Carlo Iberê e Leandro Mazzini
Sebastião Afonso Viana Macedo Neves, 46 anos, ou simplesmente Tião Viana, senador de primeiro mandato - mas que por obra do destino ocupa interinamente a presidência do Senado - tem demonstrado maturidade política suficiente que lhe permite, hoje, criticar a ausência de integração entre os poderes e o próprio Legislativo. Observa que os políticos pecam pela vaidade, mas não titubeia em provocar: "a primeira instância de poder no Senado é o senador".
- No Senado, os partidos são secundários - avalia.
Formado em medicina, doutor especialista em infectologia, não demora para diagnosticar: "O Senado entrou numa fase de agonia como instituição". Integrante da Academia Acreana de Letras, encontra na metáfora uma resposta para justificar a falta do bom debate, dos grandes tribunos e de iniciativa que acometem a Casa.
- O Senado é um céu sem estrelas - lamenta, com um suspiro.
Na luta para recuperar a imagem da Casa depois de sucessivas denúncias contra o presidente licenciado, Renan Calheiros (PMDB-AL), Viana quer mais transparência, como nos gastos dos colegas, mas cobra apoio de outros poderes.
- O Supremo Tribunal Federal, juntamente com o TSE, não entenderam a nossa crise e preferiram suprir as nossas fragilidades legislando por nós.
Revela que tem levado ao presidente Lula os bastidores e as necessidades do Congresso, mas que a agenda sobrecarregada do presidente o impede de agir em defesa dos parlamentares. Defensor da CPMF, aponta erros do governo na negociação.
- O equívoco foi abrir muito espaço de negociação. Deveríamos ter sido mais rigorosos.
O senhor acredita em novas negociações sobre a CPMF? O governo tem mais para ceder?
- O equívoco foi abrir muito espaço de negociação no primeiro momento. Deveríamos ter sido mais rigorosos no início. Acho que o governo poderia, por exemplo, ter tratado questões do PAC com os Estados e ter convertido isso em vitória dentro do Congresso. Mas não fez assim, preferiu tratar diretamente da CPMF. E tratar o PAC não é perder. É ganhar, porque são investimentos. Mas o governo sabe o seu movimento e está com a situação ainda sob controle.
A oposição também diz que tem surpresas...
- Quando a imprensa expressa que os senadores César Borges (PR-BA) e Romeu Tuma (PTB-SP) estariam sendo pressionados a votar contra a CPMF e com isso não terem requisitados seus mandatos pelos DEM, você vê que têm outros caminhos de percurso que estão sendo atingidos pela oposição também. Não é um jogo de mão única. Não é só o governo que está em movimento, a oposição também está. A CPMF é um assunto muito delicado.
O senhor concorda que a CPMF seja permanente com tarifa reduzida?
- Acho que existe muito mais um grito de setores mais abastados da sociedade com a CPMF do que um necessário debate tributário que o Brasil deve tratar. A transformação em um imposto permanente com uma compensação tributária não causaria dano nenhum à sociedade brasileira. Não estou com isso dizendo que sou a favor e advogo a tese da CPMF, mas trato com muito respeito a questão tributária neste país e acho que a CPMF não é o inimigo tributário número 1 da sociedade. Ela representa 4% da carga tributária brasileira.
No ano que vem tem eleições municipais. Dá para discutir a reforma tributária?
- Este é um ponto essencial. Teremos um ano onde não se avança, quando o assunto é reforma estruturante para o país. Toda ação de governo que envolve reforma em atacado chegando ao Congresso significa morosidade, incapacidade de superar os obstáculos. Então, o governo deveria entender a experiência do Poder Legislativo mundial e observar que, quando se conseguiu reformar e modernizar a estrutura regulatória, foi quando se fez reformas no varejo e não no atacado. Reforma no atacado é para quem não quer fazer.
O senhor está dizendo que o governo não entende o processo legistativo?
A crise da CPMF está na relação governo-Senado. Na Câmara, o governo se relaciona com os partidos, tem maioria consolidada. No Senado os partidos não consolidam uma base segura para o governo. Os senadores não são adestrados pelas estruturas partidárias, têm suas independências, sua formação de instituição majoritária. E o governo não entende, não tem o diálogo de previsibilidade, não tem o diálogo de afirmação de influência nas políticas regionais. É importante sempre lembrar que esse equívoco é culpa do governo que não age antecipadamente.
Explique melhor esse ponto...
- Na Câmara o governo trata com os partidos e o partido decreta o seu "centralismo democrático". No Senado isso não ocorre. O governador não decide pelo senador, o ministro não decide pelo senador. Aqui, todos têm nível de independência grande, com mandato de oito anos, que dá uma estabilidade maior. O governo, às vezes, como trata a Câmara liberando emendas, discutindo nomeações, ele pensa que essa realidade pode se dar no Senado. E ela não é suficiente para assegurar unidade de apoio aos interesses da governabilidade. Não é uma nomeação, não é um cargo, não é uma emenda. No Senado essa equação não funciona. E o governo até hoje não entendeu. Assim foi o governo Fernando Henrique.
