O 7 de setembro pode ser marco importante de uma crise política permanente até as eleições
O presidente Jair Bolsonaro vai usar o Dia da Independência para incentivar a baderna no país. Não se trata das tradicionais cerimônias militares com desfiles de tropas, mas da convocação de redes bolsonaristas para que seus adeptos venham às ruas em apoio ao presidente contra o Supremo Tribunal Federal, em especial o ministro Alexandre de Moraes, que investiga Bolsonaro por sua live contra o voto impresso. Os temas que os apoiadores do presidente circulam na rede não deixam dúvida de que a violência contra as instituições são vocabulário comum entre eles. Bolsonaro não os desautoriza e diz que participará de um ou mais atos.
O fato de que tudo que o presidente Bolsonaro faz para abrir caminho a seu ideal autoritário dar errado e prejudicar suas intenções não o demove. E ninguém o demove, vistos pelo retrovisor os dois anos e oito meses de seu mandato. O Centrão colocou um de seus políticos mais habilidosos em plena Casa Civil, o presidente do PP, Ciro Nogueira, que se atribuiu como missão o papel de “amortecedor”, mas a peça tem falhado e o carro segue desgovernado.
O presidente manifestou a intenção de pedir o impeachment de dois ministros do STF - Luis Roberto Barroso e Moraes - ao Senado e levar a petição pessoalmente. Fez metade do que prometeu - não foi pessoalmente e um ministro restou em seu alvo. Mas a forma com que usa instrumentos perfeitamente legais para obter seus intentos demonstram que o presidente não está interessado em mostrar que é alvo de inconstitucionalidades, mas em punir o que considera um adversário que comete a afronta de colocá-lo sob os holofotes da lei.
Há dois aspectos no episódio que são constantes no modus operandi do presidente. Sua grave ignorância sobre assuntos legais, e muitos outros, o fez saltar por cima da restrição crucial de que magistrados não podem ser punidos por suas interpretações da lei. Por outro lado, esta incultura trai seu objetivo verdadeiro de, sempre que possível, mostrar que está sendo impedido de realizar tudo aquilo pelo qual foi eleito porque o “sistema” - STF, governadores, esquerdistas etc - não lhe permite.
Assim como é direito do presidente e de todo cidadão criticar as instituições e mostrar seu desejo de que mudem, também é o direito de manifestação, desde que respeitados os limites legais. Mas são esses limites que o presidente e seus mais radicais seguidores querem ultrapassar, até que a democracia acabará sendo, ela própria, ferida. Bolsonaro tem sido coerente nessa trajetória e diz aceitar as quatro linhas da Constituição fazendo o contrário do que ela prescreve e buscando força suficiente para desmontar seus princípios.
Nuvens carregadas prenunciam o próximo 7 de setembro. Policiais da ativa e da reserva têm convocado seus pares a participar das manifestações para intimidar o STF, e outros participantes a “tirar os ministros de lá na marra” ou defendendo até a participação com armas nos atos públicos. Um comandante responsável pelos efetivos da PM em várias cidades do interior paulista fez campanha aberta contra o governador paulista e o STF. O presidente Bolsonaro diz que irá ao ato em São Paulo. Ele e seus filhos nada viram de errado na rebelião das forças policiais no Ceará e em outros Estados.
A possibilidade de apoio armado das PMs estaduais em eventos pró-Bolsonaro foi rastreada em vários Estados pelos governadores. Eles se reuniram na terça-feira em seu Forum Nacional, mas não conseguiram aprovar um manifesto em repúdio aos últimos atos do presidente, por oposição, entre outros, do governador de Minas, Romeu Zema (Novo). Em vez disso, foi aprovada a proposta de uma reunião entre eles, os presidentes da Câmara e do Senado e o presidente Jair Bolsonaro, em busca da harmonia entre os Poderes. A escalada do presidente, no entanto, sugere que, se a reunião se realizar, tende a ser mais um encontro protocolar, que não mudará um milímetro da maneira de Bolsonaro agir, que se transformou em um método de (des)governo.
O presidente persegue seu duplo objetivo de chegar às urnas com força suficiente para ir ao segundo turno e arregimentar forças para rejeitar uma derrota nas urnas, para ele viciada de antemão. Bolsonaro comprou forte retaguarda no Congresso ao se aliar ao Centrão, certo de que assim barrou o caminho do impeachment. Com essa blindagem segue em sua cruzada a favor do voto impresso e contra o STF, elevando suas apostas e os riscos institucionais. O 7 de setembro pode ser marco importante de uma crise política permanente até as eleições.
Valor Econômico