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terça-feira, novembro 01, 2022

Bolsonarismo sem Bolsonaro já é palco de disputa




Forças lideradas pelo presidente desde 2018 se consolidam no cenário político nacional

Por Igor Gielow (foto)

Rei morto, rei posto? Como tudo que se refere à ascensão e queda de Jair Bolsonaro (PL), previsões muito assertivas são sujeitas a escrutínio prévio inevitável. Isso dito, sua derrota apertada para Luiz Inácio Lula da Silva (PT) gera duas certezas imediatas.

Primeiro, que serão dias, semanas ou talvez meses em que o golpismo decantado pelo presidente ao longo de seus quase quatro anos no cargo ganhará primazia no noticiário. Bolsonaro sempre teve como ídolo Donald Trump, sem esconder.

O ex-presidente americano, como se sabe, escreveu um roteiro pronto de sedição quando levou seus apoiadores a investir contra o Capitólio de Washington, em 6 de janeiro do ano passado, após um mês e meio de contestação da vitória de Joe Biden.

Como Bolsonaro nem disfarçou que iria na mesma linha, está certo que haverá confusão daqui para a frente. A primeira reação do presidente, de se recolher, não dá garantias de que o roteiro será diferente.

Mas como as chances institucionais de o país cair em alguma entropia devido a isso são baixas, em algum momento haverá um presidente resignado ou em surto —e aí estamos falando de território não coberto até aqui.

Fora do poder, Trump conseguiu manter o trumpismo bem vivo nos EUA. Não se sabe, contudo, se ele pessoalmente estará na disputa de 2024, como sua base defende. Mas é irrelevante: como força política, o ex-presidente segue em plena forma.

Como no Brasil, os EUA foram cindidos entre os apoiadores do republicano e de Biden, que enfrenta dura eleição congressual de meio de mandato agora em novembro. A evolução da rejeição inaudita da Bolsonaro, associada ao antipetismo que o ajudou a levar à Presidência em 2018, criou uma campanha eleitoral baseada na rejeição dos rivais.

Esse trato da antipolitica se mostrou forte neste ano, mas não como há quatro anos. Lá atrás, houve uma amálgama entre a rejeição ao PT e à política por ele encarnada devido ao tempo de serviço no Planalto com demandas que fervilhavam na sociedade desde o junho de 2013, passando pelo impeachment de Dilma Rousseff (PT) em 2016.

Assim, como a vigorosa votação da derrota de Bolsonaro mostra, esse é um eleitorado que não voltará a outras freguesias. O bolsonarismo se consolidou como opção popular de direita num país dividido, apesar de sua ficha corrida de má governança e todas as bizarrices ideológicas resumidas nas ações armadas de aliados nesta semana que passou.

Com o líder em modo Trump, resta pensar o futuro. Bolsonaro pode, tendo 67 anos, seguir em campanha constante até 2026. Mas agora ele gerou herdeiros potenciais, na forma de dois governadores.

Em São Paulo, houve a ascensão fulminante de Tarcísio de Freitas (Republicanos) ao governo. Matou o restante do tucanato paulista e agora está em condições de herdar o conservadorismo paulista. É candidato a liderança nacional de saída.

Vitória de Gilberto Kassab (PSD), que bancou a candidatura apadrinhada por um desafeto, Bolsonaro. Ficou com o melhor de dois mundos: voto bolsonarista em São Paulo para um proverbial forasteiro e grande influência.

Caberá saber qual Tarcísio adentrará o Palácio dos Bandeirantes. Tudo indica que, com Bolsonaro abatido, ele aderne para o PSD, talvez com uma filiação. Ocorrendo, será o grande distanciamento a marcar a disputa pelo espólio do presidente derrotado.

O outro líder a emergir nesse contexto se chama Romeu Zema (Novo), o governador reeleito de Minas Gerais. A seguir o padrão de seu primeiro governo, a separação do bolsonarismo mais raiz parece certa. É um candidato natural a tentar a Presidência em 2026.

Não se fala aqui de Cláudio Castro (PL), do Rio, porque a chance de projeção nacional do governador reeleito é próxima de zero, como ocorreu com seus antecessores. Ele tenderá a ser um porto para a máquina federal que será expulsa de Brasília com a saída de Bolsonaro, dadas as relações do clã presidencial com as minúcias do estado de onde saiu.

Ao fim, a derrota de Jair Messias Bolsonaro não altera o fato de que as forças sociais liberadas por ele em 2018 fazem parte do cenário político nacional. A composição do Congresso, que certamente comporá com Lula ao fim, mostra que há um caminho grande à frente desse campo. Quem herdará seu controle é algo ainda a ver.

Folha de São Paulo

Lula eleito: os processos que Bolsonaro pode enfrentar na Justiça comum ao perder foro em janeiro




Atualmente, há quatro inquéritos autorizados pelo STF em que o presidente é investigado por suspeita de diferentes crimes

Com a derrota nas eleições do domingo (30/10) e a consequente perda do cargo em 1º de janeiro, o presidente Jair Bolsonaro perderá também o foro privilegiado, ou seja, passa a responder a processos na Justiça comum.

Como presidente, Bolsonaro tem direito ao foro especial por prerrogativa de função, popularmente conhecido como foro privilegiado, o que garante que ele só pode ser alvo de investigações criminais com autorização do STF (Supremo Tribunal Federal).

