Lauriberto Pompeu
Estadão
O Tribunal de Contas da União (TCU) abriu uma investigação interna para avaliar a conduta de um servidor que produziu um documento sobre mortes na pandemia do novo coronavírus. Segundo o Estadão apurou com integrantes do tribunal, o levantamento não oficial foi feito pelo auditor Alexandre Figueiredo Costa Silva, que teria inserido a informação no sistema sem que constasse de qualquer processo do órgão, e já foi afastado do cargo por 60 anos.
Esse documento foi citado pelo presidente Jair Bolsonaro como forma de comprovar sua tese de que cerca de metade das mortes registradas como covid-19 não seriam causadas pela doença.
ANÁLISE PESSOAL – Em nota, o tribunal afirmou que não se tratar de qualquer documento ou estudo conduzido pela instituição.
“O documento refere-se a uma análise pessoal de um servidor do tribunal, compartilhada para discussão, e não consta de quaisquer processos oficiais desta Casa, seja como informações de suporte, relatório de auditoria ou manifestação do tribunal. Ressalta-se ainda que as questões veiculadas no referido documento não encontram respaldo em nenhuma fiscalização do TCU”, diz o comunicado.
Na segunda-feira, 7, ao conversar com apoiadores no Palácio da Alvorada, Bolsonaro atribuiu ao próprio TCU essa informação sobre uma supernotificação de mortes pela Conid-19, mas foi desmentido na sequência.
BOLSONARO INSISTE – Em nota, o tribunal disse que não “há informações em relatórios do tribunal que apontem que ‘em torno de 50% dos óbitos por covid no ano passado não foram por covid, conforme afirmação do presidente Jair Bolsonaro”.
Ao voltar ao assunto nesta terça-feira, dia 8, Bolsonaro admitiu que errou ao atribuir o dado ao TCU, mas insistiu que há “supernotificação”, sem apresentar qualquer prova.
Ao tentar justificar a declaração falsa dada no dia anterior, o presidente disse que o tribunal apontou risco de ocorrer supernotificação porque a lei complementar 173/2020, que definiu critérios para o dinheiro usado no combate à pandemia ser enviado a Estados, leva em conta o número de mortes em cada unidade da federação. A conclusão de que metade dos óbitos não foi covid, segundo disse hoje o presidente, é do próprio governo federal, e não do tribunal.
PELAS REDES SOCIAIS – Mesmo com o desmentido, apoiadores do presidente, como o filho e deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) e a presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara, Bia Kicis (PSL-DF), reproduziram a informação falsa por meio de redes sociais. As publicações continuavam no ar na tarde desta terça-feira.
Alguns dos apoiadores do governo mantiveram a reprodução do relatório do auditor do TCU que aponta a “supernotificação” de mortes por covid para reforçar a narrativa.
Na nota que divulgou, o tribunal confirmou que o levantamento não é oficial. “O TCU reforça que não é o autor de documento que circula na imprensa e nas redes sociais intitulado ‘Da possível supernotificação de óbitos causados por Covid-19 no Brasil’”, diz trecho da nota.
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NOTA DA REDAÇÃO DO BLOG – O repórter, por óbvio, não conseguiu contato com o auditor Alexandre Figueiredo Costa Silva, que sumiu no horizonte, depois de ficar famoso por 15 minutos, e só voltou à cena nesta quarta-feira, com um vídeo dizendo que o pai é amigo de Bolsonaro e encaminhou a ele o falso relatório. O TCU precisa punir esse funcionário de forma exemplar, com justa causa. Segundo o senador Humberto Costa (PT-PE), o auditor “é amigo dos filhos do presidente e amigo do presidente do BNDES, Gustavo Montezano”. E o incidente demonstra como a irresponsabilidade institucional ganha terreno no Brasil, onde la nave va, cada vez mais fellinianamente. (C.N.)