Então no Senado não existem partidos.
- No Senado os partidos são secundários. A primeira instância de poder no Senado é o senador.
Nos últimos meses o Senado viveu momentos de grande dificuldade. O que fazer para recuperar a imagem de Câmara Alta?
- O Senado entrou numa fase de agonia como instituição porque o descrédito foi amplo, foi extenso. Chegou a um ponto de muitos apresentarem a extinção do Senado, sem entender que aqui é a casa da federação. Agora, isso vai depender muito de nós. A crise foi gerada por nós. Nós nos enfraquecemos muito, fomos ao fundo do poço e temos o dever de dar a resposta. Só me incomoda é que no meio disso algumas instituições que poderiam ser solidárias, não foram. Por exemplo, o Supremo Tribunal Federal, juntamente com o TSE, que são instituições sagradas e primorosas para a vida democrática brasileira, nesta hora não entenderam a nossa crise e preferiram suprir as nossas fragilidades fazendo por nós e não nos estimulando a fazer por nós.
Mas não há vácuo de poder...
- Por isso que não transfiro a culpa a eles. Mas acho que a conduta poderia ter sido outra. Você imagina se nós pegássemos e disséssemos: "A Justiça brasileira não julga, a impunidade campeia neste país e portanto nós vamos fazer CPI para mostrar como a impunidade é forte neste país e a falta de julgamento". Em que estaríamos ajudando o Poder Judiciário? Em nada. Então melhor teria sido o Judiciário chamar o Poder Legislativo para o diálogo, mostrar solidariedade.
Existe essa musculatura aqui no Senado para retomar o poder?
- Acho que sim. Quando nós temos um PSDB fazendo o seu congresso nacional, o PT caminhando para o seu processo sucessório, o Democratas afirmando uma necessidade de um perfil ideológico mais claro, e quando você tem o Senado preparado e com vontade de buscar essa interface com aqueles que o formam, é muito bom. Só lamento é que o Poder Executivo não esteja fazendo nenhum movimento para fortalecer o Legislativo.
O senhor teve uma iniciativa de transparência. O que mais falta, além disso? Faltam idéias, os grandes tribunos?
- O Senado me parece hoje como um céu sem estrelas. As estrelas estão ausentes, precisamos recuperar isso. E como vamos recuperar? Não tendo medo de nós mesmos, avançando nas transparências, mostrando que quanto mais transparente, mais credibilidade, e que os debates têm que substituir o ambiente de vaidades por um de mais conteúdo. Acho que esse é o desafio da Casa. E o governo tem as suas barreiras. Poderíamos pactuar entre os líderes: ou o governo reduz 50% das medidas provisórias ou nós não votaremos 50% das medidas.
O senhor está falando em vaidade. É possível passar esse recado nas reuniões de líderes?
- Isso é um fenômeno global. As instituições parlamentares do mundo vivem suas fases de grande desgaste. No Brasil, o Poder Legislativo tem 50% de descrédito. Na Argentina, o índice é de 74%. Bolívia, Peru e México têm desgastes equivalentes. É um problema de um novo tempo, hoje você tem as ONGs querendo se apropriar do espaço do Poder Legislativo
Pode até ser evolução...
- Acho que sim, desde que tenhamos essa interconexão, a chamada cooperação. Não podemos ter é ONGs desvalorizando e desmerecendo as qualidades do Legislativo. Será que é bom para a democracia enfraquecer o Legislativo? Eu acho que também temos que partilhar isso com a imprensa brasileira. O Hugo Chávez está aí para mostrar que não é bom. Quando ele cresce e as instituições ficam fracas, o risco é muito grande.
O senhor defende a Venezuela no Mercosul?
- Defendo. Apesar disso tudo, acho que o que importa para nós é o fortalecimento do bloco. A União Européia e a Comunidade Européia acertaram muito quando se dirigiram para um bloco econômico. O povo venezuelano não pode pagar pelos pecados do senhor Chávez.
No que depender do Senado, a Venezuela entra no bloco?
Agora, hoje, possivelmente, não passa.
O senhor falou que falta compreensão dos outros poderes. Não é o momento de o presidente Lula defender o Congresso?
- Eu tenho feito essa ponderação, sempre que posso. Quanto mais próximo ele estiver do Congresso, mais fortalecido estará o Congresso. E ele não tem nada a perder com isso, ele só ganha, porque é o gesto da mão estendida. De quem está muito bem, mas quer as instituições também fortes.
O que o presidente diz?
- Ele concorda, mas tem uma agenda muito sobrecarregada. O presidente trabalha muito. E aqueles que são delegados dele para tal empreitada, não conseguem o mesmo êxito. Aqui, por exemplo, dos ministros das Relações Institucionais, o único que vi transitar com alguma facilidade foi o José Dirceu. Nem Aldo Rebelo, nem Jaques Wagner, nem Tarso Genro, nem Mares Guia conseguiram, porque o Senado tem suas peculiaridades.
Quem deveria ser esse interlocutor?