Além disso, somente a PGR (Procuradoria-Geral da República) pode oferecer denúncia contra o presidente na Justiça e, para que a denúncia seja aceita, ela precisa ser autorizada pela Câmara dos Deputados.

Só então o presidente poderia ser julgado - pelo STF - e a consequência de uma condenação seria, além da pena correspondente ao crime, a perda do cargo.

Isso vale para os crimes comuns cometidos durante o tempo que esteve no cargo. Crimes de responsabilidade (que somente um presidente pode cometer), cuja consequência é um impeachment, têm um procedimento diferente, com julgamento exclusivo pelo Congresso.

Atualmente, há quatro inquéritos autorizados pelo STF em que o presidente é investigado por suspeitas de diferentes crimes. Bolsonaro também enfrenta as acusações de crimes feitas pela CPI da Covid, que estão em apuração pela PGR.

No entanto, a partir do momento em que deixar a Presidência da República, Bolsonaro passa a responder por todas essas suspeitas na Justiça Comum. Ou seja, a Polícia Federal pode continuar as investigações sem autorização do Supremo, as apurações que estão sendo feitas pela PGR passam para a competência de instâncias inferiores do Ministério Público e os processos no TSE passam para o TRE da região onde houve a suspeita.

Se o Ministério Público decidir fazer uma denúncia contra Bolsonaro, ele será julgado por um juiz de primeira instância.

Bolsonaro também perde o direito de ser defendido pelo AGU (Advogado-Geral da União) e vai precisar contratar um advogado particular.

Entenda quais são as suspeitas de crimes pelas quais Bolsonaro pode ter que responder na Justiça Comum a partir do dia 1º de janeiro.

Investigações autorizadas pelo STF

Há hoje quatro inquéritos em que Bolsonaro é investigado em andamento no Supremo:

    *Sobre divulgação de notícias falsas sobre a vacina contra covid-19 (INQ 4888);

    *Sobre vazamento de dados sigilosos sobre ataque ao TSE (INQ 4878);

    *Inquérito das fake news, sobre ataques e notícias falsas contra ministros do STF (INQ 4781);

    *Sobre interferência na Polícia Federal (INQ 4831).

Notícias falsas sobre a vacina contra covid-19 (inquérito 4888)

A divulgação de notícias falsas sobre a vacina contra covid-19 é um dos crimes que a CPI da Covid acusa Bolsonaro de ter cometido.

O pedido de abertura do inquérito foi feito após o presidente ler uma notícia falsa em uma transmissão ao vivo nas redes sociais feita por ele em 21 de outubro de 2021.

A notícia falsa dizia que pessoas vacinas contra a covid no Reino Unido estavam "desenvolvendo a síndrome da imunodeficiência adquirida [aids]", o que não é verdade. Na mesma live, Bolsonaro citou notícias falsas sobre uso de máscaras.

Tanto o Facebook quanto o YouTube, plataformas nas quais Bolsonaro fazia a transmissão, retiraram a live do ar para evitar a disseminação da desinformação.

O caso foi investigado pela Polícia Federal sob supervisão do STF. A PF concluiu que ações de Bolsonaro se enquadram no crime de incitação pública à prática de crime (art. 286), já que, segundo a PF, o discurso teve potencial de alarmar espectadores e incentivá-los ao descumprimento de normas sanitárias compulsórias na época.

'Como presidente, Bolsonaro tem direito ao foro especial'

Em agosto, o ministro Alexandre de Moraes, que é relator do caso, enviou o pedido de indiciamento de Bolsonaro ao Procurador-Geral da República, Augusto Aras. Desde então o processo teve alguns andamentos, mas a PGR não fez denúncia contra Bolsonaro até o momento.

A partir do momento em que Bolsonaro perder o foro, o caso deixa de ser competência da PGR e passa para o Ministério Público Federal, que pode então enviar denúncia à Justiça Federal.

Inclusão no inquérito das fake news (inquérito 4781)

Em agosto de 2021, Bolsonaro foi incluído no chamado "inquérito das fake news", que tramitava no STF desde 2019. A investigação apura notícias falsas, falsas comunicações de crimes e ameaças contra os ministros do Supremo e está ligada a um outro inquérito sobre atuação de milícias digitais para atacar a democracia na Brasil.

A inclusão de Bolsonaro na investigação aconteceu a pedido do TSE, que enviou uma notícia crime ao STF após uma transmissão ao vivo em que Bolsonaro divulgou notícias falsas que questionavam a confiabilidade do processo eleitoral.

Para o ministro Alexandre de Moraes, "observou-se, como consequência das condutas do Presidente da República, o mesmo modus operandi de divulgação utilizado pela organização criminosa investigada" no inquérito das fake news, "pregando discursos de ódio e contrários às Instituições, ao Estado de Direito e à Democracia".

Apesar de ter algumas decisões divulgadas de tempos em tempos, o inquérito é sigiloso e tramita no STF em segredo de Justiça.

'Em janeiro Bolsonaro perde o privilégio de ser julgado somente pelo Supremo'

Divulgação de dados sigilosos sobre ataque ao TSE (inquérito 4878)

Bolsonaro também é investigado em um inquérito aberto em 2021 como um desmembramento do inquérito das fake news. A partir de uma notícia-crime enviada pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o ministro Alexandre de Moraes determinou a abertura de uma investigação separada.

O inquérito desmembrado é sobre a divulgação de dados de uma investigação sigilosa sobre ataques ao TSE. Os dados foram divulgados por Bolsonaro e pelo deputado Filipe Barros com o envolvimento do delegado da Polícia Federal Victor Neves Feitosa Campos.

