Publicado em 22 de fevereiro de 2023 por Tribuna da Internet
José Carlos Werneck
O Canal Curta exibiu neste domingo, dia 19, um documentário de altíssima qualidade de João Moreira Salles, “No intenso agora”, um filme que se inicia com parte de imagens que sua mãe, Eliza Gonçalves, fez durante visita à China em 1966, no início da Revolução Cultural, passa por registros das turbulências do movimento estudantil de Maio de 1968, em Paris, e aborda também as manifestações daquela época na então Tchecoslováquia e no Brasil.
Com o desafio de lidar com muitas imagens de arquivo e com tantas lembranças geradas pelas imagens feitas pela mãe, além de suas próprias memórias, já que, ao tempo, era criança e estava em Paris em maio de 1968, o cineasta de 54 anos disse que sua intenção foi entender, entre outras coisas, como os participantes de movimentos sociais e políticos lidam com a frustração quando os sonhos revolucionários acabam não se concretizando:
SALA DE EDIÇÃO – Na opinião do cineasta, se um documentário vira algo enciclopédico, ele tende a fracassar. “No intenso agora” não é um filme sobre o Movimento de Maio de 68. Tratei de Paris, principalmente, porque a intensidade daquilo foi imensa e durou pouco, que é uma coisa que me interessa”, disse João Moreira Salles.
Segundo ele. trata-se de um filme reflexivo, mas de “sala de edição”. “Quando vi as cenas extraordinárias do enterro do estudante tcheco Jan Palach, morto durante os protestos contra o fim da Primavera de Praga (em 1969), lembrei-me do caso do Edson Luiz (estudante brasileiro, morto em 1968 pelo regime militar) e também os mortos franceses, aí que quis comparar”.
“No intenso agora” mostra que aqueles estudantes cheios de vida não tomaram o poder. Na realidade, eles nem tentaram, o que não quer dizer que foram derrotados. Tendo sido tão felizes, poucos escaparam da melancolia de ter vivido seu mais intenso agora ainda jovens.
VIVENDO EM PARIS – A história se desenrola enquanto, ele e sua família vivem em Paris. Como em “Santiago”, de 2007, João Moreira Salles investiga a si mesmo. Desta vez, por meio de mãe. Anos antes de maio explodir, Eliza Salles embarcava em sua experiência revolucionária, estética e vital na China de Mao Tse Tung , antes de mergulhar em profunda tristeza.
João, na narração como leitura em voz alta, não contém o alumbramento de reencontrar a mãe, ensaísta como ele próprio, em imagens, sínteses e anotações. Afinal, ninguém escapa da história nem de construir mitos sobre si mesmo.
É um magnífico documentário, que deve ser visto ou revisto por todos que se interessam por História. Realmente, imperdível.