- Acho que é muito mais um problema de estratégia do governo. Ou seja, quando o governo se sacrifica dia e noite para tratar os problemas do Legislativo, vai ser sempre como o cachorro mordendo o próprio rabo, não vai sair disso. Mas se o governo tiver previsibilidade, montar uma agenda, entender a regionalização da política brasileira, vamos avançar muito. Agora, quando você não vê isso, aí vira uma tragédia.
Qual é o perfil do próximo presidente do Senado?
- Nós vamos ter um mandato "tampão" de um ano para o próximo presidente do Senado e acho que ele deve ser fruto do PMDB. O nome que consolidaria a unidade partidária e elevaria as relações interpartidárias na Casa seria o do presidente José Sarney, mas ele abdica dessa condição. Portanto, o PMDB sofre com a ausência dele e da facilidade de ter bons nomes.
Diante desse impasse do PMDB, o seu nome poderá ser um consenso?
- Prefiro não considerar essa hipótese. Não vejo nenhum problema em apoiarmos um nome do PMDB que assegure a aproximação da base do governo com uma boa relação com a oposição. Estamos a caminho já para um ano eleitoral difícil e, ao mesmo tempo, para 2010.
Pior ainda...
- Onde a disputa entre governo e oposição será talvez das mais acirradas, já que o presidente Lula não estará no meio desse debate.
Licenciado da presidência do Senado por força de um acordo com os governistas, alvo de sucessivas denúncias por quebra de decoro, Renan Calheiros (PMDB-AL) enfrenta na quarta-feira próxima seu segundo processo, com votação secreta em plenário. Todos apostam na absolvição. No Congresso, o que mais se comenta é o compromisso firmado por Renan com a oposição: para se livrar da cassação, reunciará ao mandato. Tem até dia 26 para isso. Viana acha que pode ser até antes.
O senhor acha que Renan vai renovar a licença ou vai renunciar?
- Penso que o entendimento será o da renúncia.
Isso pode acontecer...
- Agendei o julgamento dele para o dia 22, porque entendo que é no mínimo um ato de respeito meu com a condição que ele está vivendo. O senador Renan tem a licença vencida dia 26 e eu, portanto, não poderia adiar o julgamento para forçá-lo a renovar a licença. Teria que deixá-lo à vontade. Ele pode renunciar dia 21 ou dia 23, ou pode adotar outra medida, mas eu penso que o caminho natural é este.
Quais são os nomes hoje no PMDB que o senhor vê com maior chance de sucedê-lo?
- Dos que se apresentaram até agora, o Garibaldi Alves (RN) e Gerson Camata (ES), são os dois nomes que colocaram o pescoço para fora. Tem o José Maranhão (PB) muito tímido, porque entende que sua prioridade é o governo da Paraíba, e acho que Vadir Raupp (RO) também começa a ser considerado.
O senador Renan Calheiros ainda tem influência nessa disputa?
- Acho que necessariamente passará por ele, porque é um homem de muita influência interna, não só do PMDB, como em outros setores.
O voto continua secreto apesar de todo o debate.
- Mas a sessão será aberta.
O senhor acredita que desta vez, como na primeira, o voto secreto ajudará o senador?
- Nós temos que olhar qual é a vida do parlamento afora. Eu sou pelo voto aberto, como fui o primeiro a apresentar uma proposta de emenda à Constituição no Senado, em 2002, sobre isso, e fui derrotado. Romper com a sessão secreta é um pouco delicado. Você imagina quando formos tratar de um plano antiterrorista, plano de defesa nacional. Como vamos tratar disso abertamente? Você veja o Judiciário, que nos obrigou, naquele dia, a quebrar uma regra interna da Casa, mas há menos de três semanas o Conselho Nacional de Justiça decidiu por uma sessão secreta, porque envolvia intimidade... E aquele caso (do Renan) envolvia intimidade, que era questão de Vara de Família de um senador da República. E no Supremo, o regimento do Supremo assegura que quando tratar-se de questão de intimidade, a sessão será secreta. Então é preciso ponderar, é preciso ter serenidade para tomar decisões quando o assunto é a maturidade de instituições democráticas.
O senhor defende voto aberto para questão de mandato?
- A sessão aberta para caso de cassação de mandato, salvo quando envolver questões de intimidade. Quando houver, por exemplo, questões de segurança nacional, escolha de autoridades, ministro do Supremo Tribunal Federal, defendo uma discussão.
Mas algumas das PECs que estão em tramitação propõem isso...
- Propõem. .
Por que caíram?
- Porque houve um debate de vaidades na Comissão de Constituição e Justiça e foram para o vale tudo, amplo, geral e irrestrito. E acho que sem a devida maturidade.
O senhor fala em questões de intimidade. Isso tem que ser uma coisa muito bem definida para não haver subterfúgios.
- Isso é verdade. Por exemplo, quando for tratar de questão que envolva um filho, questão de absoluta reserva familiar, questões de uma condição humana que diga respeito apenas à pessoa, a sociedade deve ser preservada. Se não, que seja aberta. Se é do interesse público, não vejo problema.
Fonte: JB Online
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