Segundo o TSE, o objetivo do vazamento seria contribuir para um narrativa fraudulenta sobre o processo eleitoral, "atribuindo-lhe, sem quaisquer provas ou indícios, caráter duvidoso sobre a lisura do sistema de votação no Brasil".

Em fevereiro, a delegada da Polícia Federal que comanda a investigação enviou um relatório ao Supremo com a conclusão de que Bolsonaro cometeu crime de violação de sigilo funcional. Ela, no entanto, não poderia indiciar Bolsonaro por causa do foro privilegiado.

Em agosto, a vice-procuradora-geral da República, Lindôra Araújo, pediu o arquivamento do inquérito, mas o pedido foi negado pelo ministro Alexandre de Moraes, que argumentou que a PGR não tem poder para impedir o prosseguimento de uma investigação policial que não foi requisitada pelo próprio órgão. Com a prerrogativa do foro privilegiado, é improvável que Bolsonaro seja denunciado por esse crime, já que isso precisaria ser feito pela própria PGR, que já pediu o arquivamento do caso.

No entanto, ao perder o foro, Bolsonaro poderia ser indiciado pela Polícia Federal e denunciado à Justiça pelo Ministério Público, respondendo pelo processo na Justiça Comum.

Interferência indevida na Polícia Federal (inquérito 4831)

A investigação foi aberta após denúncias do ex-ministro de Bolsonaro (e agora senador eleito) Sergio Moro, que ao deixar o governo em 2020 afirmou que o presidente fez tentativas de interferir indevidamente na atuação da Polícia Federal.

Esse caso deve ser arquivado, já que a PGR afirmou que não existem provas suficientes contra Bolsonaro para imputação de crime e pediu o arquivamento - como somente a PGR pode denunciar o presidente, a praxe é que o STF aceite o pedido.

O inquérito, no entanto, ainda está em tramitação - e se não for arquivado até janeiro, também pode passar para a competência da Justiça Comum.

Apurações preliminares da PGR

Além dos inquéritos no STF, Bolsonaro também tem acusações feitas contra ele — resultantes do relatório final da CPI da Covid — apuradas pela Procuradoria-Geral da República.

No entanto, o procurador-geral da República, Augusto Aras, é visto como aliado do presidente. Bolsonaro não foi denunciado pela PGR e é improvável que isso aconteça em dois meses.

Na verdade, para cinco das apurações preliminares de possíveis crimes cometidos, a PGR já pediu arquivamento ao STF: acusação de ter causado epidemia com resultado morte (por suspeita de propagar o vírus), de ter praticado charlatanismo (devido ao incentivo de uso de medicamentos sem eficácia), ter cometido infração de medida sanitária preventiva (por realizar aglomerações e não usar máscara), ter feito uso irregular de verbas públicas (por uso de recursos públicos na compra de medicamentos ineficazes) e ter cometido prevaricação (por supostamente não ter mandado investigar denúncias de corrupção na compra de vacinas).

Com o arquivamento, ela podem ser reabertas pelo Ministério Público somente se houver novas provas.

Já as apurações que não forem arquivadas podem se tornar investigações da Polícia Federal ou do MP. Atualmente, há duas em andamento: uma sobre incitação ao crime (por incentivar aglomeração e o não uso de máscara) e outra sobre falsicação de documento particular (por ter apresentado uma falsificação como sendo um documento oficial do Tribunal de Contas da União que provaria haver um excesso na contabilização de mortes por covid-19). 

BBC Brasil

Silêncio de Bolsonaro vira sinal verde para mobilização de extremistas




Com o silêncio do presidente Jair Bolsonaro (PL), extremistas se organizam pela internet para manter fechamento de estradas e protestar na Esplanada dos Ministérios em Brasília contra a vitória do petista Luiz Inácio Lula da Silva. O grupo alega que é preciso fazer uma "ação urgente contra a fraude eleitoral".

No Telegram, esses extremistas convocam para um ato na Esplanada dos Ministérios, falam em "resistência armada" e convocação de militares, medidas que são inconstitucionais. A ação anunciada em rede social levou a Secretaria de Segurança do Distrito Federal a bloquear o acesso à Praça dos Três Poderes. Os manifestantes também incentivam a reunião em frente ao Quartel General do Exército, na capital federal. Um grupo de apoiadores do presidente já está com bandeiras no setor militar próximo à sede do Comando do Exército.

Com o silêncio do presidente Jair Bolsonaro (PL), extremistas se organizam pela internet para manter fechamento de estradas e protestar na Esplanada dos Ministérios em Brasília contra a vitória do petista Luiz Inácio Lula da Silva. O grupo alega que é preciso fazer uma "ação urgente contra a fraude eleitoral".

No Telegram, esses extremistas convocam para um ato na Esplanada dos Ministérios, falam em "resistência armada" e convocação de militares, medidas que são inconstitucionais. A ação anunciada em rede social levou a Secretaria de Segurança do Distrito Federal a bloquear o acesso à Praça dos Três Poderes. Os manifestantes também incentivam a reunião em frente ao Quartel General do Exército, na capital federal. Um grupo de apoiadores do presidente já está com bandeiras no setor militar próximo à sede do Comando do Exército.

