uma resposta ao pedido de Luis Miranda.
DENÚNCIA DE PROPINA – O servidor Luis Ricardo afirmou ter sido informado que alguns gestores do Ministério da Saúde estavam recebendo propina em troca de vacinas. Luis Ricardo, que trabalha há mais de uma década na pasta, apresentou prints de mensagens que mandou ao irmão falando sobre o suposto esquema. Aziz perguntou:
— Que servidor pediu propina?
Luis Ricardo respondeu: — O ministério estava sem vacina. E um colega, Rodrigo, servidor, disse que um rapaz vendia vacina. E esse rapaz disse que alguns gestores estavam recebendo propina. Ele não disse nomes.
Numa sessão tumultuada, sobretudo por senadores governistas, foi sugerida a convocação do servidor identificado por Luis Ricardo com Rodrigo.
PRESSÃO PELA IMPORTAÇÃO – Luis Ricardo também mostrou à CPI da Covid as mensagens que recebeu de seus superiores pressionando pela liberação da Covaxin. As cobranças, conforme ele mostrrou, foram feitas à noite e aos domingos. De acordo com os irmãos Miranda, houve uma pressão atípica para a importação do imunizante.
Em uma das mensagem, na qual o servidor avaliou ter havido pressão fora do normal para assegurar a autorização da importação, o coronel Marcelo Bento Pires, que trabalhava como assessor na Secretaria-Executiva da Saúde, chegou a compartilhar o contato do sócio da Precisa, Emerson Maximiano.
No texto, disse que o representante da empresa conversou com o secretário-executivo Elcio Franco naquela mesma sexta-feira (19 de março) para “agilizar” a liberação ainda naquela semana.
ALTA PRESSÃO — Durante toda a execução desse contrato, diversas mensagens recebi, ligações, chamadas no gabinete sobre o status do processo desse contrato — contou Luis Ricardo.
O relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL), perguntou se ele reportou a pressão que sofria por causa da Covaxin a seus superiores no Ministério das Saúde. O servidor disse que não, porque a pressão partiu justamente de dois superiores dele na pasta.
— Com essa pressão e a forma como a gente recebeu os documentos, toda a equipe do setor não se sentiu confortável com essa pressão, a falta de documentos. Como os meus dois superiores estavam pressionando, eu conversei com meu irmão, que passou para o presidente — disse Luis Ricardo.
###
NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – A que ponto chegamos. Enquanto os brasileiros morriam, seus representantes faziam a partilha do butim. (C.N.)