Publicado em 24 de junho de 2021 por Tribuna da Internet
Pedro do Coutto
No espaço que ocupa às quartas-feiras, no O Globo e na Folha de São Paulo, o jornalista Elio Gaspari focaliza com a sua lente as atitudes de Jair Bolsonaro que conduzem à instabilidade e ameaçam tanto a democracia quanto às instituições, deixando perplexos os eleitores e eleitoras do país, para falarmos do efeito voto e a opinião pública deslocada.
Gaspari alinha uma sequência de episódios nos quais ficou flagrante a reação habitual do presidente da República ao que se refere a companheiros seus de início da campanha e que foram sendo abatidos e excluídos passo a passo. Tal reação tem no fundo o objetivo de criar uma crise que leve o Brasil a mais uma ruptura de seu processo como nação atingida por uma vocação nitidamente autoritária, cujo projeto é ultrapassar a barreira entre a liberdade e a ditadura.
CONTRA APOIADORES – Na medida em que Gaspari descreve a aproximação seguida do distanciamento de companheiros da campanha, quando esta surgia como uma possibilidade ainda remota, lembro de Jânio Quadros que praticou atos, rompeu consigo mesmo e passou a afastar e a agredir exatamente aqueles que melhor e mais intensamente o apoiaram na campanha que o levou ao Planalto.
Bolsonaro participou de manifestações no meio de apoiadores que propunham e propõem na Esplanada de Brasília o fechamento do Congresso e do Supremo Tribunal Federal. Isso não aconteceu só uma vez. Pelo contrário, repetiu-se em várias ocasiões. O comportamento de Jair Bolsonaro, marcado pelo destempero, visa diretamente a imprensa, pois não consegue projetar através dela uma imagem irreal de si mesmo.
Jânio Quadros tentou em 1961, com a renúncia, provocar uma manifestação gigante do povo como se ele fosse às ruas e praças exigir a sua permanência no poder. Bolsonaro não chega a um lance de dados desse risco. Mas tenta se aproximar da visão autoritária por etapas. As rupturas do atual presidente com aqueles que em algum momento discordaram de suas atitudes coincidem com as reações de Jânio Quadros logo depois da posse em janeiro de 1961. Os seus maiores apoiadores foram, sem dúvida, o então deputado Carlos Lacerda e o jornal Estado de São Paulo, de Júlio Mesquita Filho.
SEM COMPROMISSO – Bolsonaro, em seus dois anos de governo, revela a cada dia que não tem compromisso algum com o cenário político, econômico e social de nosso país. Ele se elegeu para assegurar o compromisso democrático e banir a corrupção do mapa verde-amarelo, cores brasileiras.
Aconteceu exatamente o contrário: a democracia passou a viver sob ameaça e, quanto à corrupção, vemos agora nas reportagens de Leandro Prazeres e Mariana Muniz, no O Globo, e na de Vinicius Sassine, Folha de São Paulo, indícios de despesas adicionais no contrato que prevê a compra de vacinas da Índia. Os preços da referida vacina, segundo o Jornal Nacional da TV Globo, edição de terça-feira, são o praticamente o dobro das vacinas de outros fabricantes,
Nesse ponto, recorro ao título de Ian Fleming, autor do 007, “Os diamantes são eternos”. Como acentuou Gaspari, também ontem, O Brasil ingressou em um enigma e está em curso um processo que atingirá o seu ponto crítico em 2022.