Autoridades federais e distritais que acompanham a organização de atos em Brasília veem o cenário com apreensão. Temem que, com o silêncio, Bolsonaro esteja buscando repetir, à sua maneira, o ex-presidente dos EUA Donald Trump, no ataque ao Capitólio em 6 de janeiro de 2021. Seria uma estratégia de "deixar acontecer", sem que tenha que incentivá-los pessoalmente.

Em entrevista à Folha de S.Paulo, o estrategista da campanha de Trump, Steve Bannon disse que a vitória de Lula foi roubada e que Bolsonaro não deveria reconhecer o resultado das eleições. "Não há possibilidade de o resultado das urnas eletrônicas estar correto. É preciso uma auditoria urna a urna, nem que demore seis meses. Nesse meio tempo, o presidente não deve aceitar sair", disse à Folha.

A preocupação de agravamento da crise cresceu após uma publicação no Twitter do senador Flávio Bolsonaro (PL-RJ): "Pai, estou contigo pro que der e vier!", escreveu o filho do presidente.

Em uma entrevista concedida ao Estadão em junho deste ano, Flávio disse considerar "impossível conter reação de apoiadores a resultado de eleições".

Auditoria militar

Enquanto isso, nos grupos de extremistas que se mobilizam os apoiadores de Bolsonaro dizem esperar os resultados da auditoria feita pelos militares sobre as urnas eletrônicas, pedem uma "intervenção militar" e se dizem dispostos a pegar em armas. "Eu topo participar da resistência armada na divisa sul do DF", escreveu um extremista. "A eleição foi fraude, temos que tomar uma atitude contra urgentemente", disse outro.

Para um outro mobilizador do grupo, os sinais da família Bolsonaro indicam que eles teriam algo que possa reverter o resultado das urnas. "Ele (Flávio) disse que Bolsonaro teve a maior votação da sua vida, com certeza estão com o relatório das urnas".

Estadão / Dinheiro Rural

O que Lula precisa fazer




Não cumprir o discurso de união é um erro, em especial em um país agora tão dividido politicamente como o nosso. Bolsonaro cometeu esse erro e pagou com a frustração de seus planos de reeleição. 

Por Diogo Schelp (foto)

Lula, presidente eleito neste domingo (30), deixou o improviso para o ato na Av. Paulista e ateve-se a um discurso de vitória protocolar, lido diante de jornalistas em um hotel de São Paulo. Em meio a uma repetição dos mantras da campanha, como o combate a pobreza e a defesa da democracia, e críticas ao presidente Jair Bolsonaro, o candidato derrotado, Lula fez o que era para ser entendido como um discurso de união e de pacificação do país.

Falou em "governar para todos os brasileiros" e em "tomar decisões em diálogo com a sociedade". A declarada intenção de Lula de fazer um governo de conciliação é necessária, para não dizer obrigatória. Mas a distância entre o discurso e a prática costuma sempre ser enorme.

Em 2018, após a confirmação de sua vitória nas urnas, Bolsonaro também fez um discurso de união, prometendo fazer um governo que trabalharia, "verdadeiramente, para todos os brasileiros" e lembrou que o país abarcava "diversas opiniões, cores e orientações". Não se furtou, porém, de realçar os pontos centrais da sua então vitoriosa campanha e de criticar as gestões passadas do PT, especialmente no campo da política externa.

Assim são, portanto, discursos de vitória: não se pode virar as costas para as aspirações dos eleitores que estiveram do lado vencedor, pois são eles os protagonistas e são eles, em primeiro lugar, que legitimam o ganhador.

Não cumprir, porém, o discurso de união é um erro, em especial em um país agora tão dividido politicamente como o nosso. Bolsonaro cometeu esse erro e pagou com a frustração de seus planos de reeleição. Ignorou — desprezou, até — a parcela significativa dos brasileiros que não compartilhavam de seus planos armamentistas, da militarização do governo civil, dos embates com os outros poderes da República e da estratégia de deixar a natureza seguir o seu curso na pandemia do novo coronavírus. "O povo do meu lado" a que Bolsonaro se referia em seus discursos era o povo monolítico dos populistas, não o povo plural da Constituição. Diálogo e negociação não eram o seu forte, haja vista a recusa em articular com os governadores uma resposta unificada à covid-19.

Lula tem tudo para incorrer no mesmo erro. Afinal, o presidente eleito se ressente do período em que ficou preso por corrupção ("tentaram me enterrar vivo", disse ele), o que pode resultar em revanchismo político, e parece realmente acreditar que quem optou por Bolsonaro estava no campo contrário ao da democracia. E não é bem assim.

Para transformar o discurso de união em prática, Lula precisa começar fazendo a leitura correta do resultado das eleições. Mais do que uma aprovação ao seu projeto de país e às pautas do PT, o que as urnas confirmaram foi a rejeição da figura de Bolsonaro. Mas foi uma rejeição parcial, de apenas um pouco mais da metade dos eleitores. Cerca de 2,1 milhões de eleitores a mais penderam para o lado do petista, o que representa um margem de vantagem pequena.

Para unir, de fato, o país e não aumentar as fissuras dessa polarização, Lula precisa evitar guinadas radicais em determinadas áreas, tais como a pauta de costumes, as boas práticas macroeconômicas e a liberdade de imprensa.

Se ele resolver pesar a mão na adoção de políticas identitárias, se começar a reverter a tendência de diminuição do tamanho do Estado na economia e se fizer movimentos para cercear ("regular") as vozes dissonantes na imprensa e nas redes sociais, Lula vai apenas aumentar o fosso que o separa da metade dos brasileiros que desconfiam de seus propósitos.

