Publicado em 14 de janeiro de 2023 por Tribuna da Internet
Eliane Cantanhêde
Estadão
Na primeira semana do governo Lula, uma desconhecida conversou com Jair Bolsonaro em Orlando, saiu saltitante e postou uma mensagem cifrada, avisando que dali a alguns dias haveria “novidades”. Ninguém deu bola, porque parecia só mais uma “bolsonarice”, mas mostra o quanto o ex-presidente estava ciente – senão à frente – da tentativa de golpe que o Brasil sofreu e o mundo, perplexo, assistiu no domingo, 8 de janeiro de 2023.
Foi mais um alerta, como um caminhão de querosene no aeroporto da capital da República, carros e ônibus incendiados, ameaça de invasão da sede da Polícia Federal, milhares de insanos em torno de quartéis, cerco a três refinarias do País. Mas o sinal amarelo não disparou.
ESCOLHER CULPADOS – O governador Ibaneis Rocha foi no mínimo leniente e seu secretário de Segurança, Anderson Torres, se mandou de véspera para os States, onde estava Bolsonaro, e deve ser preso hoje, depois de descoberto seu rascunho de decreto para Bolsonaro melar as eleições. Golpe! Jogar toda a culpa neles, porém, é só conveniência. Eles são parte de algo maior.
A cadeia de falhas é grande demais, grave demais, para se reagir assim: “Ah! Mas o (bolsonarista) Ibaneis garantiu que estava tudo calmo, sob controle”. Ibaneis era confiável? E por que o ministro Flávio Dino baixou um ato interditando Anderson Torres na Segurança do DF? Porque o passado de Torres condena, ou o futuro dele ameaçava?
Após limpar a área no DF, começa a ser verbalizada, até por Lula, a suspeita de algo profundamente grave e assustador: o inimigo mora ao lado.
DENTRO DO PLANALTO – O Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência evaporou. O Batalhão da Guarda Presidencial (BGP), subordinado ao Comando Militar do Planalto (CMP) – portanto, ao Exército – agiu como se fosse um dia qualquer e assistiu, inerte, aos criminosos subindo a rampa e quebrando tudo.
Aos poucos, Lula vai liberando suspeitas que não devem ser só dele e do governo dele, mas de todo o País. Já no domingo, dizia que, se houve omissão “dos nossos”, seria punida.
Na terça, se referia a “generais”. Na quinta, falava abertamente sobre sua desconfiança sobre a responsabilidade e as intenções de boa parte dos militares, perguntando: quem deixou a porta do Planalto aberta?
UM ERRO COLETIVO? – Falharam Defesa, Exército, Marinha, Aeronáutica, Polícia Federal, Supremo, Câmara, Senado, que nem levaram em conta os alertas da Agência Brasileira de Inteligência (Abin).
O PT mira José Múcio (Defesa), mas por que só ele? Os bolsonaristas espalham que o golpe foi coisa do PT e da esquerda (tem quem acredite…), mas, se há infiltração, é de bolsonaristas no governo Lula.