Além de nomeação na Bahia, mulheres de três ministros de Lula obtiveram cargo nas cortes estaduais
Os camarotes do carnaval de Salvador foram tomados neste ano por um tema político: a candidatura da ex-primeira-dama do estado Aline Peixoto a uma vaga de conselheira no Tribunal de Contas dos Municípios da Bahia. Com o apoio do marido, Rui Costa, atual ministro da Casa Civil, a enfermeira Aline concorrerá ao cargo, com salário de R$ 35 mil e estabilidade até os 75 anos, em votação na primeira quinzena de março na Assembleia Legislativa. Mais uma vez, entra em ação uma prática comum: o uso do organismo responsável pela fiscalização do dinheiro público para beneficiar parentes de políticos.
Um levantamento da Transparência Brasil apontou em 2016 que, dos 233 conselheiros em exercício em 34 tribunais de contas, 32% haviam sido nomeados pelos próprios tios, primos ou irmãos governadores. No Tribunal de Contas da União (TCU), um dos casos mais rumorosos envolveu a conselheira Ana Arraes, eleita em 2011 quando seu filho, Eduardo Campos, era governador de Pernambuco.
Três ministros, todos ex-governadores, têm hoje a mulher em tribunais de contas. A ex-deputada federal Rejane Dias, casada com o ministro do Desenvolvimento Social, Wellington Dias (PT), foi eleita para o Tribunal de Contas do Piauí. Renata Calheiros, mulher de Renan Filho (MDB), foi escolhida para ocupar uma vaga no Tribunal de Contas de Alagoas. E a ex-deputada estadual Marília Góes, casada com o ministro do Desenvolvimento Regional, Waldez Góes (licenciado do PDT), está no Tribunal de Contas do Amapá.
O país tem um problema. Os tribunais de contas não foram criados para distribuir empregos públicos a parentes dos poderosos. Não há cabimento em permitir que alguém ocupe cargo de tamanha responsabilidade graças ao empurrão de um familiar influente.
Indicar vereadores ou deputados em fim da carreira, muitos enrolados na Justiça, também é uma prática problemática. Quanto mais aumenta a partidarização, menor é a isenção nas decisões — algo grave num órgão com poder de tornar gestores públicos inelegíveis. Os tribunais de contas custam caro (R$ 10 bilhões por ano) e precisam ter caráter técnico.
A solução não virá da Justiça. Em 2008, quando governava o Paraná, Roberto Requião indicou o irmão conselheiro no Tribunal de Contas do estado. Por liminar do Supremo Tribunal Federal (STF), a posse foi suspensa devido a uma ação que apontava nepotismo e desrespeito a prazos e ritos legais. Depois de mais de uma década de disputas, ele foi reconduzido ao cargo em dezembro. Embora o nepotismo no serviço público seja proibido, há controvérsia sobre a regra valer para tribunais de contas.
É por isso que o Parlamento deve arbitrar a questão. Há ao menos cinco propostas legislativas para dar um caráter técnico a nomeações de conselheiros, impondo exigências como ficha limpa e concursos públicos. Mas nenhuma tem avançado (três ainda nem relator têm). O Congresso precisa agir para acabar com os abusos.
O Globo