E, acima de tudo, a vitória não deve ser compreendida como uma licença para lotear o Estado e deixar a corrupção correr solta, como aconteceu nos governos anteriores do PT.

Lula e seu entorno têm o dever de resistir à tentação de repetir a roubalheira do passado, pois certamente não foi para isso que ele foi eleito. A sociedade brasileira estará de olho.

Gazeta do Povo (PR)

O que significa uma América Latina esquerdista? Se não piorar, já está bom




A direita falhou no teste no Brasil e em vizinhos importantes, abrindo as portas para o retorno de políticas comprovadamente fracassadas. 

Por Vilma Gryzinski

Unasul, Parlatino, Pátria Grande e outras instituições ou conceitos que pareciam ter entrado no horizonte de eventos vão ser reativados com a vitória do presidente eleito Lula e a extensa irmandade ideológica e territorial que ela cria na América.

Desde Porto Williams, na Patagônia, a Punta Gallinas, o ponto no extremo norte da Colômbia, estende-se a formidável massa territorial com governos de esquerda. Avançando pelo Caribe, alinham-se ainda a Nicarágua do sinistro Daniel Ortega; Honduras com a presidência terceirizada

por Xiomara Castro, a mulher do chapelão Manuel Zelaya, e, claro, o eternamente falido socialismo à cubana. Subindo mais, chegamos ao México, onde Andrés Manuel López Obrador é um esquerdista fora do padrão.

Restam governos de direita na América do Sul em apenas três países com peso regional menor: Uruguai, Paraguai e Equador.

Alguns dos governos esquerdistas olham para o Brasil sob um terceiro governo Lula como a tábua de salvação. Cuba, com o estado de miséria acelerado por apagões de até dez horas por dia, certamente espera mais dinheiro do contribuinte brasileiro, talvez escondido atrás de uma nova cortina de fumaça, considerando-se o conhecido calote da última rodada. A desfaçatez foi tão grande que o BNDES aceitou como garantia para o Porto de Mariel ingressos futuros provenientes da exportação de charutos.

Trocar charutos por um porto novinho em folha não parece ter sido um bom negócio para os brasileiros que ficaram no prejuízo.

Para a vice-presidente argentina Cristina Kirchner, o lulismo ressurgido traz uma dupla esperança: a de se passar por vítima de uma justiça persecutória, tal como o os partidários de Lula tanto apregoaram, e de algum alívio indireto numa política econômica tão espetacularmente atordoada que uma taxa de juros de 69,5% e onze tipos de câmbio são considerados aceitáveis.

Como fez Lula, Cristina espera ser candidata à Presidência outra vez, mesmo carregando a pesadíssima bagagem de três processos por corrupção. O atentado fracassado no começo de setembro não melhorou muito sua imagem fora da esfera dos kirchneristas roxos. Segundo uma pesquisa recente, a Frente de Todos nem chegaria ao segundo turno. A eleição presidencial é o ano que vem e a oposição, embora na frente, sempre terá a chance de dar vários tiros no próprio pé, como está fazendo agora.

Disparos foram em prejuízo próprio foram a especialidade que levou, desnecessariamente, o governo Bolsonaro a detonar a sua imagem internacional. Primeiro, com uma chancelaria dominada por fabulações surrealistas. Segundo, com a indiferença à ideia generalizada de que era um “queimador de floresta”.

Esse foi o rótulo que mais colou, independentemente de suas conexões com a realidade e dos interesses protecionistas disfarçados, por exemplo, por Emmanuel Macron ao dizer, durante um surto de incêndios florestais, que “nossa casa está em chamas”, quando na verdade pensava em plantações de soja na casa dele, ou pelo menos na Normandia. O presidente francês não tem nada de tolo e atacá-lo pessoalmente – ou, pior ainda, a aparência de sua mulher – mostra falta de profissionalismo para conduzir um debate em proveito próprio. Lacrar na internet não é fazer política externa.

O governo Bolsonaro deveria saber, ou ser informado por profissionais, que partiria sempre de um saldo negativo, considerando-se que a imensa maioria dos meios de comunicação tem simpatias por praticamente toda a turma com quem ele comprou briga.

Existem brigas que vale a pena comprar, outras que causam desgastes inúteis e prejudiciais. É um fato da vida. Por exemplo, a eleição de Gabriel Boric no Chile e de Gustavo Petro na Colômbia – dois países que pareciam imunes ao esquerdismo boliviariano – foi recebida pela imprensa estrangeira com aprovação quase universal, quando não deslumbramento.

Curiosamente, as maiores críticas a Boric foram feitas por companheiros de estrada. Diosdado Cabello, o virulento manda-chuva do regime madurista, insultou o jovem presidente chileno por ter criticado a situação dos direitos humanos na Venezuela, chamando-o de “bobo” e “cachorrinho”. Daniel Ortega repetiu na Nicarágua o insulto canino.

Repercussão? Fora do Chile, zero. Poucos querem falar de um assunto incômodo como brigas entre esquerdistas.

Também foi diluído o discurso delirante de Gustavo Petro no Assembleia Geral da ONU. Apresentado como um argumento racional sobre a inutilidade da guerra às drogas, Petro foi muitíssimo além disso. Disse que o petróleo e o carvão são piores do que a cocaína e afirmou, delirantemente, que a destruição da Amazônia colombiana é resultado das fumigações feitas contra as plantações da planta da qual a droga é derivada. Ele tem um plano de anistiar grandes traficantes que se “arrependerem” e mudarem de ramo. O que pode dar errado com isso, não é?

