Publicado em 10 de janeiro de 2023 por Tribuna da Internet
Alberto Zacharias Toron
Folha
Desde a proclamação do resultado das eleições presidenciais formou-se uma surpreendente aglomeração de pessoas na porta de diversos quartéis. Todas inconformadas com a derrota do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) nas urnas.
Hinos militares, além do nacional, são entoados inúmeras vezes ao dia. Mas o que causa repulsa são os bordões: “Forças Armadas, salvem o país” ou “Forças Armadas, SOS” ou, diretamente, “Intervenção militar, Bolsonaro no poder”.
NOITE DE VANDALISMO -Com a diplomação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e, depois, com sua posse, esperava-se que tais manifestações cessassem; mas, ao contrário, descambaram na assustadora “noite de vandalismo” em Brasília, com ônibus incendiados e até a colocação de uma bomba em caminhão-tanque de combustível perto do aeroporto da capital federal. Isso é intolerável!
Insatisfeitos com as ações anteriores, organizaram nova expedição golpista à capital do país. Invadiram os prédios do Senado, do Supremo Tribunal Federal e o próprio Palácio do Planalto; essas instalações foram selvagemente depredadas.
Havia pouca polícia para muitos vândalos. Há perguntas que devem ser feitas: por que permitiram que os manifestantes alcançassem a praça dos Três Poderes? Por que o efetivo policial era tão diminuto? Onde estava a Força Nacional, que só apareceu muito tempo depois? Inquietante é a questão de saber por que o Batalhão da Guarda Presidencial não defendeu o Palácio do Planalto? Muitas explicações são devidas à nação.
EPISÓDIO DEGRADANTE – O ministro da Justiça, Flávio Dino, com muita competência, deu parte das explicações necessárias para entender o episódio que degradou não apenas os Poderes da República, mas a democracia como um todo.
A franquia democrática representada pela liberdade de manifestação assegurada pela Constituição no seu artigo 5º permite que se deplore publicamente ações do governo, que se exponham as mazelas da política empreendida e seus malfeitos.
Não, porém, que se ataque a própria democracia, as instituições que corporificam e dão vida ao Estado de Direito e, tampouco, que se ataque pessoalmente as autoridades estatais com ameaças de morte ou mesmo insultos.
TOLERÂNCIA ZERO – Assim, pouco importa que alguns vejam como manifestação ordeira e pacífica os acampamentos nos quarteis. A questão é de conteúdo.
Há limites imanentes à liberdade de manifestação. Eu não posso xingar ou insultar pessoas em nome da liberdade de expressão e, muito menos, exprimir injúrias raciais contra quem quer que seja porque a lei incrimina tais comportamentos. O discurso de ódio, igualmente, não pode ser tolerado!
Mas o que ocorreu no domingo (8) ultrapassa em muito as fronteiras da liberdade de manifestação. Representa uma sucessão de crimes contra as instituições democráticas. Entre estes, o de tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado democrático de Direito.
GOLPE PELA FORÇA – É certo que nas manifestações em frente aos quarteis não há violência ou grave ameaça, mas o clamor para que as Forças Armadas deponham o governo legitimamente constituído outra coisa não é senão o conhecido golpe pela força das armas. Não há nada de sutil nisso; é pura violência.
Não é possível ser ilimitadamente tolerante, como advertia Karl Popper, sob pena de os intolerantes destruírem a própria tolerância e, com isso, a democracia. É preciso pôr fim ao vandalismo que se assemelha ao terrorismo e a esse tipo de manifestação antidemocrática e ilegal nos quartéis para que o país possa sair desse atoleiro.
Passou da hora de o Estado democrático agir para impedir a sandice e permitir a normalidade do país.