Um eixo Venezuela-Colômbia com a liberação, na prática, do tráfico, implica numa mudança geopolítica que deve ser levada em conta por qualquer formulador de política externa. Na Bolívia, nem se fala: está toda dominada, inclusive por criminosos brasileiros.

O mundo em que estão entrando o novo governo Lula e seu velho slogan sobre política externa – “Ativa e altiva”, em geral um sinônimo para o antiamericanismo infantil que é uma tendência forte da diplomacia brasileira – ficou um lugar mais perigoso. Ao mesmo tempo, abre novas oportunidades para o Brasil.

A invasão da Ucrânia cria dilemas importantes. Como conciliar pragmatismo, uma necessidade para países que não são autossuficientes em produtos vitais, e a obrigatória adesão aos princípios mais fundamentais da convivência internacional?

Nisso, esquerda e direita nacionalista se irmanam. Ambas querem ficar, vergonhosamente, do lado da Rússia e prognosticam um bloco eurasiano que engolirá o Ocidente. Até a China, que tem muito mais em jogo – inclusive a eventual hegemonia mundial -, disfarça mais habilmente seus propósitos, sem se comprometer com propostas de resolver com rodadas de cerveja um conflito no qual a Rússia quer nada menos que a extinção de um país vizinho.

Um bloco esquerdista latino-americano que aposte, como faz uma ala da nova direita, no declínio dos Estados Unidos e da Europa e se jogue nos braços abertos chineses é o que se chama em inglês de game changer, uma mudança nas regras do jogo.

O risco é que seja para pior. O histórico de fracassos dos governos da última onda esquerdista sempre pode ser superado. Políticas externas alinhadas produziram, por exemplo, a suspensão do Paraguai do Mercosul, pelo impeachment do hoje esquecido Fernando Lugo, e a admissão da Venezuela. O que poderia dar errado com isso, não é?

Hoje, ficou mais difícil abraçar efusivamente o chavismo do que na época de Chávez, mandar um pobre boxeador cubano de volta à ilha em lugar de lhe conceder o obrigatório direito de asilo e dar um empregão para alguém como Néstor Kirchner (na Unasul, sepultada depois pelos governos de
direita que se sucederam nos principais integrantes).

O presidente eleito acredita que foi um sucesso em política externa nos dois primeiros mandatos porque semeou embaixadas improdutivas, entre outras bondades. Pretende, muito provavelmente, repetir a dose.

Tem a vantagem da boa vontade com que muitos governos estrangeiros o receberão, uma imprensa que majoritariamente fez até o beija-mão preventivo, uma máquina de produzir divisas e abrir portas chamada agronegócio e o processo avançado de ingresso na OCDE.

Se não estragar isso, já estará bem menos ruim do que vizinhos movidos a impulsos autodestrutivos.

Revista Veja

O que é o chamado '3º turno' que Lula deve enfrentar depois da vitória




Jair Bolsonaro (PL) perdeu. E agora?

Por Rafael Barifouse, em São Paulo

Ele vai aceitar o resultado ou vai contestar a eleição que nem Aécio Neves (PSDB) fez em 2014?

Luiz Inácio Lula da Silva (PT) vai conseguir governar com um Congresso controlado pela oposição?

As ruas vão encher de novo? Vai ter golpe?

Essas perguntas, feitas desde antes da eleição, serão agora finalmente respondidas.

Muitos têm chamado de "terceiro turno" esse momento em que a vitória de Lula pode ser questionada e seu governo, ao extremo, inviabilizado.

A conversa deixou muita gente confusa achando que poderia haver uma terceira votação em alguma situação específica. A hipótese não existe: as eleições são definidas em dois turnos no máximo, sem exceção.

Outros criticam o termo como uma tentativa de "perfumar" a ameaça de uma ruptura democrática que paira no ar nos últimos quatros anos por causa das ações e palavras de Bolsonaro.

A tudo isso se soma a incerteza sobre qual será a reação de Bolsonaro, que, desde a vitória de Lula, se mantém em silêncio a respeito.

De praxe, um pronunciamento reconhecendo a derrota seria esperado, mas no caso de Bolsonaro não se sabe ainda quando — ou se — isso ocorrerá.

Contestação do resultado

A história recente do país sugere que Lula pode enfrentar alguns problemas logo à frente. Primeiro, imediatamente após a eleição.

A expectativa é que haja algum tipo de contestação do resultado porque o presidente disse diversas vezes que não o aceitaria se achasse que houve fraude, apesar de nunca ter apresentado qualquer prova concreta de que o sistema de votação seria falho.

"Ele já está contestando. Houve a tentativa de adiar a eleição por causa das inserções em rádios", diz o historiador e cientista político Luiz Felipe de Alencastro, professor da Fundação Getúlio Vargas, em referência ao relatório apresentado pela campanha de Bolsonaro sobre supostas irregularidades na transmissão de propaganda eleitoral e que foi rejeitado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

"Esse governo tenta criar ansiedade o tempo todo. Vai ter um período de incerteza e instabilidade", afirma Alencastro.

A cientista política Flávia Biroli diz que Bolsonaro e os bolsonaristas não aceitarão facilmente uma derrota por considerar que o país estaria caindo nas mãos de um inimigo.

"A extrema-direita transforma adversários em inimigos e é contra a alternâcia política porque entende que, se perder a eleição, o Estado vai ser tomado", afirma a professora da Universidade de Brasília.

"Bolsonaro anunciou durante todo o governo que não aceita as regras básicas da democracia e nutriu um movimento que tem como identidade fundamental essa recusa e o ódio a um inimigo que teria uma ajuda das instituições para agir contra o presidente. É uma conjuntura explosiva."

Se Bolsonaro contestar o resultado, a questão é se ele faria isso à força ou pelas vias legais.

Aécio Neves foi pelo segundo caminho em 2014 com a vitória de Dilma Rousseff (PT). Ele ficou à frente na maior parte da apuração do segundo turno, dando a impressão que iria conseguir ganhar, mas o resultado virou no fim.

"Ele reconheceu a vitória de Dilma, mas depois percebeu que a posição do José Serra (PSDB) em São Paulo era mais radical e não quis perder a liderança do partido, para ser o desafiante de Dilma em 2018", diz Alencastro.

Quatro dias após a reeleição de Dilma, o PSDB pediu para ser investigada uma suposta fraude, mas o TSE não encontrou nada.

"O precedente do Aécio é pernicioso porque a diferença na votação foi ainda menor agora, e eles podem pedir uma recontagem. Mas na eleição da Dilma não houve o apoio instantâneo de líderes de quase 50 países, entre eles os Estados Unidos, o aliado mais poderoso do Brasil. Acho que isso neutraliza essas pretensões entre os setores sociais que tiverem bom senso, e incluo aí a hirarquia das Forças Armadas", diz Alencastro.

'Bolsonaro teve os votos de quase metade dos eleitores'

O problema é que Bolsonaro precisará recorrer à mesma Justiça eleitoral que ele e seus apoiadores vêm atacando sem parar ao questionar a isenção do TSE e a segurança das urnas eletrônicas e ao dizer, sem provas, que houve fraude na eleição de 2018.

Mas uma denúncia de fraude, se não tiver fundamentos ou provas, não deve dar em nada, avalia Danilo Medeiros, pesquisador do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap).

"As instituições já estão calejadas, blindadas e preparadas para isso. Bolsonaro nunca leva um plano adiante, mas ele é imprevisível. Com uma derrota apertada e Lula virando no final, algum tipo de contestação deve vir, mesmo que mais leve, genérica e vazia, apontando 'injustiças', como se vem falando", diz Medeiros.

O cientista político avalia que o reconhecimento imediato da vitória de Lula por lideranças políticas que apoiam Bolsonaro limitaram suas opções e o deixaram isolado.

"Ele não esperava perder e não esperava ser abandonado tão rápido. Ficou sem apoio para uma contestação — e para um golpe mais vistoso menos ainda. Mas o silêncio constrangedor de Bolsonaro mostra sua relutância em de fato conceder a vitória. Ele pode estar esperando um pouco para ver se as manifestações dos caminhoneiros pegam fogo e qual é o ânimo das ruas", afirma.

O reflexo da derrota entre a metade da população que votou a favor do atual presidente pode ser decisivo, avalia Medeiros: "Aécio não tinha o apoio das ruas. Os eleitores de Bolsonaro são mais mobilizados. Acho que, se os mais fiéis estiverem engajados, ele vai instigar esse grupo a permanecer nas ruas".

Biroli não acredita que outros setores da sociedade além dos bolsonaristas apoiariam uma tentativa de golpe.

"O empresariado, que o apoiou eleitoralmente, não deve apoiar, nem o Judiciário, que é o primeiro alvo depois de uma ruptura. As empresas de mídia mais relevantes também não embarcaram em uma aventura golpista. Mas não sabemos como as polícias vão agir, especialmente as militares", diz.

Alencastro diz que também é difícil prever qual seria o engajamento das igrejas evangélicas que apoiaram o presidente. "Não sabemos a extensão da insatisfação que a eleição do Lula vai gerar. Vamos começar a saber agora."

Até o momento, as declarações feitas por lideranças evangélicas aliadas de Bolsonaro, como o pastor Silas Malafaia, o pastor e deputado federal Marco Feliciano (PL-SP) e o apóstolo Estevam Hernandes, não deram qualquer sinal de que eles questionam a vitória de Lula - pelo contrário.

Uma coisa que faltou a Aécio e que também pode faltar para Bolsonaro agora é apoio político. Se ele questionar a eleição, isso pode prejudicar também os governadores, senadores e deputados de partidos aliados que foram eleitos agora.

Os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-RO), já declararam que a vitória de Lula não deve ser questionada. O governador eleito de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), ex-ministro de Bolsonaro, também disse em entrevista à emissora Record, que terá uma "relação republicana" com o petista.

"O presidente e seu entorno mais radicalizado não parecem ter encontrado suporte suficiente para seguir com o questionamento das urnas, mas isso não significa que a situação esteja controlada", avalia Biroli.

A cientista política cita as operações da Polícia Rodoviária Federal (PRF) no dia da eleição, a presença de militares nas ruas no Rio de Janeiro e as mobilizações de caminhoneiros, que fecharam estradas para protestar contra a derrota de Bolsonaro, como um indicativo de que o presidente tem apoio em determinados setores caso opte por abrir uma crise institucional.

"São sinais claros de segmentos que estão dispostos a mobilização antidemocrática, e caberia ao presidente controlar isso, mas não parece que ele pretende fazer isso. Não ter o suporte institucional não significa que o bolsonarismo não esteja ativo em relação a uma contestação do resultado. De maneira que permanece muito delicado como será a manifestação de Bolsonaro quando ele decidir fazer isso."

O histórico de Bolsonaro também joga contra ele. O presidente já se filiou a nove partidos e aderiu de última hora ao PSL (atual União Brasil) e ao PL para disputar as duas últimas eleições.

O presidente também tentou criar sua própria legenda, mas não conseguiu. "E nem vai conseguir, porque ele não tem capacidade. Bolsonaro não controla um partido, ele controla um movimento de espírito", diz Alencastro.

A relação com o Congresso

Outro momento de tensão para Lula pode ser a relação com o Legislativo no começo do seu governo.

O PL terá as maiores bancadas na Câmara dos Deputados e no Senado, e vários políticos bolsonaristas e à direita de Lula se elegeram, alguns deles com excelentes votações, e podem fazer oposição ao novo presidente.

A Presidência confere poder e influência, e a transição certamente vai produzir rearranjos e facilitar a costura de apoios. Mas vai ser a princípio um Congresso hostil a Lula, avalia Alencastro, e ele pode não só ter dificuldades para aprovar projetos, mas lidar com pautas-bomba e ameaças de impeachment.

"Os bolsonaristas também podem sempre tirar do colete a proposta de emenda constitucional para instaurar um semipresidencialismo", diz.

Isso reduziria drasticamente o poder do chefe do Executivo. A proposta está tramitando na Câmara. Arthur Lira, aliado de Bolsonaro, já disse que, se aprovado, o novo regime poderia entrar em vigor em 2026 em vez de 2030 como é originalmente previsto.

"Vai ser uma ameaça a Lula no decorrer do mandato, mas é difícil de passar. É uma mudança complexa por meio de plebiscito e precisa de uma campanha longa", diz Alencastro.

'O presidente do Congresso, Arthur Lira (PP-AL), é aliado de Bolsonaro'

Lula também precisará negociar o chamado Orçamento Secreto, como ficaram conhecidas as emendas de relator, que foram criticadas bastante por ele na campanha. O Orçamento Secreto também foi articulado por Lira.

Mas esse é um nó complicado de desatar. Medeiros acredita que Lula não vá enfrentar o assunto "com dois pés no peito" e deve adotar uma estratégia de mudanças graduais.

"Uma parte do Legislativo sabe que foi uma forçada de barra que foi possível diante de um governo frágil, mas vai ser complicado retroceder, os parlamentares não vão aceitar", diz.

Lula pode esperar para ver o que o Supremo Tribunal Federal (STF) vai dizer a respeito. Atual presidente da Corte, a ministra Rosa Weber é a relatora da ação que questiona a constitucionalidade das emendas por causa da sua falta de transparência.

Uma decisão contrária do STF certamente ajudaria o novo presidente na negociação com o Congresso.

A mobilização das ruas

Também é preciso aguardar para ver qual será o efeito de uma contestação do resultado da eleição a médio prazo.

Em 2014, a denúncia de fraude de Aécio fez a mobilização contra Dilma ganhar corpo, junto com o escândalo da Lava Jato. Houve grandes protestos, e a presidente sofreu um impeachment no segundo ano do mandato.

Uma nova denúncia por parte de Bolsonaro poderia ter um efeito semelhante e mobilizar milhões de brasileiros que votaram a favor dele e contra o PT.

"Vai ser um começo difícil, com mobilizações sociais, porque isso vai ativar as bases do bolsonarismo, mas não todos os eleitores de Bolsonaro", diz Biroli.

A cientista política avalia que essa mobilização pode perder força depois que Lula assumir.

"Não acredito que metade do país vai ficar conflagrada ou que vamos ter uma repetição de 2014, porque estamos em um país diferente, em um contexto diferente. Antes, havia uma expectativa de novidade, e, agora, estamos diante de um movimento radicalizado à direita."

Mas o antipetismo e o bolsonarismo que embalaram Bolsonaro nesta eleição não devem desaparecer com a vitória de Lula e podem fazer com que ele recue em algumas pautas, especialmente na arena mais sensível dos costumes e da moral.

Outro ponto de atenção vai ser a corrupção. "É o grande fator que mobilizou as pessoas contra o PT e o principal motivo apontado agora para não votarem no Lula", diz Medeiros.

A corrupção fez uma grande sombra sobre Lula durante toda a campanha e deve agora, depois que ele foi eleito, continuar a ser um ponto de tensão em seu terceiro mandato.

BBC Brasil

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 Processo nº 04783e22 - Recurso Ordinário referente à Representação nº 19311e21, relativa à Prefeitura Municipal de JEREMOABO. Representados: Sr. Derisvaldo José dos Santos (Prefeito) e Sra. Alessandra Teixeira Ferreira (Secretária Municipal de Educação). Representantes: Sr. Carlos Henrique Dantas de Oliveira, Sr. Benedito Oliveira dos Santos, Sr. Antônio Chaves, Sr. Manoel José Souza Gama e Sr. Domingos Pinto. Procurador: Sr. Allan Oliveira Lima - OAB/BA nº 30276.

Nota da redação deste Blog - Hoje o TCM-BA julgará um recurso referente REPRESENTAÇÃO contra   Derisvaldo José dos Santos (Prefeito) e Sra. Alessandra Teixeira Ferreira (Secretária Municipal de Educação). Aguardar o julgamento para vê qual será resultado.

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